Especialistas preocupados com mortalidade associada às infecções hospitalares
Apesar de parecer relevante a mortalidade associada a infecções hospitalares, em Portugal não é possível determinar quantas pessoas morreram por causa deste problema
“Embora seja impossível separar os óbitos em que a infecção é um acontecimento concomitante ou associado daqueles em que é a causa da morte, parece relevante a mortalidade associada às infecções hospitalares, com base nos dados da mortalidade hospitalar obtidos através dos Grupos de Diagnóstico Homogéneos (GDH)”, lê-se no relatório que já tinha sido antecipado pelo PÚBLICO na segunda-feira.
Sublinhando que é necessário interpretar estes dados com "muita cautela", porque não é possível definir em que medida a infecção poderá ter contribuído para a morte, os autores do documento adiantam mesmo assim alguns números. Revelam, por exemplo, que nos doentes a quem foi necessário colocar um cateter venoso central a percentagem de óbitos associada a infecções foi de 37,9%, em 2013, num total de 4310 pessoas.
Nas infecções pelos microorganismos que mais preocupam os especialistas, a percentagem de mortes em que os doentes tinham infecções também é elevada. Nos pacientes com infecções por estafiloco áureo, uma das bactérias que com maior frequência causam infecções hospitalares, foi de 19% em 2013 (um total de 663 óbitos), enquanto no caso da clostridium difficile foi de 25,5% (251 mortes).
“Os doentes com cateter venoso central têm habitualmente doenças muito graves. Há uma série de doenças que nos fragilizam de tal maneira que debilitam o sistema imunitário, aumentando a probabilidade de adquirir infecções”, explica o coordenador do Programa de Prevenção e Controlo de Infecções e de Resistência aos Antimicrobianos, José Artur Paiva, que faz questão sublinhar também que o que aqui está em causa são pessoas que morreram e que tinham uma infecção hospitalar, e que os óbitos não podem ser atribuídos directamente a este problema. Como se explica, então, que haja países que conseguem determinar estes números? “São países que avançam com dados baseados em indicadores, e que põem comissões independentes a analisar os registos médicos. Em Portugal, para além de alguns estudos muito específicos, não existe este tipo de informação”, diz.
Seja como for, “a maior parte das infecções não é fatal”, garante o médico, que destaca os dados positivos apresentados neste relatório. A taxa de resistência do estaficoloco áureo ao antibiótico meticilina diminuiu 15% nos últimos dois anos e há uma tendência ligeiramente decrescente do consumo de antibióticos desde 2005. A má notícia é que Portugal continua, mesmo assim, no 9º lugar na tabela de 30 países europeus com maior consumo deste tipo de medicamentos.
Também o rácio entre o consumo de antibióticos de largo espectro sobre antibióticos de espectro estreito, que aumentou entre 2003 e 2012, diminuiu pela primeira vez no ano passado, ao mesmo tempo que se verificou uma diminuição das infecções associadas às cirurgias das ancas e joelho. O reverso da medalha foi que as infecções aumentaram nas cesarianas e nas operações à vesícula biliar.
São sinais de que este programa com um ano e meio de existência estará já a dar resultados? Os autores do relatório lembram que há um ano foi determinada a concretização, em todas as unidades de saúde, de programas de apoio à prescrição antibiótica, com o objectivo de reduzir ao necessário o recurso a estes medicamentos, sobretudo os antibióticos de mais largo espectro.
Mas ainda há um caminho a percorrer. Como objectivos principais para 2015, está prevista a redução da duração média da terapêutica antibiótica, a diminuição, até à anulação, da percentagem de doentes a quem são receitados antibióticos 24 horas antes das cirurgias, além da redução da percentagem de doentes internados que adquirem infecções, que em Portugal continua a ser mais elevada do que a média da União Europeia (10,6% contra 6,1%, em 2012).