Contratações pelas escolas postas em causa pela Provedoria da Justiça
Critérios de contratação para as Actividades de Enriquecimento Curricular “podem colidir com o direito fundamental de acesso à função pública em condições de igualdade e liberdade”.
Depois de ter recebido diversas queixas de candidatos a lugares abertos nas AEC durante o actual ano lectivo, a Provedoria de Justiça encontrou quase sempre situações em que as entidades promotoras valorizaram os candidatos que já tinham trabalhado nas instituições, havendo casos de discriminação feita directamente através dos critérios de avaliação ou em entrevista.
Saber se leccionou nas AEC do município ou do agrupamento ou pedir o número de dias de serviço efectivo na leccionação de AEC do seu agrupamento foram alguns dos critérios de selecção encontrados no relatório assinado pela provedora Helena Vera-Cruz Pinto, que refere ainda situações em que o local de residência do candidato foi usado como critério de desempate. Em alguns casos, a experiência profissional na instituição promotora representou entre 35% a 65% da classificação final e noutros casos foi o “principal critério de desempate”, refere o documento, divulgado nesta segunda-feira no site da Provedoria.
A autora do relatório considera que estes critérios “podem colidir com o direito fundamental de acesso à função pública em condições de igualdade e liberdade”. “Não pode considerar-se admissível, sem que exista um fundamento objectivo, a discriminação dos candidatos em função do local de residência, nem podem deixar de ser igualmente valoradas a formação e a experiência profissionais relevantes para o exercício das funções (...) apenas por não terem sido adquiridas num específico local ou enquadramento institucional”, lê-se no documento.
As entidades visadas justificaram a opção com a necessidade de garantir a continuidade pedagógica, a estabilidade dos projectos em curso e de ter com rapidez as pessoas necessárias. No entanto, a provedora adjunta considera “inadequada e excessiva” a adopção destas medidas uma vez que afasta do lugar outros candidatos.
Outra das falhas encontradas prende-se com o facto de alguns concursos aceitaram apenas professores, apesar de a legislação não exigir aos técnicos ter a habilitação profissional para a docência mas, apenas, serem detentores de currículos relevantes.
“A adopção de critérios vagos, geradores de dúvidas, ou dificilmente justificáveis face aos objectivos do procedimento, pode também ser observada com frequência nos avisos de abertura deste tipo de procedimentos”, acrescenta o documento. A provedora exemplifica com um concurso ao qual puderam concorrer professores com qualificação para dar aulas de educação física no 2.º ciclo, mas foram recusados os docentes com formação para dar aulas aos alunos do 3.º ciclo e secundário. Também foram encontrados casos em que havia apenas um critério de selecção como a graduação profissional ou o número de dias de serviço devidamente comprovados na leccionação de AEC.
A legislação em vigor não obriga à avaliação das candidaturas por um júri nem se prevê prazos especialmente curtos para a apresentação e apreciação de reclamações ou recursos e, por isso, nem sempre há um órgão colegial a analisar as candidaturas, nem houve audiência de interessados.
Estas situações levaram a Provedoria da Justiça a endereçar ao secretário de Estado um conjunto de reflexões e sugestões, “com o intuito de evitar a repetição dos problemas ocorridos e, assim, contribuir para o aperfeiçoamento da acção administrativa”.
Sugere, por isso, que sejam promovidas medidas que possam garantir que venham a ser “adoptados procedimentos e critérios conforme às pertinentes normas legais e constitucionais” e recomenda que, “caso venham a revelar-se necessárias, sejam promovidas as alterações legislativas tidas como adequadas para alcançar uma mais equilibrada articulação entre os direitos e interesses dos candidatos e o interesse público na célere contratação dos técnicos responsáveis pelo desenvolvimento de AEC”.