Peritos ilibaram câmara e condomínio na morte de estudantes em Braga
Apesar de apuradas “omissões funcionais” de responsáveis da autarquia e da empresa, opinião técnica foi decisiva para que o Ministério Público concluísse que o muro caiu por acção dos quatro colegas da Universidade do Minho agora acusados de homicídio por negligência.
A investigação à morte de três estudantes da Universidade do Minho (UM), em Abril do ano passado, apurou “omissões funcionais” de técnicos da Câmara de Braga e da empresa que geria o condomínio do edifício ao qual pertencia o muro que atingiu as vítimas. Os factos apurados não foram suficientes para acusar nenhuma destas pessoas e os testemunhos de dois peritos em engenharia civil acabaram por ser decisivos para que as responsabilidades fossem imputadas em exclusivo aos quatros colegas agora acusados de homicídio por negligência.
No dia seguinte ao desmoronamento, dois peritos em engenharia civil, nomeados pela Universidade do Minho, estiveram no local e emitiram um relatório que consta do processo e do qual o Ministério Público concluiu na acusação que “a causa apontada para a derrocada é a presença dos estudantes em cima da pala da estrutura”. Os dois especialistas prestaram depois esclarecimentos adicionais durante a fase de investigação, que acabaram por ser decisivos na decisão de acusação contra os quatros colegas das vítimas.
De acordo com um dos peritos, o projectista daquela estrutura “teria que ser um visionário para colocar a hipótese de algum dia alguém se lembrar de subir para a pala a pôr-se a saltar em cima dela”. Além disso, dado que o muro estava implantado desde 1996, o solo estaria “praticamente consolidado”. “Sem outros factores externos, a grande probabilidade era de que a peça assim ficasse por um tempo indefinido, mas necessariamente longo”, concluía.
Esta posição ilibou de responsabilidades a empresa gestora do condomínio do prédio servido pela estrutura de caixas de correio bem como os técnicos da Câmara de Braga ligados à fiscalização daquele local – em casos como este são as pessoas envolvidas e não a autarquia enquanto pessoa colectiva que podem ser acusados. Até então, a investigação foi orientada no sentido de determinar as causas “mediatas” da queda da estrutura, uma vez que havia da parte do município e do condomínio a obrigação de garantir a segurança de pessoas face àquela estrutura, lê-se no despacho a que o PÚBLICO teve acesso.
A acusação refere a existência de uma carta, enviada em Janeiro de 2010, pela própria empresa JM – Gestão de Condomínios, para a autarquia, alertando para “um muro” a norte do prédio em questão, que estava “a desmoronar”. A vistoria dos serviços da câmara confirmou o “risco de queda”. No entanto, os técnicos municipais referiam-se a um outro muro, de suporte de terras, contíguo ao que viria a desmoronar no ano passado. Quando, dias depois, voltaram ao local, viram que o segundo muro estava “reparado e pintado”, pelo que o caso foi arquivado.
Este o primeiro acto do que o Ministério Público classifica como “uma infeliz sucessão de acasos contribuiu para o desenlace fatal”. A empresa “convenceu-se de que, com a exposição que enviou à câmara, dera já cumprimento ao que lhe era exigido”, o chefe da Divisão de Fiscalização da Câmara de Braga “parece nem sequer ter tomado consciência do dever que sobre ele impendia” e o agente da Polícia Municipal que esteve no local é também exculpado pela acusação. Ainda em 2010 alertou o superior hierárquico para o mau estado do muro que caiu em Abril do ano passado, mas recebeu ordens para não se “meter nesse assunto pois a responsabilidade da manutenção desse mobiliário era dos correios e dos moradores”.
O Ministério Público classifica estes comportamentos como “omissões funcionais”, mas concluiu que não há crime da parte de nenhuma destas pessoas. As eventuais responsabilidades criminais do administrador do condomínio e dos dois funcionários municipais são afastadas “uma vez que ela não foram causais do resultado verificado”. Para a acusação, é claro que a queda da estrutura ficou a dever-se apenas “à força exercida pelos estudantes que para ela treparam”.
A queda do muro provocou a morte dos três estudantes de Engenharia Informática da Universidade do Minho, então com idades entre os 18 e os 21 anos, e ainda ferimentos noutros quatro colegas, na sequência uma “guerra de cursos” com colegas de Medicina. No momento de celebrar a “vitória” nessa batalha de cantigas e gritos, os quatro estudantes agora acusados de homicídios por negligência, hoje todos com 20 anos, subiram para o muro que suportava uma estrutura de caixas de correio, tendo a mesma desabado sobre os colegas que se encontravam junto a eles. O incidente aconteceu numa zona residencial usada quase em exclusivo por estudantes e ladeada por bares, junto ao campus de Gualtar da universidade.