Para uma vida boa
Tudo parece estar fora da sua condição de ser parte de um colectivo solidário: os mercados, a troika, a Europa, a Legionella, o banco bom e o banco mau, a Telecom, a retórica política e os seus papagaios, o Citius, a Merkel e tudo e tudo. Para cada novo problema de que se fale, logo vem um dispositivo de produção de discurso que tudo dissipa em pseudo-soluções e explicações misturadas com nuvens de palavras cegas: milhões de coisas sustentáveis e amigas do ambiente, eficiência, cheque-bebé, crise do interior, despesa, receita, resiliência, agricultura, criatividade e património, por exemplo. A geografia destas coisas também não é muito certa; ou é a média do país-arquipélago fracturado em disparidades colossais, ou é Lisboa, centro do reino e do império desde os Afonsos e Sanchos.
Já não se pode. Ir a Lousada é apanhar ar fresco e derreter lugares comuns e, neste caso, perceber de que se fala quando se fala de juventude. Faça-se uma manhã de netnografia (etnografia na Internet) sobre as coisas que aqui há e o motor de busca – o Google que é melhor que Deus porque responde sempre, como se diz – nos inundará de prodígios e coisas de todos os dias.
Como a juventude é uma categoria estatística que tanto serve para falar de concertos rock como da política do Ministério da Educação, dos graffiti e dos cremes para a pele, é melhor não isolar a juventude num discurso técnico-delirante de senso comum.
Entre outras coisas, do que se fala em Lousada das coisa públicas, da res publica, é da importância da política municipal feita sem excesso de decibéis, sem somatórios de gestos erráticos, com estratégias de longo prazo, com maior atenção ao que se passa no concelho do que ao discurso genérico e aos assuntos que povoam o discurso politicamente correcto e as suas temáticas ecoadas sabe-se lá a partir de onde.
Para uma vida boa, como diz o presidente Pedro Machado.
Álvaro Domingues
Geógrafo e professor na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto