Tsipras aconselha Europa a "retomar o caminho da solidariedade"
Chefe do Governo da Grécia reúne-se com o Presidente russo, Vladimir Putin, e assina protocolo na área da energia.
Depois de uma passagem por Moscovo no início de Abril – que coincidiu também com uma semana particularmente difícil nas negociações sobre o pagamento dos empréstimos à Grécia –, Tsipras chegou quinta-feira a São Petersburgo e falou nesta sexta-feira com o Presidente Vladimir Putin, à margem do Fórum Económico Internacional, um evento que se realiza todos os anos na segunda maior cidade russa.
"A União Europeia, de que fazemos parte, deve retomar o caminho dos seus princípios estatutários: a solidariedade, a democracia, a justiça social. Isto torna-se impossível quando nos colamos a políticas de austeridade e a políticas que prejudicam a coesão social, que agravam a recessão", declarou Tsipras.
Para o primeiro-ministro grego, os principais líderes da União Europeia têm de mudar a sua visão do mundo.
"O mundo ficou diferente depois da crise de 2008. Nós, na Europa, tínhamos a ilusão de que éramos o centro do mundo, e apenas colaborávamos com os nossos vizinhos mais próximos. Mas o centro já mudou de lugar, e agora há novas forças a desempenhar papéis importantes a nível económico e geopolítico", disse Alexis Tsipras, prosseguindo com um elogio à união euroasiática proposta por Vladimir Putin – um bloco regional que esteve também na origem da crise na Ucrânia, em finais de 2013, quando o então Presidente, Viktor Ianukovich, travou as negociações com a União Europeia, virando-se para Moscovo.
"A União Euroasiática é um novo bloco de integração regional, e é um potencial exemplo de novas fontes de produção de riqueza, benefícios e novas potências económicas", afirmou o primeiro-ministro grego.
Alexis Tsipras falou ainda do período de maior afastamento entre a Rússia e o Ocidente, reafirmando a sua oposição às sanções impostas a Moscovo, mas deixando também reparos sobre todos os aspectos da crise na Ucrânia – que envolve, directa ou indirectamente, tanto a União Europeia como a Rússia.
"A crise na Ucrânia abriu uma nova ferida no coração da Europa, uma ferida de instabilidade. E isto é um mau sinal para as relações internacionais, porque em vez de prosperidade e cooperação económica na região, assistimos a um processo que leva à guerra, à militarização e a sanções."
Negócio no sector da energia
Em termos comerciais, os dois líderes deram mais um passo para colaborarem na construção de um gasoduto para transportar o gás natural russo até à Turquia através do Mar Negro, mas que Moscovo pretende estender a países da União Europeia, como a Grécia, com o objectivo de continuar a alimentar o mercado europeu sem depender do território ucraniano.
Putin e Tsipras falaram sobre este e outros assuntos em Abril, mas nesta sexta-feira os seus governos assinaram um protocolo detalhado, apesar de não ser definitivo – se se concretizar, o segmento grego do gasoduto TurkStream será construído entre 2016 e 2019, por uma sociedade detida em partes iguais, mas financiada na totalidade pelo banco de desenvolvimento russo Vnesheconombank (VEB).
A proximidade entre os governos grego e russo tem deixado os Estados Unidos em alerta (devido ao receio de que a Grécia fure o consenso na União Europeia sobre as sanções) e muitos líderes e analistas europeus a especularem sobre um eventual pedido de ajuda financeira de Atenas a Moscovo. Segundo o site da estação alemã Deutsche Welle, "o financiamento para a construção do gasoduto pode ser precisamente isso – um adiantamento por parte do Kremlin". As autoridades russas negam que a Grécia tenha pedido qualquer ajuda financeira directa, e dizem que o país não teria capacidade para fazê-lo devido a restrições orçamentais.
Apesar da especial sensibilidade deste negócio – quando as relações entre Moscovo e o Ocidente atingiram o ponto mais baixo desde o fim da Guerra Fria, e no auge da batalha que opõe o Governo grego às instituições europeias e ao Fundo Monetário Internacional –, a Rússia assinou também memorandos de entendimento com empresas da Alemanha, da Áustria, do Reino Unido e da Holanda.
Através da gigante Gazprom, Moscovo pretende duplicar o fornecimento de gás à Europa com a colaboração da alemã E.on, da austríaca OMV e da multinacional anglo-holandesa Shell, aumentando a capacidade do gasoduto que liga a Rússia à Alemanha através do Mar Báltico.
Negando que a Rússia esteja a atravessar uma profunda crise económica – apesar das sanções e da forte queda nos preços do petróleo, que contribuem para uma previsão de queda de 3% no Produto Interno Bruto em 2015 –, o Presidente Vladimir Putin mostrou-se disposto a negociar com todos, dos novos actores internacionais aos velhos parceiros europeus.
"A nossa cooperação activa com os novos centros do crescimento mundial não significa em caso algum que iremos prestar menos atenção ao diálogo com os nossos parceiros tradicionais no Ocidente. Estou convencido de que essa cooperação irá continuar", declarou Putin, concluindo que "a Rússia está aberta ao mundo".