“Ano devastador” para os 15 milhões de crianças afectadas por conflitos
UNICEF calcula que existam 230 milhões de crianças a viver em países em guerra. “Nunca, no passado recente, tantas crianças estiveram sujeitas a tamanhas brutalidades”.
Nas regiões mais sensíveis, as crianças são raptadas a caminho da escola, recrutadas e obrigadas a lutar por grupos armados, expostas a condições de saúde precárias, violentadas ou simplesmente mortas. “Nunca, no passado recente, tantas crianças estiveram sujeitas a tamanhas brutalidades”, afirmou o director-executivo da UNICEF, Anthony Lake.
A agência da ONU para o apoio às crianças destaca os conflitos em locais como a República Centro-Africana, a Faixa de Gaza, a Síria e o Sudão do Sul, como os responsáveis pela morte de mais de mil jovens ao longo de todo o ano e que afectam 15 milhões de crianças. “Crianças têm sido assassinadas enquanto estudavam em salas de aula e enquanto dormiam nas suas camas; foram tornadas órfãs, sequestradas, torturadas, recrutadas, violadas e até vendidas como escravas", descreve Lake.
Na República Centro-Africana, país dominado há quase dois anos por um conflito sectário que desalojou um quinto da população, estima-se que 10 mil crianças tenham sido recrutadas pelas milícias cristãs e muçulmanas que se combatem. Este ano, os confrontos mataram e mutilaram 430 crianças, o triplo do registado em 2013.
A intervenção militar israelita na Faixa de Gaza durante o Verão desalojou 54 mil crianças, matou 538 e mais de 3370 ficaram feridas.
Na guerra civil síria – que já entrou no seu terceiro ano – foram reportados 35 ataques a escolas até Setembro, durante os quais morreram 105 crianças e cerca de 300 ficaram feridas. No vizinho Iraque, a braços com a ameaça do Estado Islâmico que ocupa uma grande fatia do território, calcula-se que tenham sido mutiladas ou mortas cerca de 700 crianças este ano.
No Sudão do Sul estalou há cerca de um ano um confronto entre milícias rebeldes e as forças governamentais, numa luta pelo poder que obrigou à deslocação de 750 mil crianças e tirou a vida a mais de 600. Nas fileiras dos grupos armados estão 12 mil crianças, diz ainda a UNICEF.
Para além dos conflitos destacados, a UNICEF nota que “o próprio número de crises em 2014 significou que muitas foram rapidamente esquecidas ou receberam pouca atenção”. Entre elas estão os conflitos em países como o Afeganistão, a República Democrática do Congo, a Nigéria, o Paquistão, a Somália, o Sudão e o Iémen. Ao todo, são 230 milhões de crianças que vivem em países ou regiões afectadas por crises humanitárias.
“É tristemente irónico que, no ano em que celebramos o 25º aniversário da Convenção sobre os Direitos da Criança e pudemos também celebrar tantos progressos para as crianças no mundo, os direitos de tantos milhões de outras crianças tenham sido violados de um modo tão brutal,” sublinhou Anthony Lake.
Apesar do alarme, a UNICEF diz que “houve esperança para milhões de crianças afectadas por conflitos e crises”, nomeadamente através do trabalho realizado por várias organizações humanitárias. A agência destaca a campanha que pretende garantir o regresso de 662 mil crianças à escola na República Centro-Africana e a entrega de 68 milhões de doses de vacinas contra a poliomielite para travar o surto da doença no Iraque e na Síria, onde quase 40 crianças foram infectadas no último ano.
O responsável da UNICEF alerta para o efeito que a violência e o trauma podem ter sobre as crianças e cujas repercussões “comprometem a força das sociedades”. “O mundo pode e deve fazer mais para que 2015 seja um ano muito melhor para todas as crianças”, diz Lake.