Pedido de Sócrates para ser ouvido só apareceu no processo após prisão preventiva
Advogado do ex-primeiro-ministro enviou email ao DCIAP sete horas antes de José Sócrates ser detido, mas o requerimento só chegou ao processo quatro dias depois.
O pedido foi enviado para o DCIAP pelo advogado de Sócrates, João Araújo, que o remeteu por via electrónica no dia 21 de Novembro, pelas 15h09. Para reforçar a disponibilidade do cliente, João Araújo enfatiza que falou com o director do DCIAP, Amadeu Guerra, dando-lhe conta daquela comunicação. Este, diz o advogado de defesa, ter-lhe-á garantido que iria passar a informação por SMS ao procurador titular do processo, Rosário Teixeira. “Não percebo o que o email andou a fazer perdido por lá [DCIAP], nos servidores, para só aparecer no dia 25 pelas 16h”, lamenta João Araújo.
Sócrates pretenderia com esta estratégia evitar a detenção, numa altura em que já saberia que três arguidos deste caso tinham sido detidos, nomeadamente o seu motorista João Perna e o amigo de infância Carlos Santos Silva. Contudo, nessa data já o juiz Carlos Alexandre mandara emitir o mandado de detenção de Sócrates, datado de 19 de Novembro.
A apresentação voluntária de Sócrates serviria também para afastar a alegação de um eventual perigo de fuga, retirando argumentos ao Ministério Público para pedir a sua prisão preventiva.
Essa acabou porém por ser a medida de coacção pedida pelo procurador que lidera a investigação, por considerar que havia de facto perigo de fuga e perigo de perturbação do inquérito. Os investigadores acreditam que o antigo governante, indiciado por corrupção, fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais, tencionaria destruir provas fulcrais quando regressou de Paris na noite de 21 de Novembro. A convicção foi alicerçada em indícios detectados durante as escutas a Sócrates, que saberia que estava a ser investigado e que podia vir a ser detido. Por essa razão foi interceptado pela polícia mal aterrou em Lisboa.
Recorde-se que na véspera da sua detenção, o ex-primeiro-ministro mandou retirar vários objectos electrónicos, incluindo um computador portátil, da sua casa, em Lisboa, na véspera da sua detenção, tendo sido apreendido dois dias mais tarde pelas autoridades, após informações prestadas pelo próprio ex-governante durante o interrogatório judicial.
O advogado de José Sócrates, João Araújo, já tinha insistido em declarações anteriores ao PÚBLICO que o seu cliente “veio para [Portugal] para ser preso”. Nunca comentou, contudo, o facto de o ex-primeiro-ministro ter adiado para 21 de Novembro, a viagem de regresso de avião de Paris marcada para a véspera.
Confrontada pelo PÚBLICO, a Procuradoria-Geral da República (PGR) recusou-se a confirmar a existência do pedido da defesa de Sócrates e a esclarecer a sua demora na chegada ao processo. “A matéria e os elementos constantes do processo que referem encontram-se em segredo de justiça”, responde apenas o gabinete de imprensa da PGR.
Perna volta a ser ouvido
João Perna, o motorista de José Sócrates que se encontra em prisão preventiva no âmbito da Operação Marquês, indiciado por branqueamento de capitais, fraude fiscal e posse ilegal de armas, irá ser novamente interrogado esta quinta-feira, pelo procurador Rosário Teixeira, no Departamento Central de Investigação e Acção Penal.
Da primeira vez que tinha sido interrogado, quando foi detido no mês passado, João Perna não esclareceu o juiz Carlos Alexandre sobre o seu alegado envolvimento no transporte de malas de dinheiro entre Lisboa e Paris. Mais tarde o motorista fez saber, através do seu advogado Ricardo Candeias, que se encontra disponível para colaborar com as autoridades.
“Está disposto a esclarecer tudo isto. Não tem nada de que se possa arrepender. Arrepender-se de quê?! De ter conduzido José Sócrates?”, interroga o seu representante legal, que solicitou esta terça-feira, num requerimento ao Tribunal Central de Instrução Criminal, a libertação imediata do motorista, alegando várias nulidades processuais. Neste mesmo requerimento pedia que o motorista voltasse a ser ouvido por Carlos Alexandre. “Mas o Ministério Público antecipou-se, convocando-o para um interrogatório complementar”, refere Ricardo Candeias, segundo o qual já depois da detenção do seu cliente surgiram factos “muito relevantes” para que a cadeia possa vir a ser substituída por prisão domiciliária. com Ana Henriques