Genocídio arménio: “Vai doer, vai doer sempre”

Desde criança que a pianista arménia Marina Dellayan se lembra de passar a noite de 23 e o dia de 24 de Abril em marchas contínuas para o memorial do genocídio – todos os avós são sobreviventes. Foi há 100 anos. Dói mais por ser questionado.

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Enric Vives-Rubio
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A pianista não estava sozinha quando chegou a Portugal. Primeiro vieram e irmã e o cunhado, convidados para a Orquestra da Fundação Gulbenkian, depois eles tiveram um filho e a mãe de ambas, já viúva, veio para ajudar. Ela, assim que chegou, depois de três anos a ensinar em Moscovo, já tinha trabalho como professora na Escola de Música de Nossa Senhora do Cabo, em Linda-a-Velha, actividade que mantém para além dos concertos.

“O que me espantava aqui, naquela época, era a tranquilidade, sem os sobressaltos a que estávamos habituados, em Erevan ou então também em Moscovo. Só sonhava com essa tranquilidade total”, conta. “Era uma altura muito complicada. Em 1988, começámos as manifestações grandes, poderosas, milhares de pessoas nas ruas para pedir a independência, e depois [a guerra de] Karabakh e o terramoto no Norte da Arménia. As tropas entraram na cidade, havia recolher obrigatório. Em Erevan, não houve combates; na fronteira com o Azerbaijão, sim”.

Karabakh é a região que os arménios reclamam como parte da Arménia histórica, ocupada pelo Azerbaijão. Ainda hoje se morre na fronteira, na quarta-feira foi um soldado azeri, no ano passado foram 15 dos dois lados nos piores confrontos em muito tempo. A Arménia de hoje “é um pedaço da Arménia que sobreviveu, mas o país histórico está em grande parte na Turquia actual, também no Irão, Karabakh está ocupada pelo Azerbaijão. Nakhcivan também.”

Aos 30 anos, Marina já tinha casado e veio com os dois filhos, ainda pequenos. A pianista tem com ela o que sobra da família nuclear. E como os arménios em Portugal, “uma comunidade que não existe enquanto tal”, não tinham nada organizado para o centenário do genocídio, ela e o actual marido, português, organizaram uma missa para a noite de quinta-feira, 23, na Igreja de São Nicolau, em Lisboa. Convidaram todos os arménios e todos os amigos.

O filho mais novo, que estuda jazz na Holanda, não veio, mas o mais velho, engenheiro em Sines, sim. Irmã e cunhado também, regressados de Paris, onde participaram num concerto de homenagem às vítimas pela Orquestra Mundial Arménia. Povo de diáspora, que assim às vezes se junta para tocar e chorar. A mãe de Marina também cá está, claro, viúva há exactamente 25 anos.

A mãe, diz Marina, vive estes dias “assim como eu, igual, com muitas emoções, muita memória, sempre a lembrar-se dos pais, da nossa história, ela tem televisão arménia, sempre ligada, e passam 24 horas de reportagem no memorial”.

Tinha de ser
Lá é Tsitsernakaberd, o memorial às vítimas erguido em 1967 numa colina perto do centro de Erevan, uma estela de 44 metros que simboliza o renascimento da Arménia, doze blocos de pedra pelas doze províncias perdidas para a Turquia, no centro um círculo e a 1,5 metros de profundidade, a chama sempre acesa pelos 1,5 milhões de mortes.

As datas têm destas coisas. Mesmo se Marina diga que “não foi um dia nem meses, foram décadas”. E foram. Mas o 23 é o 23, o 24 de Abril é o 24 de Abril. E calhou o pai de Marina morrer a 23.

“Tinha de ser. É algo mais forte do que nós e não sei dizer com palavras. No dia 23, era a estreia de uma obra dele, Requiem Triunfal, para órgão, com um organista arménio-americano que já tinha tocado em todo o mundo, Japão, Alemanha, Itália, Estados Unidos, Canadá, era o dia em que ia tocar em Erevan. O meu pai estava no hospital e tínhamos autorização dos médicos para sair, ir ao concerto e voltar. E ele faleceu umas horas antes. Não chegou a ouvir.”

