Denúncias da Segurança Social e de pais levaram à detenção de directora
Menores terão dado o primeiro alerta partilhando informação sobre o sucedido. Psicóloga está indiciada por maus-tratos e abuso sexual, mas aguarda as investigações em liberdade suspensa de funções. Misericórdia, à qual pertence o lar, promete agir se crimes se confirmarem.
Aliás, as primeiras denúncias terão surgido há mais de cinco anos, apurou o PÚBLICO. Porém, estarão em causa alguns crimes continuados, uma vez que terão começado a registar-se há muito tempo de forma frequente naquela instituição. A detenção da directora técnica do lar foi feita no âmbito de um inquérito dirigido por uma equipa composta por elementos do Ministério Público de Reguengos de Monsaraz e do Departamento e Investigação e Acção Penal (DIAP) de Évora.
No âmbito do inquérito, as autoridades realizaram na terça-feira buscas nas instalações da Misericórdia e na habitação da responsável detida. O processo, que está em segredo de justiça, está a ser tratado com a máxima discrição e confidencialidade quer pelos investigadores quer pelas entidades locais e pelas instituições envolvidas na gestão do lar. Uma das explicações para tal relaciona-se com o facto de a arguida fazer parte de uma família influente no distrito de Évora. O sogro é proprietário de uma conhecida farmácia daquela cidade e o marido é dono de uma clínica de aparelhos usados para a audição.
No inquérito-crime estará também em causa um alegado desvio de dinheiro dos cofres daquela instituição e também nesse caso a suspeita cai sobre a directora. A responsável foi presente a primeiro interrogatório judicial e vai aguardar o desenrolar da investigação em liberdade, mas afastada do lar. O juiz de instrução decidiu aplicar as medidas de coacção de suspensão de funções e de proibição de contactos com os menores da instituição.
A Santa Casa da Misericórdia de Reguengos de Monsaraz, à qual pertence o lar desde 1980, admitiu esta terça-feira em comunicado que “a provarem-se os factos que deram azo a este processo” irá “agir em conformidade com as responsabilidades criminais ou outras que vierem a ser apuradas”. A Misericórdia sublinha também que “não deixará de lamentar e repudiar” os crimes.
No comunicado, a instituição salienta ainda que “tem como prioridade a salvaguarda dos direitos e interesses das crianças e jovens que acolhe e consequentemente tudo fará para os proteger” pedindo que “o respeito pela respectiva privacidade e bom nome”. No âmbito deste processo, a Misericórdia garante ter prestado e sublinha que continuará a prestar “toda a colaboração que vier a ser-lhe solicitada pelo Ministério Público”, desenvolvendo “todos os esforços conducentes ao apuramento dos factos e da descoberta da verdade”.
Entretanto, a instituição “irá proceder com a maior urgência, à nomeação interina de uma técnica para o cargo de directora técnica” do lar “cujo normal funcionamento está assegurado, com a colaboração do Centro Distrital da Segurança Social de Évora”. A instituição recusa depois prestar mais informações “estando o processo em segredo de justiça e pelo respeito que merecem as crianças e jovens acolhidos no lar”.
O lar acolhe crianças retiradas às famílias por se encontrarem em risco, sobretudo jovens com mais de 12 anos e grupos de irmãos. Desde 2013 que é uma das quatro instituições apoiadas pela Fundação Calouste de Gulbenkian, no âmbito de um programa cientificamente coordenado por Daniel Sampaio. Um dos objectivos deste programa é “potenciar a capacidade de respostas e a capacidade dos técnicos” dos lares e de crianças e jovens seleccionados”, explicou ao PÚBLICO o psiquiatra esta segunda-feira.
"O lar tem vagas para 40 jovens que sejam privados de meio familiar 'normal', devido a situações de perigo diversas e a carências socioeconómicas”, segundo se lê no site da instituição.
Maria João Leote de Carvalho, que integra a equipa de Daniel Sampaio, assegurou também que o Lar Nossa Senhora de Fátima se caracterizava por “uma grande abertura à comunidade”, como aliás comprovaram reportagens ali feitas pelo PÚBLICO, em Maio, e as jornadas anuais que o lar organiza com outros da região.
Dos 20 colaboradores do lar fazem parte uma equipa técnica com uma psicóloga, uma técnica de serviço social e duas educadoras sociais.