Taxas turísticas ameaçam "galinha dos ovos de ouro" do crescimento, diz Portas
Vice-presidente da Câmara de Lisboa responde que a alternativa é cobrar mais impostos e lembra que a solução final ainda não está fechada.
"Tenho ouvido por aí um debate sobre taxas turísticas em Portugal", afirmou Paulo Portas, referindo-se ao anúncio feito nesta segunda-feira pelo presidente da Câmara de Lisboa, sobre a criação da Taxa Municipal Turística. "Eu respeito a autonomia do poder local, mas, como tenho responsabilidades na área da coordenação das políticas económicas, acho que devo deixar um alerta: não matem a galinha dos ovos de ouro fazendo, ao mesmo tempo, taxas para dormir, taxas para aterrar e taxas para desembarcar", afirmou o governante na intervenção de encerramento da conferência "Empresas na Caixa", promovida no Porto pela Caixa Geral de Depósitos (CGD).
"O turismo é o sector com melhor comportamento na economia portuguesa neste momento" e "as empresas turísticas estão, finalmente, a levantar a cabeça e a ajudar no emprego", sublinhou Portas, recordando que o turismo tem 40% de dormidas de nacionais e "não é apenas para os estrangeiros". O sector "hoje tem conceitos - como o low cost e os hostels - onde o preço é muito relevante", acrescentou.
Em causa está o anúncio, na segunda-feira, do presidente da Câmara Municipal de Lisboa, António Costa, que será cobrada uma taxa de um euro pela chegada de turistas ao aeroporto e ao porto em 2015 e, a partir de 2016, uma taxa do mesmo valor por dormida.
Em resposta às declarações de Paulo Portas, o vice-presidente da autarquia lisboeta apressou-se a explicar que só havia duas alternativas à criação da Taxa Municipal Turística: “parar e dizer simplesmente não investimos mais no turismo” ou “aumentar o IMI e o IRS”.
“A decisão da câmara de avançar é precisamente para apoiar o desenvolvimento do sector do turismo, que é uma actividade económica da maior importância”, afirmou Fernando Medina aos jornalistas, antes de entrar para a reunião da Assembleia Municipal de Lisboa que se realiza esta terça-feira à tarde. A criação de um novo centro de congressos e a continuação dos trabalhos de requalificação da frente ribeirinha foram alguns dos investimentos que o autarca considerou serem “muito importantes para a cidade progredir” e conquistar turistas.
O vice-presidente da câmara, que tem defendido que Lisboa deve ter uma participação nas receitas do IVA, lembrou ainda que actualmente a cidade “não tem uma única receita indexada à actividade económica”. E que os turistas, ao contrário dos munícipes de Lisboa, não contribuem para serviços de que todos usufruem, nomeadamente ao nível do espaço público e dos espaços verdes.
Questionado sobre se consegue garantir que não haverá portugueses afectados pela nova taxa, o autarca defendeu que tal não é possível. “É algo que nunca poderei garantir, porque não podemos simplesmente fazer um inquérito a cada português e indagar os motivos por que estão cá”, justificou, acrescentando que a autarquia ainda não tem “uma solução final fechada” relativamente à forma como será aplicada a taxa. O regulamento entrará em consulta pública na próxima semana, adiantou.
Medina reforçou ainda que "a taxa tem como objectivo o contributo de turistas, nas chegadas por via aérea será limitada aos voos internacionais".
Nas respostas a perguntas dos jornalistas, Fernando Medina destacou várias vezes que aquilo que está em causa é o pagamento de um euro. “É pouco mais do que um café diário”, frisou, acrescentando que a Taxa Municipal Turística será concretizada “com prudência e gradualismo”, uma vez que em 2015 incidirá exclusivamente sobre as entradas na cidade por via marítima ou aérea, só sendo alargada às dormidas no ano seguinte.
O vice-presidente da autarquia lembrou ainda que “as mais bem sucedidas” cidades europeias em termos turísticos, como Paris, Roma e Barcelona, têm taxas semelhantes àquelas que Lisboa quer criar.
A galinha ainda não pôs o ovo
Desde o anúncio de António Costa, foram várias as reações negativas, em particular de entidades do sector como a Confederação do Turismo Português (CTP) e a Associação da Hotelaria, Restaurantes e Similares de Portugal (AHRESP). Também as associações de Dinamização da Baixa Pombalina e de Valorização do Chiado consideram que a taxa vai retirar competitividade e penalizar a cidade.
No caso da CTP, esta considera que "se mantêm válidos os argumentos já anteriormente invocados por si e pelos agentes privados do sector do turismo, quando outros municípios ainda que, com outra fundamentação, pretenderam igualmente criar uma taxa municipal sobre o alojamento turístico".
Por seu turno, a AHRESP também apelou ao presidente da câmara para que não mate "a galinha dos ovos de ouro" que "ainda não pôs o ovo". "O turismo esteve na moda este ano, é a vedeta e é o líder das exportações. Mas o que é o turismo? São as dormidas e as chegadas aos aeroportos? Não é verdade. A receita do alojamento é só 21% do total das receitas turísticas. A galinha dos ovos de ouro está agora a fazer 'cocorocó' e ainda não pôs o ovo, não vamos matá-la antes de ele sair", afirmou o secretário-geral AHRESP, José Manuel Esteves.
Falando à margem de um almoço-debate organizado pelo American Club, em Lisboa, José Manuel Esteves disse que não está surpreendido com a medida porque "há quatro anos" a autarquia já tinha tentado introduzir uma taxa semelhante, mas a AHRESP conseguiu "convencer o bom senso da câmara". Questionado sobre se a associação vai entregar uma providência cautelar, o secretário-geral disse que não e que está "a negociar" tanto com o presidente da Câmara de Lisboa como com o Governo, mostrando-se optimista.
Para José Manuel Esteves, "Lisboa não tem condições não só legais mas na sua oferta de estar a aplicar estas taxas que, além de inexequíveis, têm legalidade muito duvidosa".
O presidente da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP), Luís Veiga, não está só contra a taxa, mas também contra o destino que será dado à verba arrecadada pela câmara. "Não à taxa e não à construção de um centro de congressos. Nesta altura, é inoportuno avançar com um centro de congressos que vai custar 57 milhões de euros. Os hoteleiros não estão interessados, nem Lisboa está interessada neste investimento", sublinhou Luís Veiga, durante uma conferência de imprensa, em Lisboa.
Citado pela Lusa, Luís Veiga defende que há espaços na capital que, depois de recuperados e requalificados, podem receber congressos, até porque, disse, apenas um terço se realiza em centros de congressos idênticos àquele projectado para Lisboa. O presidente da AHP disse ainda haver outras prioridades na cidade, como "tapar buracos, arranjar os passeios ou tratar do lixo", antes de se avançar com "mega-empreendimentos".