Belém e as eleições
Apesar de haver uma maioria de Governo, é cada vez mais clara a existência de um bloqueio político que torna totalmente impossível qualquer entendimento alargado sobre matérias e reformas imprescindíveis para o avanço do país. Se dúvidas houvesse, foi evidente, hoje, durante o debate quinzenal na Assembleia da República, quando o primeiro-ministro deitou por terra o repto que lhe foi endereçado pelo líder parlamentar socialista para a realização de eleições antecipadas. Refugiando-se em formalismos constitucionais, ridículos quando a antecipação dos prazos eleitorais nunca iria além de meia dúzia de meses, Passos Coelho respondeu com um rotundo não à proposta do PS. É verdade que os socialistas fizeram o mesmo quando eram Governo e foi igualmente um erro que o país pagou caro, mas, como qualquer pessoa de bom senso faz, os erros emendam-se.
Deixar para Outubro as legislativas do próximo ano pode significar várias coisas. Desde logo ter um orçamento feito em clima eleitoral com todos os vícios daí decorrentes e que também é manifestamente uma vantagem de quem está face aos partidos concorrentes. Por outro lado, se a coligação perder as eleições, haverá o efeito perverso de o partido vencedor vir a ter que governar de acordo com orientações, objectivos e estratégias que não são as suas. Mais, não são as suas nem serão as dos portugueses, caso decidam derrotar PSD e CDS. Um cenário destes coloca desde logo um problema de legitimidade a um Orçamento aprovado nestas circunstâncias. Finalmente, tal orçamento será discutido e votado numa altura em que também já se encontra no terreno a pré-campanha eleitoral para as presidenciais, cuja primeira volta ocorrerá em Janeiro de 2016. Ou seja, será a um Presidente que está de saída e também diminuído dos seus poderes, que a maioria governativa imporá o documento mais importante do ano político.
É por tudo isto que é extremamente grave a resposta cega de Passos Coelho ao repto do PS. O que está em causa já não é o mero jogo político, mas sim interesses que devem estar acima da trica ou da mera ambição partidária. Trata-se de Portugal e do destino dos portugueses. Sabe-se que o Presidente da República é um institucionalista, que gosta de cumprir prazos e formalidades, mas o que está em causa vai muito para além de tudo isso. Esta sua decisão marcará, definitivamente, a forma como vai sair de Belém.