E é por isso que o padre da Igreja de São Nicolau também disse o nome do pai de Marina, Harutiun Dellayan, o compositor. O trio que Marina, a irmã e o cunhado fundaram já em Portugal chama-se, claro, Trio Dellayan. “Juntámos o genocídio à homenagem ao meu pai. O meu pai nunca estaria à parte porque a vida toda que viveu e a obra toda que deixou está organicamente ligada ao dia.”

Faltar à escola
Foi este pai e a mãe também que desde sempre levaram Marina e a irmã ao memorial. “Comprávamos muitas flores e depois fazíamos a marcha, começava no dia 23 à noite e era uma marcha sem parar”, diz, as primeiras lágrimas da conversa a escorrerem pelo rosto. “Primeiro ia com a minha turma, depois outra vez com primos e outros amigos, a seguir com a família, era o dia todo, uma e outra vez, era o dia todo dedicado” a esta evocação, memória de dor e de sobrevivência.

Que, na escola, era um exercício de rebeldia. Porque a Arménia onde Marina cresceu não se chamava Arménia, chamava-se União Soviética. “Os professores diziam que ninguém podia faltar às aulas no 24 de Abril. E, para nós, era um sinal de rebeldia total, nem pensar, ‘vamos faltar’. Toda a turma combinava num sítio, os outros faziam o mesmo. Combinávamos e íamos até Tsitsernakaberd. O dia era todo passado naquele sítio, era sempre assim.”

Nunca mais calar
Estes eram os tempos em que toda a gente sabia e pouco se falava. Aliás, o memorial, que calha ter a idade de Marina, é o momento em que se começa a falar. Dois anos depois das primeiras manifestações, do primeiro acto de coragem de uns quantos. Mas o Partido Comunista não gostava de que se falasse do assunto. E dentro de casa, bem, ninguém gosta de falar de um genocídio, ainda mais de um que aconteceu quando a palavra ainda não existia, só foi consagrada pela ONU em 1948, antes os arménios tinham a sua “Grande Catástrofe”.

“Depois da morte de Estaline, começou-se a falar cada vez mais abertamente. Depois vieram as manifestações, todo o povo a exigir mais informações, que se falasse, que não esquecesse. Nos anos 60, surgiu aquele memorial e a partir daí nunca mais nos calámos.”

Não ajuda que a Turquia não reconheça o nome do crime. “Era o Império Otomano, agora é a República da Turquia. Mas o país nasceu destas cinzas, deste sangue de inocentes. E não foi dia 24 e não foi ano 1915, começou no fim do século XIX e durou até 1923”, diz Marina, lembrando que, “sem responsabilização, com impunidade, as tragédias continuarão a suceder-se”. E os arménios vão continuar “a contar mais um país a reconhecer o genocídio, ‘ai, agora foi a Áustria, a Bélgica, como se estivéssemos a mendigar, ‘olha, mais um disse que foi genocídio’”.

A Marina que se emociona é forte e às vezes deixa que a voz se lhe endureça. Como quando conta que, como os seus pais não gostavam de falar, nem os pais deles antes, também ela não gosta de falar com os filhos. “Conversamos, sempre, mas dói, não é um assunto fácil, querido.”

“Se eu estivesse na Arménia, seria diferente, mas não estou no meu país”, explica. “E eles estão um bocadinho noutro mundo, desligados e, mesmo o que sabem, não gostam de ouvir. E eu compreendo isso, os meus pais não gostavam de contar que tinham sido massacrados, que eram vítimas, quem é que gosta? Não, não, e ainda estamos à espera de ver o que [Barack] Obama vai dizer, o que o [o Presidente Turco, Recep Tayyip] Erdogan vai dizer.”
 
