Francisca Van Dunem, a primeira mulher negra a chegar a ministra

Procuradora há mais de 30 anos, conhece a Justiça como poucos no país. Os seus pares elogiam-lhe o profissionalismo e a honestidade.

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Apesar das funções de relevo que tem ocupado, Van Dunem prima pela discrição Enric Vives-Rubio

Francisca Van Dunem nasceu em Luanda há 60 anos e é a primeira mulher negra a assumir um cargo de ministra em Portugal. Conhece a Justiça por dentro. Procuradora há mais de 30 anos, ocupou nos últimos oito anos um dos cargos mais importantes do Ministério Público, como procuradora-geral distrital de Lisboa, responsável pelo maior dos quatro distritos judiciais do país. Acreditando que a Justiça deve ser transparente e prestar contas, foi pioneira ao criar um site onde se reporta diariamente a actividade do Ministério Público. 

Dirigiu igualmente o Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa, onde antecedeu Maria José Morgado, e esteve, nos anos oitenta, na Alta Autoridade contra a Corrupção. É casada com o professor catedrático da Universidade de Lisboa Eduardo Paz Ferreira, especialista em Direito Fiscal e Finanças Públicas, e antigo sócio do ministro socialista Sousa Franco, com quem fundou um escritório de advogados.

“É uma magistrada altamente qualificada e de uma honestidade a toda a prova”, resume Alberto Pinto Nogueira, antigo procurador-geral distrital do Porto, que trabalhou com Francisca Van Dunem na Alta Autoridade contra a Corrupção e no Conselho Superior do Ministério Público. A violência contra os idosos e a violência doméstica são dois temas que lhe são caros.

Apesar das funções de relevo que tem vindo a ocupar nos últimos anos, Van Dunem tem primado sempre pela discrição. Veio para Portugal aos 18 anos, para tirar o curso de Direito. No ano passado, concorreu aos lugares existentes no Supremo Tribunal de Justiça para procuradores e ficou em terceiro lugar, podendo ainda vir a ocupar um lugar de juíza conselheira se entretanto abrirem vagas.

Um dos poucos perfis sobre Francisca Van Dunem, feito pela revista Visão em 2007, dá conta de que a magistrada coordenou megaprocessos relacionados com o tráfico de armas na PSP e a corrupção na Marinha. Gosta de cozinhar, de arte — cinema incluído — e de música clássica, mas nem todos lhe apreciam a distância que mantém para com os subordinados. Foi representante de Portugal no Comité Europeu para os Problemas Criminais no Conselho da Europa.

A procuradora-geral distrital de Lisboa chegou a ser representante do Governo português junto do conselho de administração do Observatório Europeu do Racismo e da Xenofobia no início dos anos 2000. Em 2012, em entrevista ao PÚBLICO, dizia: "No discurso político, a questão racial continua a ser tabu, manifestamente. Percebo que a abordagem não é fácil. Construiu-se a ideia de que os portugueses eram propensos à miscigenação, misturavam-se culturalmente e que, portanto, isso era um indicador de que não discriminavam racialmente. Eu digo 'não'."

Apesar de, na altura, confessar que nunca tinha sentido discriminação no local de trabalho, e que não achava que a justiça portuguesa discrimine, não tinha dúvidas quanto ao facto de existir racismo em Portugal. "Falta a abordagem franca da questão. Era importante encararmos isso como um problema que, se calhar, nem é assim tão difícil de resolver. Há uma componente educacional, mas é preciso investir nela.” com Joana Gorjão Henriques

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