Guantánamo: o sírio Dhiab já só pede para o alimentarem à força com mais humanidade

A prisão que Obama mandou fechar quando chegou à Casa Branca permanece aberta. Há lá um homem que é retirado de uma cadeira de rodas para ser alimentado por métodos que põem em risco a sua saúde.

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Guantánamo começou a receber suspeitos da “guerra ao terrorismo” em Janeiro de 2002. A maioria dos que lá permanece nunca foi acusada Michelle Shephard/Reuters

É a primeira vez que a alimentação forçada é questionada na justiça federal norte-americana, mas a prática é bem conhecida e usada com frequência na prisão da ilha de Cuba, ainda que a Associação de Médicos dos Estados Unidos considere que alimentar de forma forçada adultos no uso das suas competências viola o código de ética. Não se sabe quantos dos 149 homens que permanecem em Guantánamo são sujeitos a este método – no início de Maio do ano passado, chegaram a ser 133 os detidos em greve de fome, com dezenas a serem alimentados à força.

Dhiab, de 43 anos, não se opõe a ser alimentado se a sua saúde o exigir e não quer morrer. Recorreu a esta forma de protesto “por ser o único meio de se manifestar pacificamente contra a sua detenção”, afirmou no tribunal de Washington o advogado Eric Lewis. “Os meses e os anos passaram e ele continua ali. A sua greve de fome é um grito humanitário, ele não tem escolha.”<_o3a_p>

O que pede então Dhiab? “Tudo o que ele quer é ser tratado humanamente”, disse Lewis, recordando que a própria juíza que enfrentou a Administração de Barack Obama e aceitou julgar este caso, Gladys Kessler, descreveu o procedimento a que Dhiab é sujeito como “doloroso e humilhante”. <_o3a_p>

Contra a vontade do Departamento da Justiça, Kessler ordenou à Administração que prepare uma versão desclassificada de 28 vídeos que mostram Dhiab a ser removido à força da sua cela e alimentado através de um tubo que lhe é inserido pelo nariz até chegar ao estômago (os vídeos estão por divulgar).<_o3a_p>

O que acontece é que ele não só é arrancado da cadeira de rodas “que usa há anos por causa das dores incapacitantes que tem nas costas, rins e pernas” (escreve a advogada Alka Prahdan no site da Al-Jazira América) e retirado da cela por cinco membros das Extreme Reaction Force, as unidades de controlo de motins da prisão, como é sentado numa cadeira onde há cinco pontos para prender o corpo (os reclusos chamam-lhe “cadeira da tortura”) – cabeça e membros. <_o3a_p>

Depois, vem a inserção do tubo, que é posto e retirado várias vezes por dia (poderia permanecer ao longo de um dia, para permitir que Dhiab recebesse alimentos sem passar por este doloroso processo) e que chegou a ser lubrificado com azeite, o que deixou “estupefacto” Steven Miles, médico e professor de Ética Médica da Universidade do Minnesota, uma das testemunhas chamadas pela defesa na terça-feira. “Não há nenhum debate sobre isto. Toda a literatura médica diz que a lubrificação tem de ser solúvel em água. Não é preciso fazer muitas saladas para saber que esse não é o caso do azeite.”<_o3a_p>

Pneumonia crónica<_o3a_p>

Segundo Miles, esta lubrificação pode causar uma forma de pneumonia crónica caso o tubo seja mal colocado e o azeite chegue aos pulmões. O Departamento da Justiça escolheu não apresentar testemunhas (nem médicos nem responsáveis militares, que assim não poderão ser contra-interrogadas) e apoiar-se antes em declarações feitas por pessoal de Guantánamo. Mas um porta-voz veio defender que o risco do uso do azeite é mínimo e que essa prática foi abandonada – de acordo com a defesa de Dhiab, depois deste ter apresentado uma declaração escrita a questionar a prática.<_o3a_p>

A Administração diz que Dhiab representa um risco de segurança para os guardas, que já atacou “cinco vezes desde Abril” (“pontapeando-os”, “atirando-lhes com urina e fezes” e usando “linguagem abusiva”). Dhiab, que mede 1,95 metros e pesava 69 quilos a semana passada, está demasiado fraco para constituir uma ameaça, testemunhou Stephen Xenakis, brigadeiro-general na reforma e psiquiatra que pôde estar algumas horas com o sírio. <_o3a_p>

A defesa de Dhiab argumenta que a alimentação forçada e a forma como esta tem sido administrada são actos de punição contra a greve de fome. Referindo-se à cadeira onde a sonda é inserida e retirada, Miles diz que é “uma forma de punição” e conta que “em 20 anos a trabalhar em hospitais próximos da actividade de gangues nunca” teve de fazer algo semelhante para alimentar ninguém. Sondra Crosby, médica e professora na Universidade de Boston, perita em vítimas de tortura que visitou Dhiab, afirmou-se “muito preocupada com decisões de ordem disciplinares” e “completamente desapropriadas do ponto de vista médico”.<_o3a_p>

Crosby considera que Dhiab “está pronto a colaborar e a ser alimentado por sondas, mas não de forma forçada”. “Quer ser tratado com respeito e humanidade”, testemunhou a médica. Crosby considera que o sírio apresenta sinais de “stress pós-traumático” e defendeu que o facto de ele ser retirado da cadeira de rodas “explica por que é que a confiança com o pessoal médico foi minada”. <_o3a_p>

Xenakis, que, ao contrário de Crosby, é psiquiatra, disse não ter tido condições para diagnosticar Dhiab, já que Guantánamo não o avaliou o suficiente do ponto de vista neurológico. Mas garante que “é cooperante, voluntário e aberto a tornar tudo mais fácil”. O sírio, sustenta Xenakis, “quer estar no melhor estado de saúde possível, não quer morrer” da greve de fome. Só “quer sair e viver com a sua família.”<_o3a_p>

Dhiab apresentou o seu caso entre segunda e terça-feira, a Administração deveria terminar de apresentar o seu ainda esta quarta-feira. Nos documentos entregues em tribunal, os advogados de Dhiab explicam que ele quer que os norte-americanos “vejam o que se passa hoje na prisão, para que percebam por que é que os detidos estão em greve de fome e por que é que a prisão deveria ser fechada”.<_o3a_p>
 

   

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