Dois "lobos solitários" que seguiram manual de instruções jihadista
Tanto Michael Zehaf-Bibeau como Martin Couture-Rouleau usaram os meios que tinham à disposição para atingir símbolos do poder no Canadá.
Há ainda muitas lacunas por preencher na biografia de Michael Zehaf-Bibeau, o canadiano de 32 anos que na quarta-feira entrou no Parlamento de Otava depois de ter matado um militar que guardava o Túmulo do Soldado Desconhecido. Foi morto numa troca de tiros com os seguranças, mas pouco depois uma suposta fotografia sua, com metade do rosto tapado por um lenço e de arma na mão, foi posta a circular em sites islamistas.
O jornal Globe and Mail escreveu que Bibeau é filho de um empresário líbio e de uma dirigente dos serviços de imigração canadianos, que cresceu num subúrbio de Montreal, no Quebeque. Os pais divorciaram-se em 1999 e, segundo o jornal, terá vivido algum tempo na Líbia, antes de regressar ao país. Os problemas com as autoridades começaram cedo na juventude, segundo o cadastro a que estação CBC teve tido acesso e que revela que, em 2004, foi condenado a dois meses de prisão por posse de droga. Em 2011 voltaria a ser preso, já em Vancouver, onde então vivia, desta vez acusado de roubo, mas acabou condenado por coacção.
Não é claro quando se terá radicalizado. Um amigo que há três anos se cruzava com Bibeau numa mesquita de Vancouver disse ao Globe que ele nunca manifestou ideias extremistas, mas tinha por vezes um comportamento “errático” e falava frequentemente em demónios. Conta, no entanto, que ele o informou que pretendia regressar à Líbia – não há certeza se tentou sair do país, mas uma fonte próxima da investigação diz que Bibeau estava a ser seguido pelas secretas, que o tinham classificado como “viajante de alto risco”.
Foi também isso que aconteceu a Martin Couture-Rouleau, o canadiano de 25 anos que segunda-feira atropelou dois soldados numa cidade do Quebeque, matando um deles, antes de ser morto a tiro pela polícia após uma perseguição automóvel. A polícia confirmou que integrava uma lista de 90 extremistas que estavam a ser monitorizados e que chegou a ser detido em Julho quando tentava viajar para a Turquia, ponto de entrada na Síria, tendo-lhe sido retirado o passaporte.
O alerta foi dado pela própria família depois de o jovem, que se converteu ao islamismo na Primavera de 2013, ter começado a vestir-se de forma diferente, a passar horas em sites jihadistas e a defender as ideias radicais. No Facebook, onde se identificava como “Ahmad o Convertido”, publicou mensagens de ódio ao Ocidente e um amigo contou que sonhava morrer em combate – uma vontade que acabou por concretizar, não no estrangeiro, mas no seu país natal.
Há anos que grupos jihadistas exortam os seus seguidores a atacar nos seus países de origem, usando métodos que não exigem grandes meios ou treino. A ameaça gerada por estes “lobos solitários" cresceu com a entrada em cena do Estado Islâmico, que em Junho declarou um califado entre a Síria e o Iraque, e recrutou milhares de jihadistas no ocidente. A preocupação das autoridades tem sido estancar este fluxo, mas ao impedir os simpatizantes do grupo de viajar para o Médio Oriente o Ocidente podem estar a dar trunfos aos radicais. “Eles estão a apelar aos muçulmanos para defenderem o Estado Islâmico, mas se não puderem viajar então devem apoiar o califado atacando os seus países”, disse ao jornal Toronto Star Amarnath Amarasingan, investigador do movimento jihadista no Canadá, recordando o apelo lançado pelos jihadistas em Setembro, no qual desafiavam os seus apoiantes a fazer uso de qualquer método para matar os cidadãos de países que aderiram à coligação internacional.