Um em cada cinco gays não sabe se está infectado com VIH

Muitos dos homens que têm sexo com homens não querem saber se estão ou não infectado com VIH. É preciso mudar a forma como se faz a prevenção, defende especialista.

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KOSTAS TSIRONIS/Reuters

Não se trata de um problema de acesso, de facto: no grupo dos inquiridos que nunca tinham feito o teste, 81% diziam ter a certeza de que podia fazê-lo, se quisesse. “O que acontece é que há uma forma diferente de viver o problema, há uma desvalorização do risco”, sintetiza Henrique Barros, que preside ao ISPUP e já foi coordenador nacional para a infecção VIH/sida.

Uma desvalorização que pode revelar-se perigosa: do total de cerca de cinco mil participantes portugueses neste inquérito internacional, 10,9% diziam estar infectados com o vírus VIH e aproximadamente metade tinham sido diagnosticados há cinco ou menos anos.

Apesar de outros estudos apontarem para “números parecidos”, Henrique Barros acredita que a percentagem de infectados em Portugal "provavelmente será menor",  porque o recrutamento dos participantes neste inquérito realizou-se através das redes sociais, de blogues e da divulgação em eventos da comunidade gay.

Realizado em 38 países, o inquérito EMIS (European men who have sex with men - Internet Survey) foi concluído há dois anos e os resultados finais foram agora traduzidos e vão ser debatidos pelo ISPUP e pelo Grupo Português de Activistas sobre Tratamentos VIH/sida (GAT), que são responsáveis pela sua coordenação em Portugal.

Do total de 5187 participantes em Portugal, perto de 70% identificaram-se como homossexuais ou gays, mas 62% indicaram que a maior parte das pessoas das suas redes sociais desconheciam a sua orientação sexual (ou seja, “viviam dentro do armário”), lê-se nas conclusões do estudo.

Outro dado que se destaca desta investigação e preocupa os investigadores prende-se com as relações sexuais desprotegidas. Mais de metade dos participantes admitiu ter tido sexo com parceiros ocasionais no último ano e, neste tipo de relações, cerca de um terço não usou preservativo. A agravar, entre os que disseram ter utilizado este tipo de protecção, 85,6% admitiram não o ter feito de forma correcta.

Mesmo no contexto de uma relação estável, 16% afirmaram ter praticado penetração anal não protegida com parceiros que não sabiam se estavam infectados. Além disso, 82% reconheciam ter frequentado, nas últimas quatro semanas, “lugares de engate” onde homens se encontram para ter sexo.

Mas não é só a exposição ao VIH que preocupa os investigadores. Cerca de 30% dos inquiridos admitiram ainda não estar vacinados ou estar apenas parcialmente vacinados contra o vírus da hepatite B, outra infecção sexualmente transmissível.

Para Henrique Barros, estes resultados provam o “reassumir de um à vontade” nas relações sexuais desprotegidas que gerações anteriores evitavam, numa altura "em que viam os amigos a morrer à sua volta". Por isso, advoga, é preciso "repensar os modelos de prevenção". "O que andamos a fazer não pega”, enfatiza, propondo, como uma das alternativas à “fadiga do preservativo”, a toma de antiretrovíricos antes das relações sexuais, a chamada profilaxia pré-exposição.

Três décadas após o aparecimento desta epidemia, em Portugal os casos de transmissão da infecção pelo VIH relacionados com o sexo entre homens correspondem a cerca de um terço do total dos diagnosticados em homens. O problema é que, apesar da diminuição do número global de infecções e de casos de sida observados nos últimos anos, os casos em homens jovens que têm sexo com outros homens estão a aumentar.

Por tudo isto, reitera o presidente do ISPUP, “é muito importante fazer prevenção nos locais da comunidade gay, explicar que há tratamento, mas não há cura e que os efeitos laterais da medicação são muitos” e pôr organizações não governamentais  a fazer este trabalho, porque uma tarefa deste teor não se adequa ao modelo de funcionamento das estruturas formais de saúde, com horários fixos.

Na prática, o ex-coordenador nacional para a infecção VIH/sida propõe a instalação, em cidades de maior dimensão, como o Porto, de estruturas de detecção da infecção e de intervenção comunitária do tipo do CheckpointLX, em Lisboa, que foi “pioneiro”. O CheckpointLX é um centro de base comunitária para o rastreio rápido, anónimo, confidencial e gratuito do VIH e outras infecções sexualmente transmissíveis, e ainda para aconselhamento e encaminhamento para os cuidados de saúde.

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