Atenas, Roma, Beirute
Não há perguntas fáceis mas há respostas directas e outras que obrigam a grandes e duras viagens. “De onde é, originalmente, a sua família?”, por exemplo. “Oh, essa pergunta. Essa é uma pergunta que nós fazemos sempre. De onde é que tu és? Porque um arménio não é de um sítio.”

No caso de Marina, uma grande parte da família é de Constantinopla, actual Istambul. “O pai do meu pai é da Cesária, ou seja, Cilícia.” Todos os avós de Marina “são sobreviventes do genocídio”. O pai da avó paterna “teve a lucidez de mandar os filhos embora para os salvar”. “A filha foi para Roma, estudar numa escola do Vaticano, o irmão parou em Paris, mas os dois perderam-se, nunca mais se reencontraram, apenas havia esta informação, de que o pai o tinha enviado para Paris, para estudar.”

A família sabe o seu nome, claro, tentou procurá-lo, “nunca se descobriu nada”. A avó tinha uns 12 anos, o irmão era mais velho, devia ter 15 ou 16”.

Esta avó, que Marina não teve a sorte de conhecer, morreu quando o pai ainda era muito novo, foi, ela própria, “muito nova, com as freiras numa missão a Atenas para ajudar os refugiados arménios e foi lá que conheceu o meu avô, o meu futuro avô, ali casaram e o meu pai, os três filhos do casal, nasceram ali”. Até que, em 1947, “houve um grande movimento mundial para que os arménios regressassem à Arménia e eles retornaram.”

Os pais da mãe de Marina, de Constantinopla, “também perderam a família quase toda, eles não se conheciam lá, eram muito novinhos, obviamente”. Calhou que ambos, através de “umas missões norte-americanas para salvar os meninos, tivessem ido parar a orfanatos diferentes, um para meninas, outro para meninos, pararam em Beirute, no Líbano, e cresceram nesses orfanatos”.

O resto é amor, daquele que tanto acontece em tempo de guerra como na paz. Os avós conheceram-se e casaram-se, ainda em Beirute. “Nasceram cinco filhos lá, a minha mãe era a mais nova. Depois, também no ano de 47, foram para a Arménia. A minha tia, a irmã da minha mãe, estudava na mesma turma do meu pai e assim o meu pai conhece a irmã mais nova, começa a namorar, a minha mãe com 19 anos, o meu pai com 25 anos, casam-se.”

Partituras e fome
Este pai que Marina dirá várias vezes que tinha “uma afinidade muito especial com a sua mãe”. Nessa altura, o pai de Marina “já tinha ido à tropa, já tinha uma vida difícil”. Esse pai que “falava, falava, mas eram traumas e traumas e traumas”.

Da sua mãe, o pai de Marina ouviu muito. “Como a minha avó tinha sido missionária na Grécia, viu imenso, famílias que ela não conhecia. Era já uma menina órfã, tinha perdido a sua família, mas foi confrontada com a tragédia do seu povo nos primeiros anos”. Essa mãe que o pai teve, era “uma senhora com uma educação fantástica, falava muitas línguas, escrevia poesia em francês e em italiano, sempre muito virada para as artes, de grande sensibilidade.”

Essa avó que Marina não chegou a conhecer mas que sabe ser a base “de tudo o que” o pai “era como pessoa, tudo, o amor pela leitura, pelos livros, não é só amor, era uma paixão.” Este pai, que perdeu a mãe pequeno e depois viu o pai ficar impedido de trabalhar por um acidente “e que, no meio de tanta fome que a família passava, ainda conseguia comprar livros”, enquanto sustentava a família, o pai e os dois irmãos. E “depois casa e já tinha a sua família e continuava a sustentar os irmãos, ainda muito novinhos”.

“Quer dizer, ter uma biblioteca em casa, passar isso tudo para os seus filhos. No meio de todas as dificuldades, comprava as partituras de música quando ainda nem sequer estudava música, imagina, comprava tudo o que era sinfonia e partituras orquestrais. Ele sabia que um dia tinha de estudar.”

