Finlândia mostra em Frankfurt um país onde a língua voa
A Finlândia chegou a Frankfurt, onde este ano é o país convidado, para mostrar ao mundo que das línguas minoritárias também podem sair best-sellers e que parte do sucesso do seu sistema de ensino está no combate à standardização.
A autora do elogiadíssimo romance A Purga, editado em Portugal pela Alfaguara, tem ascendência estoniana e nasceu na Finlândia em 1977. No seu discurso lembrou que nessa altura o país se encontrava no que ela define como “a era dourada da ‘finlandização’”, uma época de “erosão da democracia” e de “estrangulamento da liberdade de expressão”. Mas os anos passaram, ela cresceu e o seu país mudou.
Em 2014, relativamente à liberdade de expressão, a Finlândia aparece em primeiro lugar nas listas das organizações defensoras da imprensa livre. O seu outro país, a Estónia, ocupa um também honroso décimo primeiro lugar. “Quando a Finlândia se tornou independente em 1917 e a Estónia em 1918, duvidava-se da capacidade de agirem como países independentes, tal como hoje se pensa o mesmo em relação à Ucrânia. Tanto a Finlândia como a Estónia são exemplos do tipo de progressos que um povo, uma língua e a arte podem conseguir num curto período de tempo se lhes forem dadas oportunidades para isso”, defendeu.
Contou que muitas vezes lhe perguntam por que é que escreve em finlandês, já que fala tão bem inglês. Sofi responde-lhes da mesma maneira, diz-lhes que escreve em finlandês porque essa é a sua língua mãe e graças aos seus tradutores o facto de falar uma língua de uma região pequena não se tornou um obstáculo para que tivesse leitores em todo o mundo.
Metade dos escritores finlandeses são mulheres e Sofi Oksanen evocou várias vezes no seu discurso outra escritora, Fredrika Runeberg (1807- 1879), uma das primeiras jornalistas finlandesas, lembrando que tal como John Stuart Mills, ela acreditava “que as mulheres e os escravos só sabiam quem eram quando ganhavam a sua liberdade". O mesmo acontece com as línguas, sublinhando quando chegou ao fim do seu discurso: "Só uma língua livre pode voar”.
O académico Pasi Sahlberg, especialista em educação, subiu ao palco a seguir à sua compatriota para tentar explicar aos alemães e editores, escritores e jornalistas de todo o mundo as causas do sucesso do sistema de educação finlandês. Lembrou que o mundo está há quase uma década e meia a falar e a escrever sobre o sistema de ensino finlandês por causa dos seus excelentes resultados no PISA - a grande avaliação internacional à literacia dos alunos de 15 anos nas ciências, matemática e leitura.
E quais poderão ser algumas das razões para esse sucesso? “As crianças finlandesas só começam a educação formal aos sete anos. O horário escolar é mais curto e os professores marcam menos trabalhos para casa do que os seus colegas em outros países. Os alunos finlandeses não passam a vida a fazer testes ou exames”, explicou o académico. Por outro lado os professores finlandeses durante o tempo que passam na escola têm mais horas para interagir e colaborar com os seus colegas (dão metade das aulas por dia que os seus colegas norte-americanos, por exemplo). Outro dos aspectos a que Pasi Sahlberg dá importância e segundo ele pode marcar a diferença é o papel central que têm as actividades lúdicas, como jogar ou brincar, na aprendizagem nas escolas finlandesas: cada hora de ensino tem de incluir um quarto de hora para actividades dos próprios alunos.
“Na minha experiência o resto do mundo associa a Finlândia com duas coisas: a educação e a Nokia. E há alguns pontos interessantes que o sistema de ensino finlandês e a Nokia têm em comum. Ambos têm as suas origens a meio dos anos 1860 e a inspiração de ambos veio da Alemanha. O homem que trouxe estas novas ideias para a Nokia era Fredrik Idestam, um engenheiro, enquanto o pai do sistema de ensino foi o clérigo Uno Cygnaeus. Além disso o crescimento global da Nokia e das escolas finlandesas aconteceu nas décadas de 1970-80”.
Depois de fazer estes paralelismos entre a Nokia e o sistema de ensino, Pasi Sahlberg lembrou na cerimónia de abertura da feira que um dos problemas que levou à perda de competição da Nokia foi esta ter chegado muito rapidamente ao topo e ter havido alguma complacência nessa subida. “Não é fácil estar no centro das atenções dos consumidores e da concorrência. É difícil reformar o que está a funcionar bem, especialmente na Finlândia”, afirmou. “Quando se está no pináculo do sucesso, temos de saber como localizar a próxima grande oportunidade e saber aproveitá-la, mesmo quando o que temos hoje é já muito melhor do que o que tínhamos ontem.” Sábio conselho de difícil realização.