PS quer dar ao Superior parte do IRS dos ex-alunos, mas ideia não é consensual

Relatório Uma década para Portugal prevê que uma parte do IRS pago por ex-alunos seja canalizada para a universidade que frequentaram e pode vir a representar um aumento de 10% do financiamento no ensino superior.

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Daniel Rocha

Tal como a possibilidade já oferecida ao cidadão de consignar 0,5 % do IRS a pagar a uma instituição religiosa ou de beneficiência (ou com actividades culturais, se passar outra proposta do PS que o Parlamento vota já na sexta-feira) escolhida por si, também a consignação de uma percentagem do imposto à instituição de ensino superior onde se formou não representa qualquer custo acrescido para o cidadão. A percentagem a dedicar ao estabelecimento de ensino não está ainda definida. Apenas se sabe que será “bastante baixa”, diz ao PÚBLICO Manuel Caldeira Cabral, um dos 12 autores de Uma Década para Portugal.

O economista sublinha que esta proposta não pressupõe a cobrança “de mais uma taxa adicional sobre os alunos”, mas sim a canalização “não voluntária” de uma parte do imposto para os estabelecimentos de ensino superior, que assim poderiam ver reflectido “no seu financiamento o valor que os seus alunos criaram no mercado”. Algo que, acrescenta, “pode ser medido pelos impostos que pagam”. Só vários anos após a implementação desta medida se poderá avaliar o impacto real da mesma, mas, mesmo sem percentagem definida, Manuel Caldeira Cabral fala “num aumento de financiamento para o ensino superior na ordem dos 10%”.

Docente da Nova School of Business & Economics (SBE), da Universidade Nova de Lisboa, ?Pedro Santa Clara considera a proposta "oportuna”, mas acha “péssimo” que seja “algo compulsivo”. Pedro Santa Clara também é responsável pelo projecto do novo campus da Nova SBE em Carcavelos, que está a ser construído com apoio financeiro de antigos alunos. “A graça toda disto é ser voluntário”, diz o professor. “O compulsivo torna-se muito ineficiente (...) Passa, no fundo, a ser um imposto especial para antigos alunos”, comenta a propósito da proposta do PS.

Estudantes vêem medida como “avulsa”
Mostrar “às universidades que os esforços de empregabilidade de hoje teriam um retorno no futuro” é um dos objectivos da proposta, que preconiza um maior envolvimento das instituições de ensino superior na inserção dos estudantes no mercado de trabalho. “Em vários países da Europa e dos Estados Unidos, as universidades têm uma rede de contactos muito grande com empresas e ex-alunos que estão em empresas e usam esses contactos, local e globalmente, para arranjar estágios, encontrar e divulgar empregos”, refere Caldeira Cabral. O mesmo é feito em Portugal, “mas de forma muito variável e com poucos recursos”.

O presidente da Associação Académica da Universidade do Minho (AAUM), Carlos Videira, vê esta sugestão como “avulsa”. “É nosso entendimento que o problema do subfinanciamento do ensino superior deve ser resolvido ao nível das escolhas políticas, e não da consignação do IRS dos cidadãos”, opina o também mestrando em Direitos Humanos pela. Carlos Videira, de 24 anos, fala “numa espécie de duplo financiamento: o que já vem do Orçamento do Estado (proveniente das receitas do Estado, nomeadamente dos impostos) e, depois, um adicional por parte dos cidadãos”.

“O salário de um aluno licenciado é cerca de 70% superior ao salário de alguém que tem apenas o 12.º ano. Isto significa que o facto de as pessoas passarem pela universidade cria um valor nelas próprias, que gera um retorno para os cofres do Estado, porque pagam mais IRS”, argumenta Caldeira Cabral. Com esta medida , “uma parte do valor criado na sociedade regressaria às universidades e sinalizaria a ideia de que fazer esforços para integrar mais rapidamente os alunos no mercado de trabalho compensa”.

A empregabilidade, contrapõe Carlos Videira, que cumpre o terceiro mandato como presidente da AAUM, “depende muito dos cursos, da oferta formativa que a universidade tem e também daquilo que é a região na qual está inserida”. “Teríamos, através deste modelo de financiamento, verbas muito diferentes de instituição para instituição”, critica.

Questões práticas “têm que ser estudadas”
Já Pedro Santa Clara sugere que o foco não seja colocado em antigos alunos, mas sim “em equiparar as faculdades a instituições de solidariedade social para efeitos de doação de IRS”. “Seria algo da mais elementar justiça, numa altura em que o Estado diminui fortemente o financiamento do ensino superior”, acredita. “Sou a favor de tudo o que tenha a ver com a meritocracia e o apreço pelas instituições. Acho que as pessoas poderiam escolher, por exemplo, dar parte do seu IRS à faculdade dos seus filhos ou ao seu hospital.”

As questões práticas “têm que ser estudadas”: a consignação poderá realizar-se “nos primeiros dez anos [após a saída do ensino superior] ou ao longo de toda a vida contributiva”, revela Caldeira Cabral, acrescentando que se trata de algo a ser “ajustado à proporção” e que terá de ser negociado com o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) e com as próprias instituições.

Para o economista, operacionalizar a medida em termos informáticos “não seria uma coisa difícil”. “Quando entregassem os diplomas aos alunos, as universidades poderiam pedir-lhes o Número de Identificação Fiscal e enviá-lo para o Ministério das Finanças”, exemplifica. Certo é que uma medida como esta, desenvolve, tornaria o financiamento do ensino superior “mais previsível, a longo prazo, e menos dependente do Orçamento do Estado”. A questão dos antigos alunos cuja formação passou por mais do que uma instituição de ensino superior ainda não foi abordada.

O presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), António Cunha, afirmou ao PÚBLICO que, até à próxima reunião do órgão “não há uma posição" sobre a proposta do PS. Ainda assim, sublinhou, "o CRUP vê sempre como positivo que os partidos ponham na sua agenda política as questões do financiamento do ensino superior”.

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