Um requiem triunfal
Esse dia chegou, claro. Nascido em 1937, só em 1968 começou a estudar música e quatro anos depois foi admitido no Conservatório de Erevan. Depois vieram os prémios e as obras, todas sobre o genocídio. “Toda a obra do meu pai tem o tema omnipresente, mesmo que não esteja no título, a ideia musical está lá. Por exemplo, uma sonata que se chama Dedicatória a Komitas. Outra Requiem à Memória das Vítimas, outra que se chama Requiem Triunfal, um contraste imenso, requiem não é triunfal, mas ele queria dizer que o povo sobreviveu e se reergueu, era para morrer e não morreu, isto ocupava muito espaço no imaginário do meu pai. Estava lá sempre.”

“Komitas, para nós, é a imagem de um santo que salvou todo o nosso património e não só musical”, diz Marina. Komitas foi um dos 250 intelectuais arménios capturados no dia 24 de Abril de há 100 anos, os primeiros de muitos. Soghomon Soghomonian, conhecido como Komitas, padre, musicólogo, compositor, arranjista, cantor, maestro de coro, é considerado o fundador da escola de música arménia.

“Podia passar uma hora só a falar deste homem. Na altura do genocídio, ele foi um dos poucos do grupo inicial que voltaram, não foi assassinado nem exilado para o deserto”, diz Marina. “Komitas voltou mas já tinha visto tanto que ficou perturbado. E passou o resto da sua vida, do ano 1915 a 1935, em hospitais psiquiátricos de Paris, morreu lá. Esta pessoa, para nós, é um símbolo de tudo o que nos aconteceu.”

Um avô e uma culpa
Marina conheceu os pais da mãe, já era nascida quando eles morreram mas também os perdeu pequena. “O único avô que eu tive por mais tempo foi o pai do meu pai, morreu eu tinha 20 anos. Não me recordo de ele falar no genocídio, nós todos sabíamos mas não se falava, era assim um bocadinho tabu. Porque, quando falavam, mostravam fragilidade, começavam a chorar e não gostavam. Era estranho ver o avô chorar.”

Marina pensa que o que os avós e os pais fizeram é um pouco o que ela acabou por fazer com os seus próprios filhos. “Percebi que não era só ele que não queria falar, eles poupavam-nos para não nos traumatizarem e nós poupávamo-los porque sabíamos que eram sobreviventes e era uma grande dor voltar a falar no assunto”, explica.

Mas Marina carrega uma culpa. “Quando o meu avô já estava doente, eu estava sempre a tentar que ele falasse. Mas depois fiquei com culpa na minha consciência: por que é que eu não tinha obrigado o homem a falar antes? Tenho imensa pena e esse sentimento de culpa por não ter puxado mais por ele. Mas era nova e não tinha essa consciência que hoje em dia tenho, obviamente. É assim.”

Agora, em Portugal, Marina fala sempre que tem oportunidade, as pessoas não sabem, “não é culpa de ninguém” e ela sente que “tem obrigação de falar em português”. Como num debate recente, em que alguém dizia, “’ah, mas foram arquitectos arménios que construíram o museu na Turquia’, o museu das vítimas turcas de massacres arménios ou de massacres da altura da Primeira Guerra Mundial, os turcos construíram este museu precisamente em resposta ao nosso”. Mas enfim, arquitectos arménios.

E Marina a responder. “Olha, não me espanta nada, porque os arménios são assim, constroem, nunca destruíram nada, o nosso gene é construir, projectar, fazer concertos, livros, falar, é algo construtivo, nunca destrutivo.” Marina acredita que foi isso que lhes valeu. “O que nos salvou foi essa criatividade, olhamos sempre mais para a vida, não matamos, é uma honra, um orgulho. Ao longo de toda a nossa História, milhares e milhares de anos, pelo menos 4000, não tivemos guerras de ocupação, sempre tivemos guerras para defender as nossas terras.”

