Ex-director da rede informática da Justiça suspeito de sabotagem ao Citius
Dois visados pela auditoria às falhas no Citius trabalhavam no próprio instituto do Ministério da Justiça. São funcionários da PJ, mas estão fora da polícia em comissão de serviço há mais de seis anos.
Além desse responsável serão ainda imputadas responsabilidades a outro técnico de informática. Ambos integravam a estrutura de chefia intermédia do IGFEJ e são originalmente funcionários da carreira de apoio na Polícia Judiciária, mas nunca estiveram ligados à área da investigação. Não são por isso inspectores e há mais de seis anos, garantiu fonte da PJ, que estão na prática sem exercer funções na polícia. Trabalhavam em regime de comissão de serviço no IGFEJ.
O relatório conterá indícios de que chefias intermédias terão omitido informações importantes na preparação do sistema para a reforma judiciária. De acordo com fonte da PJ, terá existido incompetência na liderança da rede informática e dos problemas que foram registados, mas não terão sido completamente reportados à presidência do IGFEJ e do Ministério da Justiça. A mesma fonte policial garantiu que os problemas na rede do Citius e do IGFEJ já estavam há muito assinalados.
A situação está, porém, a gerar polémica no seio da tutela da Justiça, do Ministério Público e até da PJ com responsáveis divididos quanto ao assunto. Se há quem ache que as suspeitas são legítimas e os visados devem ser investigados, algumas fontes nessas instituições deram conta ao PÚBLICO de alguma indignação por considerarem não existir qualquer indício pelo qual se possam apontar responsabilidades aos dois funcionários. Pelo contrário, são descritos como profissionalmente capazes e responsáveis.
O PÚBLICO tentou, sem sucesso até ao momento, contactar o antigo director em causa através do próprio IGFEJ. O presidente do instituto, Rui Pereira, recusou prestar esclarecimentos sobre este assunto. O PÚBLICO questionou ainda o Ministério da Justiça que recusou comentar este assunto.
A tutela confirmou apenas mais tarde que o instituto já afastou os dois funcionários dos seus cargos tendo terminado inclusive as comissões de serviço através das quais desempenhavam funções naquele instituto. "Cessaram funções por deliberação do Conselho Directivo do IGFEJ", explicou o Ministério da Justiça.
A cessação de funções terá ocorrido esta quarta-feira, pelo que os funcionários terão de se apresentar na Judiciária de imediato. Nenhum deles alguma vez assumiu funções na área de informática naquela polícia. Fonte da PJ adiantou que o ex-director no IGFEJ era especialista superior na polícia no sector dos recursos humanos. Terá, contudo, começado a carreira como segurança na PJ. O outro funcionário é formado em Marketing. De regresso à PJ, não deverão ter qualquer processo disciplinar naquela instituição, uma vez que os factos pelos quais estarão a ser investigados ocorreram no IGFEJ.
O responsável que desempenhava funções de director no IGFEJ passou também anteriormente pelo Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa onde esteve ligado à área da informática. As suas funções, porém, não tinham naquele departamento qualquer ligação ao Citius. O DIAP de Lisboa não usa aquele sistema informático. Ali, o actual director no IGFEJ esteve envolvido no apoio ao desenvolvimento de uma aplicação informática de gestão de inquéritos. Trata-se da Aplicação para a Gestão de Inquéritos-Crime (AGIC).
O documento foi enviado pelo Ministério da Justiça para a Procuradoria-Geral da República (PGR) que decidiu entretanto abrir um inquérito ao caso. A direcção do inquérito não foi, contudo, atribuída ao DIAP de Lisboa nem ao Departamento Central de Investigação e Acção Penal de Lisboa (que investiga casos mais complexos), como é habitual noutros casos. Será a própria PGR a investigar o caso. A investigação foi encaminhada para o procurador Pedro Verdelho, coordenador do Gabinete do Cibercrime que funciona na própria Procuradoria.
A procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, sustentou essa decisão com a “complexidade processual e à repercussão social da matéria em investigação”, como previsto no Estatuto do Ministério Público. Ao PÚBLICO, a PGR salientou ainda “os especiais conhecimentos técnicos deste magistrado”, importantes na natureza da do que está em causa neste inquérito.
No despacho enviado sexta-feira à PGR, a ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, considera poder estar em causa um crime de sabotagem informática previsto na Lei do Cibercrime. Sugere nesse âmbito à procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, a instauração de um inquérito-crime. A lei prevê uma pena até 10 anos de prisão para quem “perturbar gravemente o funcionamento de um sistema informático”.