Candidatos excluem “bomba atómica” da dissolução se Governo não cumprir défice ou promessas
A Constituição da República vale mais que o Direito Europeu, disse Marcelo, referindo-se aos tratados e acordos com Bruxelas.
A maioria dos dez candidatos às eleições presidenciais de 24 de Janeiro exclui o recurso à denominada “bomba atómica” dos poderes presidenciais, ou seja, a dissolução da Assembleia da República, se o Governo não cumprir as metas do défice ou as suas promessas eleitorais. No debate radiofónico organizado esta segunda-feira pela Antena 1, o único que reuniu os dez candidatos, foram ainda abordadas as situações do Banif e a presença das Forças Armadas em missões no estrangeiro.
“A Presidente da República deve ser um factor de estabilidade, só encaro a dissolução nos casos de perda de maioria parlamentar ou quando o primeiro-ministro não cumpra os seus deveres”, disse Marisa Matias. A candidata apoiada pelo Bloco de Esquerda pôs de lado o cenário de demissão de um Executivo pelo não cumprimento do défice ou de tratados internacionais.
Maria de Belém destacou que, só em condições excepcionais, recorreria à dissolução. “A Presidente da República é um construtor de estabilidade”, destacou a ex-presidente do PS.
Sampaio da Nóvoa afinou pelo mesmo diapasão, embora, retrocedendo à crise do “irrevogável”, ou seja, a demissão de Paulo Portas do Governo de Pedro Passos Coelho no Verão de 2013, admitiu que teria ponderado a demissão.
A candidatura do PCP deu um rotundo "não" se o que estivesse em causa fosse o défice. Neste terreno, Marcelo Rebelo de Sousa assinalou que a Constituição da República Portuguesa vale mais que o Direito Europeu. O que se aplicaria, deste modo, aos acordos internacionais como o tratado orçamental. A faculdade de utilizar a “bomba atómica”, disse Marcelo, será, sempre, ponderada caso a caso.
Sobre o que teria feito em 2013, o professor somou a difícil situação económica e o momento então vivido pelo PS para não dissolver. O mesmo faria Cândido Ferreira.
À margem destas ponderações, pronunciaram-se os outros candidatos. “Em qualquer Governo que atente contra os interesses nacionais, o Presidente tem uma palavra a dizer”, referiu Henrique Neto. Que, explicou, por isso teria demitido José Sócrates e Passos Coelho.
“O incumprimento deve ser sancionado”, foi a frase de Jorge Sequeira. Paulo Morais, como Neto, teria demitido Sócrates e Passos por “a estabilidade não ser um valor em si mesma, pois não há nada mais estável que um pântano”. Por fim, Vitorino Silva, admite a demissão por não passagem do Orçamento do Estado e não cumprimento das promessas eleitorais.
Esta questão, os poderes presidenciais de dissolução, foi a novidade do debate de menos de duas horas da manhã desta segunda-feira. No Banif, os dez candidatos repetiram, por enésima vez, as suas posições quanto ao apoio à solução do Executivo de António Costa e ao Orçamento Rectificativo.
“Quando os bancos não têm juízo, o povo é que paga, e não pode ser”, foi a palavra de ordem de Vitorino Silva. “Esta foi a pior solução, houve manipulação das acções do Banif”, repetiu Paulo Morais. “O erário público não tinha que pagar, devia ser a falência”, admitiu Jorge Sequeira. Edgar Silva defendeu o controlo público do sector financeiro. “Somos o único país em que os contribuintes pagam sempre [ao sector financeiro]”, garantiu Marisa Matias. “É o fracasso da política portuguesa de prever”, lamentou Henrique Neto.
Maria de Belém, Marcelo Rebelo de Sousa, Sampaio da Nóvoa e Cândido Ferreira, embora com considerandos próprios sobre o caso – da transparência ao cumprimento das normas comunitárias passando pela importância regional do Banif – concordaram com a decisão do Executivo e a venda daquela instituição financeira ao espanhóis do Santander/Totta.
Sobre as Forças Armadas, das quais o Presidente da República é o chefe Supremo, foi aberta uma possibilidade: a de aumentar a representação parlamentar a todos os grupos do hemiciclo no seio do Conselho Superior de Defesa Nacional. Embora tal iniciativa dependa do poder legislativo, não do inquilino de Belém, foi por todos reconhecida a necessidade de abrir aquele órgão que, pela constituição e funções, se encontra governamentalizado.
A presença de tropa portuguesa em missões no estrangeiro revelou as tradicionais clivagens. Sim em missões de paz, não em actividades militares, para Marisa Matias e Edgar Silva. Os outros, admitiram esse envolvimento no âmbito da ONU, da defesa dos interesses nacionais e com referências explícitas ao combate ao autoproclamado Estado Islâmico e às suas fontes de financiamento.