Lituânia fecha ciclo de adesão ao núcleo de países da zona euro
País do Báltico torna-se no 19.º membro do clube, mas não se sabe quando é que a moeda única terá novas adesões.
Esta pode parecer uma conjuntura estranha para uma nova adesão à moeda única, já que a zona euro está em risco de entrar em deflação e de voltar a sofrer uma recessão, ao mesmo tempo que as regras impõem controlos apertados ao nível da dívida pública (abaixo dos 60% do PIB) e do défice (tem de ser inferior a 3% do PIB). No entanto, para a Lituânia, que já tentara aderir ao euro em 2007, este parece ser o passo mais lógico, principalmente tendo um vizinho como a Rússia.
Em declarações ao PÚBLICO, Mauricas Zygimantas, economista-chefe do Nordea Bank da Lituânia e professor na Universidade de Gestão e Economia (ISM) de Vilnius, realça que a adesão ao euro reforça as ligações ao Ocidente e irá trazer benefícios económicos ao país. “O euro representa mais um passo na direcção” da Europa Ocidental, que, realça, é “próspera, democrática, tolerante e transparente”, e mais um passo para se distanciar do Leste europeu, “empobrecido, autocrático, intolerante e corrupto”.
Neste quadro, acrescenta, o euro “pode ser visto como a continuação de uma longa jornada de regresso ao encontro da civilização ocidental, que começou em 1990 após a Lituânia ter recuperado a independência face à União Soviética, e culminou em 2004 com a adesão à União Europeia e à NATO”. Para Mauricas Zygimantas, a crise económica e financeira que atravessa a Rússia torna este movimento ainda mais apelativo, ao mesmo tempo que o conflito militar na Ucrânia faz recordar a grande virtude da União Europeia: a paz. Isto numa altura em que a Lituânia está a reforçar as despesas para a área da defesa.
Depois, deixando de parte as comparações Este/Oeste, Mauricas Zygimantas destaca que a moeda única tem “vários benefícios para oferecer”, destacando quatro elementos-chave: facilita a livre movimentação de bens, serviços, pessoas e capital, potenciando os benefícios do mercado único; elimina riscos que ainda subsistiam de desvalorização da moeda (apesar da litas orbitar junto do euro desde 2002); permite influenciar as políticas do Banco Central Europeu; e vai facilitar o comércio, investimento e turismo entre os três países bálticos.
A Estónia e Letónia usam, respectivamente, a moeda única desde 2011 e 2014 (a Letónia foi o membro mais recente), e a entrada da Lituânia coloca o país em pé de igualdade com os dois vizinhos, além de representar o fim de um período em que cada um dos pequenos países do Báltico tinha a sua própria moeda.
Ao PÚBLICO, Algirdas Miskinis, responsável pelo departamento de política económica da Faculdade de Economia da Universidade de Vilnius, destaca ainda que a adesão ao euro representa “uma tentativa de um pequeno país se tornar mais visível na União Europeia e no resto do mundo”. Além disso, diz, “há fortes argumentos económicos” para entrar na moeda única, como o acesso a financiamento mais barato, facilidade de pagamentos, transacções mais baratas e mais investimento directo estrangeiro.
Desafios pela frente
Nem tudo, no entanto, são apenas vantagens, e a Lituânia terá vários desafios pela frente. Algirdas Miskinis destaca dois deles: o do crescimento económico, “que está a desacelerar devido ao embargo russo e ténue crescimento na União Europeia”, e o social, uma vez que “os salários são baixos e a desigualdade é bastante elevada”. Para já, estima-se que em 2015 os ordenados cresçam acima da inflação, fazendo aumentar os salários reais, o que faz alguns analistas lançar alertas sobre o risco de perda de competitividade do país.
De resto, Algirdas Miskinis considera que nem a dívida pública nem a inflação são problemas, e que o défice público está controlado, embora “graças aos baixos salários e pensões”. De acordo com dados de Dezembro do banco central da Lituânia, a procura interna e as exportações vão crescer menos do que o estimado inicialmente, principalmente devido ao embargo russo aos produtos alimentares, e que representam 38% das vendas de bens do país ao exterior.
Já Mauricas Zygimantas sublinha que o maior desafio do país será não cair no erro da “euforia pós-euro” e continuar a “controlar os níveis da dívida do sector privado e do sector público”. Para já, diz, os exemplos da Estónia e da Letónia são “muito encorajadores”, uma vez que os dois países têm dos défices públicos mais baixos da União Europeia. Para já, o Orçamento do Estado da Lituânia para o ano que vem, o primeiro da vida no euro, aponta para um défice público de 1,2% do PIB, com a economia a crescer 3,4%.
Com a adesão da Lituânia, a zona euro fecha um ciclo de crescimento, sem que haja mais nenhum país da UE na lista de espera. Em 2002, quando se deu o grande pontapé de saída, entraram 12 países de uma só vez, Portugal incluído. Depois disso, foi preciso esperar até 2007 para o clube da moeda única voltar a crescer, com a Eslovénia, e demorou nove anos a passar de 12 para 19 países, quando há 28 na União Europeia.
Não obstante haver a expectativa de que o euro se torne a moeda de todos os Estados-Membros, como passo inevitável, o Reino Unido é a prova de que dificilmente haverá uma só moeda para todos os países. Outros, como a Polónia, já ensaiaram várias aproximações, mas continuaram com a moeda local, e sem coletes de força no défice.
Silvia Merler, do think tank Bruegel, afirmou ao PÚBLICO que “ninguém poderá dizer neste momento qual será o próximo país a aderir” ao euro, nem quando. Esta investigadora refere, no entanto, que após a nomeação do antigo primeiro-ministro polaco, Donald Tusk, para presidente do Conselho Europeu, surgiram novas especulações sobre a entrada deste país no clube da moeda única. Mas, mesmo que isso aconteça, sublinha, “ainda vai demorar algum tempo”.