Miguel Macedo interrogado durante seis horas como arguido nos vistos gold
Antigo governante é suspeito de três crimes de prevaricação de titular de cargo político e de um de tráfico de influências naquele processo. Interrogatório não terminou e o deputado terá de regressar.
De qualquer forma, uma vez que Miguel Macedo foi ouvido por uma procuradora, a única medida de coacção que lhe podia ser aplicacada era o termo de identidade e residência que é, aliás, inerente à condição de arguido. Tal significa que, se o ex-ministro se ausentar de casa por mais de cinco dias, terá de o comunicar ao Ministério Público (MP). Se o MP vier a pretender uma medida de coacção mais gravosa e restritiva da liberdade terá de requerer que o ex-ministro seja inquirido pelo juiz Carlos Alexandre. O magistrado é quem tem a cargo o processo no Tribunal Central de Instrução Criminal e só um juiz pode tomar essa decisão.
A audição de Miguel Macedo não decorreu no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) como seria normal. A procuradora Susana Figueiredo, titular deste inquérito, realizou o interrogatório no edifício do Gabinete de Documentação e de Direito Comparado da PGR a poucos metros do edifício do DCIAP. Com esta manobra, o MP trocou as voltas aos jornalistas que aguardavam Miguel Macedo, ao início da tarde desta terça-feira, à porta do DCIAP. Quando a comunicação social soube o local onde de facto ocorreria a audição, já Macedo tinha entrado, acompanhado pelo advogado Alfredo Castanheira Neves.
Também só depois das 15h, quando já decorria a audição, é que a PGR confirmou às redacções a realização do interrogatório. “Confirma-se que Miguel Macedo é ouvido hoje pelo Ministério Público, no âmbito do inquérito onde se investigam, entre outras, matérias relacionadas com a atribuição de vistos gold”, disse então a procuradoria.
São também visados na investigação, no âmbito do Operação Labirinto, o antigo presidente do Instituto dos Registos e Notariado (IRN), António Figueiredo, a ex-secretária-geral do Ministério da Justiça, Maria Antónia Anes, o ex-director do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Manuel Jarmela Palos, o sócio-gerente da empresa JMF Projects and Business, Jaime Gomes, e os funcionários do IRN Paulo Eliseu, Paulo Vieira, José Manuel Gonçalves e Abílio Silva, entre outros.
António Figueiredo é o único arguido que continua em prisão preventiva, indiciado por corrupção, tráfico de influências e abuso de poder.
São várias as suspeitas que pesam sobre Miguel Macedo. O MP acredita que o ex-ministro Macedo aproveitou as suas funções no Governo para pedir a Manuel Jarmela Palos, que trabalhava sobre a sua tutela, que favorecesse a empresa Intelligente Life Solutions, do empresário Jaime Gomes, na emissão de vistos para tratamento médico. Os procuradores procuram ainda mais esclarecimentos face a indícios de que Macedo pediu verbalmente a Jarmela Palos uma proposta de nomeação do oficial de ligação a Pequim, tendo em conta os interesses de Jaime Gomes, do presidente do IRN e de Zhu Xiadong, empresário chinês também arguido neste processo.
Os investigadores suspeitam também que Macedo terá passado informação privilegiada a Jaime Gomes, seu antigo sócio, num concurso internacional, dando-lhe acesso a documentação. Terá ainda intercedido junto da Autoridade Tributária para obter uma decisão relativa ao pagamento do IVA também favorável a uma empresa de Jaime Gomes.
O interrogatório a Miguel Macedo já estava previsto para esta altura, como o PÚBLICO noticiou há cerca de um mês. Em Julho, a Comissão Parlamentar de Ética retirou a imunidade parlamentar ao ex-ministro a pedido do Ministério Público (MP) com fundamento em indícios recolhidos no caso. O PÚBLICO tentou contactar sem sucesso Miguel Macedo. Mas certo é que, já em Abril, Miguel Macedo tinha ele próprio pedido o levantamento da imunidade parlamentar e logo então Macedo afirmou aos jornalistas a “disponibilidade para esclarecer aquilo que for entendido que deve ser esclarecido”.
Foi precisamente este processo que levou à demissão de Macedo em Novembro do ano passado, tendo o ex-ministro retomado o seu lugar de deputado. Três dias antes, a 13 de Novembro, a PJ fez buscas em ministérios e deteve 11 responsáveis na sequência de um processo em que são investigados indícios de corrupção activa e passiva, recebimento indevido de vantagem, prevaricação, peculato de uso, abuso de poder e tráfico de influências.