Governo regional manda abaixo obra de Jardim de 100 milhões de euros

Executivo vai reformular todo o sector empresarial público e admite vender património que está nas mãos das sociedades de desenvolvimento e concessionar o que não for possível alienar

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Público/Arquivo

A infra-estrutura, que esteve sempre inoperacional devido às deficientes condições de segurança, teve um orçamento inicial de 29,7 milhões de euros que derrapou para 36 milhões. Os danos causados por constantes tempestades na orla marítima e o risco de queda de pedras da encosta sobranceira interditaram o espaço, situado no concelho da Ponta do Sol. Jardim, contrariando estudos técnicos que desaconselhavam uma marina no local, insistiu em constantes intervenções e reparações, fazendo com que o custo inicial da obra quase quadruplicasse para 100 milhões de euros.

Esta obra – admite Albuquerque – apresentou desde o início problemas de funcionalidade, decorrentes das condições de mar no local, que foram deficientemente consideradas no projecto técnico e que se revelaram devastadoras para a infra-estrutura. “Perante os factos, o Governo regional decidiu iniciar o seu desmantelamento e recolha do respectivo equipamento, que será usado em outros empreendimentos de natureza pública”, justifica o presidente do executivo madeirense.

Muito criticada pela oposição – no mesmo ano, a menos de 20 quilómetros do local foi construído um porto de recreio no concelho vizinho da Calheta que custou 28 milhões de euros – a Marina do Lugar de Baixo foi a face mais polémica dos investimentos feitos pelas Sociedades de Desenvolvimento.

Estas sociedades, criadas por Jardim para contornar os limites de endividamento a que estava sujeito na altura, representam uma pesada “herança” para o actual governo madeirense, que admite vender o que conseguir e concessionar o restante.  “A reestruturação das Sociedades de Desenvolvimento, em articulação com os restantes acionistas [Municípios da área onde elas actuam] está a ser equacionado dentro do objetivo de reformulação de todo o setor empresarial regional”, acrescentou Albuquerque, adiantando que a fusão das quatro sociedades é contemplada.

Estas empresas públicas, que o Governo regional e as autarquias são únicos acionistas, chegaram a ter quatro conselhos de administração, sendo, desde há três anos, geridas por uma única administração chefiada pela ex-deputada do PSD Maria João Monte, que tem como vogais Pedro Jardim, filho do ex-presidente do Governo madeirense, e Miguel Vasconcelos. “Está em preparação, especificamente nos planos técnico, administrativo, financeiro e fiscal, o processo de reestruturação/fusão das Sociedades”, diz Albuquerque, que contabiliza em 30,5 milhões de euros o encargo que estas empresas representam anualmente para o Orçamento Regional. “Os montantes atribuídos asseguram todos os compromissos, nomeadamente o serviço da dívida e encargos com pessoal”, revela

Da mesma forma que Jardim defendeu as Sociedades de Desenvolvimento, e o investimento por elas concretizado, com a única forma de aproveitar fundos comunitários que de outra forma não iriam para a Madeira, também Albuquerque olha para o Programa Operacional 14-20, o novo quadro comunitário para a região, como uma oportunidade única para a” reconversão e requalificação” de alguns dos empreendimentos públicos herdados da anterior governação.  “Não aproveitar essa oportunidade não se coaduna com os objectivos e metas definidos ao nível do Programa Operacional Madeira 2014-2020, que este Governo subscreve”, afirmou, reconhecendo dificuldades em lidar com todo este património que está nas mãos das Sociedades.

Se alguns investimentos são de fácil resolução, como o Centro de Artes – Casa das Mudas, na Calheta, que passou para a “gestão directa” da Direção Regional da Cultura, ou a Quinta Magnólia, um espaço nobre no coração do Funchal que estava votado ao abandono, que Albuquerque também trouxe de volta para as mãos do Governo, outros são autênticos elefantes brancos. (ver outro texto)

As obras das sociedades de desenvolvimento têm espalhados pelo arquipélago mais de meia centena de bares e restaurantes em promenades, complexos balneares, parques desportivos e até num campo de golfe. Albuquerque admite que são “actividades questionáveis”, falando de uma estratégia que “ultrapassou o âmbito desejável de atuação das Sociedades”.

É preciso, diz, introduzir mecanismos de correcção, mas o problema começa aí. Muitos dos empreendimentos estão construídos em áreas de domínio público marítimo e a sua “alienação” é assim difícil. Por isso, sustenta, a fórmula encontrada é concessionar os espaços por um período temporal mais alargado. Foi o que aconteceu ao edifício construído na Praça do Mar, junto ao porto de cruzeiros do Funchal, que será concessionado a um grupo hoteleiro por 25 anos. É o que deverá acontecer com o Porto de Recreio da Calheta, pois no entender do PSD-Madeira pós-Jardim, não faz sentido o Governo ter marinas.

Novas abordagens e maior rigor

Há também novas abordagens a alguns investimentos como no campo de golfe do Porto Santo ou no Parque Temático, em Santana, mas o que puder ser vendido vai mesmo ser vendido.

O Palacete do Lugar de Baixo é um dos edifícios que o Governo madeirense pondera alienar. Construído no final do século XIX, o palacete foi recuperado por uma das Sociedades de Desenvolvimento, com o objectivo de receber eventos turísticos ou corporativos. Está fechado desde 5 de Março de 2004, um dia depois da inauguração. “O Palacete está a ser avaliado, para definição do procedimento a seguir: ou alienação ou concessão a privados”, esclareceu o governante. 

“A exigência de rigor no domínio financeiro, passa pela capacidade da Região em adquirir novas fontes de financiamento, assegurando os meios para promover a dinamização da economia”, justifica Albuquerque, que refere-se aos investimentos das Sociedades de Desenvolvimento como uma “herança” deixada pelo anterior Governo.

Mesmo assim, e “apesar da conjuntura difícil”, o chefe do Governo madeirense garante que a região autónoma tem cumprido com os compromissos e apresentado uma “evolução positiva” na redução da dívida, consolidação orçamental e sustentabilidade das finanças públicas.

As sucessivas “avaliações positivas” que a Madeira tem recebido no âmbito do Programa de Ajustamento Económico e Financeiro – que termina no final do ano – têm contribuído para devolver a “credibilidade” junto dos mercados, e Albuquerque espera que ainda este ano a Região consiga refinanciar-se sozinha.

“Os indicadores são claros. Comparativamente à realidade nacional, o rácio da dívida sobre o PIB da região autónoma é inferior ao do todo nacional, isto é, 107,4% enquanto ao nível do Estado ascende a 130,2%.”, diz o governante, acrescentando que a dívida global diminuiu 487 milhões de euros face a 2012. Neste percurso, as Sociedades de Desenvolvimento que Jardim utilizou para ocultar o endividamento da região, assumem um papel fundamental, daí que o actual presidente do executivo regional queira resolver esta “herança” não só em termos financeiros, como também políticos.

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