Primeiro-ministro japonês exige libertação de jornalista refém do Estado Islâmico
Vídeo divulgado que dizia mostrar o corpo de Haruna Yukawa é, muito provavelmente, autêntico, dizem autoridades do Japão. Shinzo Abe condena fortemente o grupo terrorista.
Abe pediu a libertação imediata do outro refém japonês — o jornalista e correspondente de guerra Kenji Goto — e disse que salvar a sua vida é a primeira prioridade. Mas reiterou que o Japão não vai ceder ao terrorismo.
“Um tal acto de terrorismo é chocante e inadmissível e causa-me uma forte indignação, nada mais”, disse Shinzo Abe. “Repito, exijo que não se faça mal nenhum ao senhor Kenji Goto e que ele seja imediatamente libertado.”
A escalada da crise de reféns tornou-se num teste para o primeiro-ministro japonês, que tomou posse em 2012, prometendo que ia tornar mais forte o papel do país na promoção da segurança global. Na terça-feira, os militantes do Estado Islâmico divulgaram um vídeo que mostrava Goto e Yukawa de joelhos ao pé de um homem com uma máscara, que segurava uma faca, e exigia um resgate de 200 milhões de dólares (178 milhões de euros) pela libertação dos dois homens. O pagamento teria de ser feito num prazo de 72 horas.
No último vídeo, divulgado no sábado, Goto diz que Yukawa foi “abatido na terra do Califado Islâmico”. Mas o jornalista disse que o Governo japonês poderia salvá-lo trabalhando através da Jordânia, onde o primeiro-ministro abriu um gabinete para coordenar a resposta do Governo À situação dos reféns. Goto disse ainda que os militantes libertá-lo-iam em troca da libertação da iraquiana Sajida al-Rishawi, presa na Jordânia. A exigência do dinheiro foi, entretanto, posta de lado pelos militantes do Estado Islâmico, dizia ainda a gravação.
Orações e sofrimento
“Estou completamente desapontado pela situação ter evoluído assim”, disse Shoichi, o pai de Yukawa, à NHK. “Sinto-me mal por [Goto] ter arriscado a sua vida por preocupação [pelo meu filho] e tenha acabado capturado. Tenho esperança que ele possa ser libertado o mais rapidamente possível, e volte para o Japão para continuar o seu trabalho.”
A mãe de Kenji Goto, Junko Ishido, falou também com a NHK: “Antes de tudo, preferia que não fosse verdade, que fosse um engano. Sou mãe e isto é insuportável. Quero dizer ao Estado Islâmico que o ideal do Kenji era a paz mundial.” Mais tarde, a agência noticiosa japonesa Kyodo citou-a dizendo que ela tinha dúvidas de que o seu filho procurasse a troca de prisioneiros.
Mais de 100 pessoas reuniram-se na igreja evangélica protestante de Denenchofu, em Tóquio, onde Goto foi baptizado em 1997 e onde rezou alguns dias depois de Yukawa ter sido capturado, em Agosto. Três agentes da polícia estavam de guarda no exterior da igreja. “Por favor, mantenham Kenji Goto e Haruna Yukawa nos vossos pensamentos durante este dia de orações”, disse o pastor Shun Takatsu.
O primeiro-ministro Shinzo Abe disse à NHK que tinha falado com o Rei Abdullah da Jordânia sobre a situação, mas não fez qualquer comentário à suposta exigência do Estado Islâmico da libertação de Sajida al-Rishawi.
O Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, condenou o “assassínio brutal” de Yukawa num comunicado divulgado neste domingo pela Casa Branca. Depois, Obama telefonou ao primeiro-ministro japonês para lhe oferecer as suas condolências e agradecer pelo humanitarismo que o Japão tem protagonizado no Médio Oriente.
Num outro comunicado, o Presidente francês, François Hollande, condenou o sucedido dizendo que foi um “assassínio bárbaro”, enquanto o primeiro-ministro australiano, Tony Abbott, que tem vindo a estreitar as ligações de segurança com o Japão, classificou o acto como uma “atrocidade absoluta”. “É mais importante do que nunca fazer tudo o que for possível para desintegrar este culto da morte”, declarou, num comunicado a partir de Camberra.
Ajuda humanitária
Yukawa, de 42 anos, foi capturado por militantes do Estado Islâmico em Agosto depois de ir para a Síria para abrir uma empresa de segurança. Goto, de 47 anos, foi para a Síria no final de Outubro para assegurar a libertação de Yukawa, de acordo com os amigos. O novo vídeo, divulgado no YouTube no sábado e que foi de seguida apagado, mostrava uma imagem de Goto, emagrecido, numa t-shirt laranja. Num registo de som ouvia-se aquilo que parecia ser declarações do jornalista em inglês.
“Gostaria de salientar quão fácil é salvar a minha vida”, diz a gravação. “Tragam a irmã deles de volta do regime jordano e eu serei libertado imediatamente. Eu por ela.” A iraquiana Sajida al-Rishawi foi presa pouco depois de não ter conseguido feito explodir-se numa série de atentados mortais que aconteceram em três hotéis da capital da Jordânia em 2005.
Em 1977, o Japão pagou seis milhões de dólares (5,35 milhões de euros) a um grupo de sequestradores do Exército Vermelho Japonês que capturou um avião e exigia ainda a libertação de alguns militantes. No entanto, nos últimos anos o Governo japonês adoptou a estratégia do Governo norte-americano de não ceder ao pagamento de resgates. A Constituição pacifista do país impede que haja uma resposta militar.
Um documento preparado pelo gabinete do primeiro-ministro japonês, divulgado na sexta-feira, dizia que o Japão, mesmo que alterasse a Constituição para acabar com as restrições militares — uma proposta legislativa que o primeiro-ministro quer aprovar ainda este ano —, não tinha autoridade legal para atacar o Estado Islâmico. Shinzo Abe disse à NHK que o país não tinha intenções de se juntar às operações militares contra o Estado Islâmico que estão a ser lideradas pelos Estados Unidos, mas pretendia continuar as acções de ajuda humanitária.
Mas a decisão do governante de dar ajuda apenas aos países que estão a combater o Estado Islâmico gerou algumas críticas a nível interno. “Acho que é inevitável que [o Estado Islâmico] tenha interpretado esta medida como um apoio aos seus inimigos e tenha, por isso, olhado o Japão também como um inimigo”, disse à NHK Ichiro Ozawa, líder do Partido da Vida das Pessoas, um pequeno grupo da oposição, referindo ainda que o Governo parecia não saber como reagir à situação de reféns.
Nos últimos meses, o Estado Islâmico já matou cinco jornalistas e ajudantes humanitários ingleses e norte-americanos. A captura de Haruna Yukawa aconteceu nos arredores da cidade de Alepo, em Agosto, e foi a primeira vez que um cidadão japonês foi capturado por este grupo.