Um código que dá substância à reforma

A "conferência procedimental" é uma grande mais-valia do Código do Procedimento Administrativo.

A forma muitas vezes desarticulada como funcionam os vários órgãos que fazem parte da máquina do Estado levou Portugal no passado recente a ser alvo de vários reparos por parte de organizações internacionais, nomeadamente aquelas que faziam parte da troika. No guião da reforma do Estado de Paulo Portas, no capítulo dedicado à Justiça, além do mapa judiciário ou da revisão dos estatutos das magistraturas, estava lá a reforma do Código do Procedimento Administrativo (CPA), que entra em vigor esta semana.

Este código, que não sofria alterações há quase um quarto de século, na prática regulamenta as relações da administração pública com os particulares, sejam eles cidadãos ou empresas. Tem um leque de abrangência que vai ao ponto de definir como é que um cidadão pode contestar uma decisão das Finanças, da Segurança Social ou de uma simples junta de freguesia. Como se pode ler na redacção do Decreto-Lei n.º 4/2015, o novo CPA também vem “robustecer os valores fundamentais que devem reger toda a actividade administrativa num Estado de direito democrático”. Um desses valores é o relativo à “protecção dos dados pessoais”, um tema que ganhou bastante actualidade perante as denúncias recentes feitas pela Comissão Nacional de Protecção sobre um sem- número de pessoas, fora e dentro da máquina fiscal, que têm acesso aos dados dos contribuintes.

O caminho percorrido por este novo código não é isento de críticas. Em termos de forma, quando passou pelo Parlamento, alguns deputados queixaram-se do facto de o diploma não ter sido discutido em sede de especialidade e outros sublinharam a ausência de um “código de ética” que acompanhasse o CPA. Em termos de substância há especialistas que alertam também para eventuais inconstitucionalidades, ao permitir, por exemplo, que a administração possa anular um acto administrativo previamente considerado válido, invocando uma interpretação diferente por parte do tribunal europeu.

Não obstante as críticas, o novo código é um passo importante rumo à desburocratização, procura aumentar a rapidez e a transparência dos procedimentos administrativos e ainda coloca uma grande tónica na chamada “administração electrónica”. E, espera-se, sem cair na tentação de transformar a máquina do Estado num enorme big brother de acesso desregulado por parte de qualquer funcionário ou empresa de consultoria.

Talvez a alteração mais relevante introduzida pelo CPA seja a chamada "conferência procedimental", que irá permitir que um grande projecto comercial ou industrial, ou simples bar na praia, não tenha de estar meses ou anos à espera de autorizações de um sem-número de organismos públicos. Decisões como os licenciamentos industriais passam a ser tomadas em “conferência” entre os vários organismos, o que irá poupar tempo e ser um factor adicional de atracção de investimento.

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