Estado negoceia compra de obras do BPN para o Museu do Chiado

Além da colecção Miró, as empresas que gerem os activos do BPN têm na sua posse uma colecção de arte contemporânea de 247 obras avaliada em 3,6 milhões de euros. Estado está a negociar pinturas de portugueses para a ampliação do Museu do Chiado.

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Vai ser inagurado em breve o novo espaço expositivo do Museu do Chiado Gonçalo Santos

Ao que o PÚBLICO apurou, o negócio está a ser feito pela Direcção-Geral do Património Cultural e deverá ficar concluído nas próximas semanas. Na posse da Parvalorem e da Parups, empresas criadas para abater a dívida do BPN, estão, além da colecção Miró, 247 obras de arte avaliadas em 3,6 milhões de euros. Nesta colecção estão representados artistas como Amadeo de Souza-Cardoso, Eduardo Batarda, Helena Almeida, Maria Helena Vieira da Silva, René Bertholo, Paula Rego, Pedro Cabrita Reis, Noronha da Costa e Nadir Afonso.

Francisco Nogueira Leite, presidente da Parvalorem e da Parups, já tinha revelado no ano passado, logo a seguir ao polémico anúncio de venda das 85 obras de Joan Miró, que as restantes obras de arte herdadas do BPN também seriam vendidas. À intenção anunciada seguiu-se um exaustivo processo de inventariação, armazenagem e avaliação. Um ano depois, as empresas têm condições para passar à venda da colecção. Desta vez, ao contrário do que aconteceu com a colecção Miró, as obras não vão ser vendidas de uma assentada nem serão postas no mercado num leilão internacional.

“A ocorrer algum leilão com estas obras será sempre em Portugal para motivar que se mantenham no país”, diz ao PÚBLICO Nogueira Leite, explicando que como neste caso se tratam de obras de artistas maioritariamente nacionais o objectivo é “estudar a possibilidade de alguma entidade pública e/ou institucional poder dispor de uma verba igual ao valor da sua avaliação e integrar as obras nos seus activos”.

Em causa estão 247 obras, das quais 175 avaliadas em 2,6 milhões de euros estão na posse da Parups, e as restantes, 72 no valor de um milhão de euros, pertencem à Parvalorem. À semelhança, aliás, do que acontece com as obras de Miró, também elas divididas pelas duas empresas criadas pelo Ministério das Finanças para recuperar os créditos do BPN.

Neste conjunto, estão 120 artistas representados de 14 nacionalidades, de Espanha (como Antoni Tápies ou Miquel Barceló) aos Estados Unidos (John Baldessari ou Lawrence Weiner), de Angola (António Olaio) à Escócia (Douglas Gordon), até à Alemanha (Günther Förg ou Peter Zimmermann) e ao Irão (Shirin Neshat). A maioria das peças, no entanto, são de artistas portugueses – são 155 no total.

Estas obras, cuja origem, de acordo com Nogueira Leite, “resulta do espólio do ex-BPN e de dações em pagamento para regularização de dívidas por parte de devedores do banco”, correm as diferentes gerações da arte contemporânea portuguesa.

Amadeo de Sousa-Cardoso (1887-1918), Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992), Nadir Afonso (1920-2013), Mário Cesariny (1923-2006), Júlio Pomar (1926), Manuel Cargaleiro (1927), Helena Almeida (1934), Paula Rego (1935), René Bértholo (1935-2005), Noronha da Costa (1942), Eduardo Batarda (1943), António Palolo (1946-2000), Julião Sarmento (1948), Pedro Cabrita Reis (1956), João Louro (1963) ou João Pedro Vale (1976) fazem parte deste conjunto. Há artistas com mais do que uma peça: há cinco pinturas de Vieira da Silva, quatro obras de Helena Almeida e três de Paula Rego, por exemplo.

O PÚBLICO sabe que o Estado está a negociar a compra de algumas destas obras para o Museu Nacional de Arte Contemporânea – Museu do Chiado (MNAC – MC), em Lisboa, que em breve inaugurará um novo espaço expositivo. Estão na fase final as obras de ampliação deste museu, instalado no Convento de São Francisco. Há muito tempo que as diferentes direcções do Museu do Chiado, agora orientado por David Santos, se queixavam de falta de espaço para mostrar uma das mais importantes colecções de arte públicas do país.

No ano passado, exactamente no dia em que o leilão em Londres das 85 obras de Miró foi cancelado, o secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, anunciou a assinatura de um protocolo com os Ministérios da Administração Interna e das Finanças para a cedência de parte do convento, duplicando assim o espaço expositivo disponível para o museu. O que deverá acontecer é que o Museu do Chiado passe a ocupar os espaços do convento afectos à Polícia de Segurança Pública (PSP) e ao extinto Governo Civil de Lisboa, ganhando mais 3273 metros quadrados.

O PÚBLICO procurou saber junto do director do Museu do Chiado quais as obras da colecção do BPN que vão ser adquiridas mas David Santos remeteu a questão para a Direcção-Geral do Património (DGPC), que está conduzir o processo. Questionada, a direcção chefiada por Nuno Vassallo e Silva não quis fazer comentários. Do gabinete de Barreto Xavier veio apenas a confirmação via email através de João Póvoas, assessor para a comunicação da SEC, do interesse nas obras: “Por iniciativa do Secretário de Estado da Cultura foi contactada, há largos meses, a Parvalorem com o intuito de melhor perceber a situação dos acervos artísticos detidos por esta empresa, nomeadamente, as obras de artistas portugueses”. O PÚBLICO sabe, no entanto, que as obras em questão já foram sinalizadas e o processo de compra está a acontecer. Barreto Xavier espera que a venda se conclua ainda nas próximas semanas.

Francisco Nogueira Leite remete também para a tutela quaisquer esclarecimentos sobre este negócio mas não esconde que gostava “que os quadros nacionais ficassem em Portugal”. “Para o efeito a entidade competente, que é a Secretaria de Estado da Cultura, será quem poderá tentar, dentro das suas disponibilidades, ajudar a cumprir essa possibilidade”, diz o presidente da Parvalorem e da Parups. Mas alerta: “A Parups não faz política quer cultural quer de nenhuma natureza pelo que apenas tem por função alienar activos para amortizar os custos para os contribuintes do ex-BPN.”

Todas as obras serão vendidas, garante. No Relatório e Contas de 2014 das duas empresas, lê-se que tal deverá acontecer “num curto prazo”. O Estado tem prioridade, mas aquilo que não quiser comprar será levado à praça. “O leilão garante transparência e potencia o maior encaixe possível”, acrescenta Nogueira Leite, esclarecendo que a escolha da leiloeira seguirá o mesmo método com que foi seleccionada a empresa encarregue de vender as obras de Miró (neste caso, a Christie's de Londres). A Parvalorem e a Parups estão abertas às propostas das leiloeiras e depois decidir-se-ão pela que melhores condições apresentar.

Nogueira Leite garante ainda que a venda destas obras não está ligada de forma alguma à venda da colecção Miró, ainda pendente por processos judiciais. Não considera, por isso, que a controvérsia em torno da alienação das peças do artista catalão afecte a venda deste conjunto, que avançará independentemente do que acontecer com as obras de Miró, que o presidente das empresas espera vender ainda este ano. “Todas as diligências judiciais, até esta data, foram totalmente favoráveis às Sociedades Par’s [Parvalorem e Parups].”

 

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