“Da nossa parte acabou o segredo de justiça”, declara advogado de Sócrates

João Araújo passará a informar a comunicação social de todos os documentos que enviar para o tribunal no âmbito da Operação Marquês.

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João Araújo diz que o recurso “tem óptimos fundamentos” Enric Vives-Rubio

“Da nossa parte acabou o segredo de justiça”, declarou João Araújo, acrescentando que passará a informar a comunicação social de todos os documentos que enviar para o tribunal. A violação do segredo de justiça é crime e é precisamente por isso que a Procuradoria-Geral da República (PGR) abriu um inquérito na sequência da divulgação das transcrições do interrogatório: para descobrir a origem da fuga de informação.

Esta será a primeira vez que a gravação de uma inquirição chega à opinião pública nesta fase processual. Desde 2013, que a lei passou a exigir as gravações e o DCIAP adquiriu “um sistema de gravação vídeo e áudio para as duas salas de inquirições”, informou a PGR, segundo a qual os depoimentos deixaram de “estar documentados em auto escrito”.

Neste caso, João Araújo tem-se queixado repetidamente de que o sigilo tem beneficiado exclusivamente a acusação em vez de servir para garantir a eficácia da investigação e proteger o direito do arguido à presunção de inocência. E não tem hesitado em apontar o procurador encarregue do caso como estando na origem das fugas de informação.

Contudo, no âmbito do inquérito à violação do segredo cuja abertura foi confirmada pela PGR, o próprio advogado, como todos os que tiveram acesso às gravações do interrogatório, são supeitos. “Na sequência de requerimento, foi entregue ao advogado do arguido José Sócrates cópia do DVD com as declarações prestadas no interrogatório”, confirmaou a procuradoria, em resposta ao PÚBLICO.

“Estamos perante uma violação grosseira com estrondo do segredo de justiça”, sublinhou o presidente da Associação de Advogados Penalistas, Paulo Sá e Cunha. Por outro lado, o jurista considera que é “caricato” manter o segredo neste processo de “interesse público”. Ou “se conclui rapidamente o inquérito e cai o segredo ou levanta-se o segredo que está a servir para alimentar especulações”, alertou o jurista que admite que em “defesas difíceis os advogados têm de manobrar nos média para tentar manter igualdade de armas” face às acusações aos arguidos.

Em causa está a publicação, na revista Sábado, de transcrições do interrogatório de 27 de Maio. As perguntas mostram que o Ministério Público (MP) suspeita que o ex-primeiro-ministro terá recebido luvas do empresário Hélder Bataglia para que o Governo aprovasse uma lei para favorecer o empreendimento imobiliário de Vale do Lobo, no Algarve.

“Considero grave que estas transcrições sejam publicadas. Não se percebe como é que num processo destes ainda é possível uma violação tão flagrante do sigilo. Não me lembro de alguma vez aparecer transcrito desta forma um acto processual em segredo de justiça – penso que é inédito”, diz o advogado especialista em Direito da Comunicação, Francisco Teixeira da Mota.

A ex-directora do DCIAP e actual procuradora no Supremo Tribunal de Justiça, Cândida Almeida, considera estar em causa um “caso grave de violação do segredo de justiça”. Admite que “quando os processos estão em segredo de justiça há casos em que passa cá para fora qualquer coisa, mas não desta forma e com esta extensão”.

Além disso, a magistrada lamentou que com estas situações a justiça fique "fragilizada, descredibilizada e mal vista", considerando que "se foi longe de mais" [na violação do segredo de justiça] e que "quando a própria justiça é alvo da violação das regras legais, há qualquer coisa que está doente".

Quanto ao pode agora ser feito, Cândida Almeida explicou que "nestas situações podem ser abertos inquéritos-crime e, cumulativamente, inquéritos disciplinares, para apurar todos os que tiveram acesso à gravação: funcionários, magistrados e polícia".

A defesa de Sócrates negou ontem qualquer favorecimento ao empreendimento Vale do Lobo, o que diz ser uma “afirmação insensata e falsa, sem qualquer fundamento, mesmo inventado”. Numa nota, João Araújo sublinhou que o Plano Regional de Ordenamento do Território para o Algarve (PROT), aprovado em 2007, “não visou favorecer nem favoreceu nenhuma empresa ou entidade particular”. O advogado recordou que os trabalhos deste plano se iniciaram no tempo do Governo Durão, prosseguiram com o de Santana Lopes e ficaram concluídos em 2007, já no de Sócrates. Acusou o MP de lançar “ao vento” novas suspeitas para manter “o circo a funcionar”. “O que foi posto em causa foi, mais do que a honra dele, a honra do Governo e das pessoas que intervieram na elaboração do PROT Algarve 2”, sublinhou.  

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