A última vez que Marina visitou Erevan foi há três anos. A irmã vai com mais frequência, tem um projecto já aprovado, uma fundação para preservar o legado do pai e do avô do marido, “uma personalidade muito reconhecida, com um imenso reportório de música arménia, folclore, que estudou, cantou, gravou, centenas de canções, escreveu muita coisa dedicada a esta herança musical da Arménia.”

Marina, o marido e os filhos irão no Verão. “Vamos fazer uma viagem de família, com o meu marido actual, que ainda não conhece. É uma viagem que nos entusiasma a todos, que queremos muito concretizar.”

Três relógios
Marina não estará por estes dias em Erevan – mesmo se nunca deixa completamente de estar, em casa, logo à entrada, há três relógios, um com a hora de Erevan, outro de Lisboa e outro do Huambo, de onde vem o marido –, mas acompanha atentamente o debate na Turquia, que este ano está mais presente do que nunca, com as declarações do Papa, o voto do Parlamento Europeu a pedir a Ancara o reconhecimento do genocídio, as condolências que os líderes turcos lá vão apresentando. Declarações que, para Marina, não passam de “mesquinhez”.

Há um lado de negação fácil de explicar. Se o genocídio é o que une e cimenta a identidade dos arménios, a Turquia ergueu-se sobre um mito fundador que o nacionalismo turco quer proteger. Tudo se passou antes da fundação da República, em 1923, e foram os “jovens turcos”, os autores do extermínio, que tentaram salvar o império e depois se fizeram cimento do novo Estado. “A sociedade não está pronta.”

Há outro lado, talvez ainda mais fácil de explicar. “A Turquia sabe que um dia vai ter de falar connosco, e sabe que isso vai trazer as inevitáveis compensações”, diz Marina. “Porque as terras eram arménias, as cidades eram arménias, os monumentos eram arménios e muitos estão num estado lamentável, não há investimento nenhum naquela zona, deixam tudo abandonado, talvez por saberem que, mais tarde ou mais cedo, isso vai acontecer.”

Crianças de agora
Vai demorar. Mesmo que aconteçam coisas impensáveis. “Há dias, passou na RTP 2 um documentário com vários turcos, incluindo o neto de um dos generais que planearam o genocídio, Cemal Pasha, e ele esteve em Erevan. Eu não sabia, fiquei chocadíssima, no bom sentido, mexeu muito comigo”, diz. Hasan Cemal publicou um livro, 1915: O Genocídio Arménio. “Ele escreveu este livro, em que chama os bois pelos nomes, neto de quem é, e diz, no filme: ‘Vou ser chamado traidor, mas não posso calar’. Estas pessoas é que nos dão a esperança.”

Esta sexta-feira, será exibido na RTP2 o filme “ARtMENIANS”, sobre a nação arménia. Marina já o viu, na Semana da Cultura Arménia organizada em Outubro na Gulbenkian.

“Aparece uma escola alemã, em Berlim, com alunos alemães, turcos, arménios. As crianças estão em harmonia, não há ‘tu és arménio, tu és turco’, brincam e estudam juntas”, descreve. “Mas quando surge este assunto entram em choque e é a incompreensão total. ‘Isso é mentira, os meus pais dizem que isso nunca aconteceu’. E os arménios: ‘Os meus pais dizem que não foi assim, nós sabemos outras coisas, na igreja arménia o padre disse isto’”.

E é também por isso que Marina não se espanta ao saber que há turcos que já consideram um grande progresso que 9% da população turca seja favorável ao reconhecimento do genocídio.

“Estamos a falar de crianças, agora, não são sobreviventes, não é segunda geração, é agora. Se os pais não sabem... Não faz parte da opção turca procurar a reconciliação, optam por se defender. Massacre é massacre, é a Primeira Guerra, aconteceu com todos, eles tiveram vítimas. Mas genocídio é outra coisa, implica um projecto de extermínio sistematizado e executado ao longo dos anos. Massacre é massacre, genocídio é genocídio.”

Por isso, por mais que doa – “e vai doer, vai doer sempre falar disto” –, Marina acredita que tem de falar. Em português.

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