António Preto: "Oliveira atingirá a importância de um Fernando Pessoa"

Professor e ensaista acredita que, mais cedo ou mais tarde, a obra de Oliveira vai atingir a notoriedade da de Pessoa.

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Imagem de "Não, ou a Vã Glória de Mandar" DR
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Um livro-catálogo da exposição Manoel de Oliveira/José Régio – Releituras e Fantasmas, realizada em 2009 em Vila do Conde, entrevistas para a revista Cahiers du Cinéma, a última das quais saiu em Novembro, e textos no 3.º e último volume do catálogo relativo à exposição que a Fundação de Serralves dedicou ao centenário de Oliveira (2008-15) são alguns dos momentos da produção de António Preto. “O Manoel esteve em Serralves, em Fevereiro, na apresentação do catálogo; deve ter sido a última saída dele, e foi uma saída de trabalho, já que aproveitou a oportunidade para filmar”, recorda o ensaísta – e o PÚBLICO sabe que o projecto que Oliveira tinha ultimamente em mãos era mais um regresso ao passado, ao pequeno documentário Hulha Branca (1932), sobre a central hidro-eléctrica do Ermal instalada pelo seu pai no rio Ave, e que realizara logo a seguir à sua primeira-obra, Douro, Faina Fluvial.

António Preto doutorou-se em Estudos Cinematográficos na Universidade Paris-Diderot 7, em 2011. E definiu o cinema de Oliveira como objecto principal da sua investigação. “Foi quando estava a pensar fazer uma tese de doutoramento sobre a relação entre texto e imagem que decidi telefonar ao Manoel a dizer-lhe que ia trabalhar sobre a sua obra. Ele convidou-me logo para ir a sua casa”, diz o professor sobre esse contacto acontecido há pouco mais de uma década, e que resultou numa amizade duradoura. De tal modo que António Preto chegou a ser o nome falado para dirigir a Casa-Museu Manoel de Oliveira, quando Serralves anunciou que iria acolher o equipamento – um projecto ainda à espera de concretização.

“Foi uma relação que foi amadurecendo com o tempo, mas que passa por uma grande admiração pelo seu cinema”, acrescenta. Ainda sobre a comparação com o nome de Pessoa, António Preto estabelece um paralelismo criativo entre ambos. “Oliveira conseguiu, de uma forma mais dialógica, mais prolongada no tempo, mais participativa, mais política, abordar aquele que é talvez o objectivo máximo da Humanidade – a Liberdade”. E avança para novo paralelismo, desta vez entre a obra e a vida do realizador. Desde a sua “postura problematizadora, inventiva, contra-corrente e que nunca seguiu modas” no tempo do Estado Novo, até uma segunda fase, já após o 25 de Abril de 1974. “É uma obra profundamente actual, que mesmo quando está a filmar o passado” – e cita o caso de Non, ou a Vã Glória de Mandar (1990) – se interessa pelo agora, pelo presente e o futuro”. De resto, Preto acha que “o núcleo programático” deste filme em que o realizador encena e reflecte sobre a História de Portugal a partir das suas derrotas e batalhas perdidas é que “aquilo que fica para o mundo não é o que se conquista, mas o que se dá”.

O que é que irá ficar, em Portugal e no mundo, da obra de Manoel de Oliveira após o seu desaparecimento físico? “O gigantismo dele, até agora, foi partilhado entre a obra e a pessoa. O que hoje desaparece da nossa presença é apenas uma parte, mas fica a única coisa que pode ficar: a obra e o exemplo”. E sobre o facto reconhecido de a sua filmografia sempre ter sido primeiro reconhecida no estrangeiro e não no próprio país, António Preto admite quase como inevitável que isso continue a acontecer. “Nós, no nosso pequeno perímetro, iremos ser confrontados com as múltiplas visões que nos continuarão a ser oferecidas”. Mas isso não diminuirá a grandeza de “um autor que o foi no sentido próprio do termo, que sempre prescindiu da sua autoridade”, antes sempre se disponibilizou “para aprender até ao fim”.

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