Missão Tritão não foi criada para salvar pessoas no mar
Patrulhar a fronteira marítima da União Europeia, e não salvar vidas, é o mandato da missão da agência Frontex no Mediterrâneo. Só a vontade dos líderes europeus pode alterar isso.
Após o choque do naufrágio de 366 pessoas que tentavam chegar a Lampedusa, em Outubro de 2013 a Itália criou a missão Mare Nostrum, militar e humanitária, que tinha por objectivo vigiar durante 24 horas o Mediterrâneo, em especial o estreito da Sicília, para salvar o maior número possível de vidas. A cargo da Marinha italiana, a missão mobilizava muitos meios navais e aéreos, que custavam nove milhões de euros mensais aos cofres de Roma, para vigiar as águas até junto das costas líbias.
Os meios envolvidos incluíam um veículo anfíbio com instalações médicas, uma a duas fragatas também com meios médicos e helicópteros, várias estações de radar, aviões e drones.
Mas o Governo italiano acabou por baixar os braços face à falta de solidariedade dos outros membros da União Europeia, assumindo que não podia continuar a gastar todo este dinheiro. De acordo com os acordos de Dublin II da UE, os países de entrada dos imigrantes têm de tratar dos pedidos de asilo e arcar com os custos de reenvio para casa daqueles cujos pedidos rejeita. A Comissão Europeia propôs a revisão deste sistema, mas foi rejeitada por 24 dos 28 países-membros – à excepção da Grécia, Itália, Chipre e Malta, nações mediterrânicas que sentem esta pressão migratória.
Apesar de ter permitido socorrer mais de 150 mil pessoas, e prender 351 traficantes de seres humanos, os custos elevados não permitiram manter a missão Mare Nostrum. O ponto final foi posto a 31 de Outubro de 2014, após um ano de funcionamento, em que 3300 imigrantes morreram no Mediterrâneo.
Foi substituída por uma outra missão, gerida pela Frontex, a Agência Europeia de Fronteiras, mas muito mais reduzida, com a esperança de que isso desincentivasse o fluxo migratório para a Europa, ao espalhar-se a notícia de que já não haveria tantos meios para salvar os imigrantes no Mediterrâneo. É que a Tritão, na qual Portugal participa, está restringida às águas territoriais europeias e o seu mandato é apenas patrulhar e não salvar vidas. Além disso, tem à sua disposição apenas dois aviões e um helicóptero, dois navios-patrulha para alto-mar e quatro para a zona costeira – tudo isto para gerir com 2,9 milhões de euros mensais, menos de um terço do que dispunha a Guarda Costeira italiana para gerir a Mare Nostrum.
Apesar de ter apenas como mandato patrulhar, se os navios e aviões da Tritão detectarem embarcações em dificuldade, estão obrigados pela lei do mar a prestar auxílio. Para reforçar esta missão, será necessário modificar o seu mandato – e aumentar o seu orçamento –, o que só poderá ser decidido pelos países-membros da UE.