Chuva intensa deixa Lisboa meia submersa e faz seis desalojados na Lourinhã
A última grande chuvada deste Verão — o Outono chegou hoje às 3h29 — deixou Lisboa debaixo de água, parou o trânsito no centro da cidade e causou danos. Na ressaca, trocaram-se acusações. Tempo só melhora na quarta-feira.
Apesar do caos no centro da cidade, foi da Madre Deus que, às 16h30, veio a maior preocupação. Um muro caiu e inicialmente havia suspeitas de estarem desaparecidas três crianças, segundo o Regimento de Sapadores dos Bombeiros de Lisboa.
“Era um muro bastante alto que suporta as terras de um campo de jogos. A chuva provocou a derrocada de uma parte do muro e chamámos a Protecção Civil e os bombeiros. Já foi feita uma contagem, estão todos os alunos”, disse ao PÚBLICO Eduardo Vilaça, vice-presidente da Casa Pia de Lisboa, a que pertence o Centro de Educação e Desenvolvimento de D. Maria Pia, frequentado por 600 crianças e jovens.
Foi chamada a Unidade Cinotécnica do Regimento de Sapadores Bombeiros de Lisboa e os cães permitiram às autoridades ter a certeza de que ninguém tinha sido atingido.
O muro fica no interior do colégio. “Toda a zona será isolada e vamos fazer o reforço da segurança interna para garantir que ali não vai passar ninguém”, afirmou ainda Eduardo Vilaça. O estabelecimento deverá, contudo, continuar a funcionar.
Antes disso, e a partir das 13h30, em boa parte da cidade caía um dilúvio. O Regimento Sapadores Bombeiros de Lisboa (RSB) registou 121 ocorrências entre as 14h e as 16h, devido às inundações.
Imagens de radar do mau tempo na segunda-feira (Fonte: IPMA)
A linha azul do Metropolitano esteve com perturbações na circulação desde as 14h18 até às 15h45, devido a uma inundação causada pela forte chuva, e o trânsito na Praça dos Restauradores foi desviado devido às inundações registadas na zona da Baixa, principalmente no Rossio.
De acordo com os bombeiros, as inundações verificaram-se ainda na Rua República da Bolívia e na Rua Carolina Michaelis de Vasconcelos, em Benfica, na Calçada de Carriche (Santa Clara), na Rua Prof. Pulido Valente (Lumiar), na Rua de Alcântara (Alcântara) e na Calçada de Palma de Baixo e na Rua Tomás da Fonseca (São Domingos de Benfica) e na Rua Visconde de Seabra (Alvalade).
Entre a Calçada da Palma de Baixo e a Estrada das Laranjeiras, na zona de São Domingos de Benfica, uma testemunha disse que a água naquela zona deveria alcançar cerca de meio metro de altura. A mesma fonte, além de notar a interrupção da circulação automóvel, testemunhou que um peão atravessava a estrada com a água pelos joelhos.
A circulação era feita com dificuldade no Largo das Fontainhas, em Alcântara, Praça de Espanha e Calçada de Carriche devido a “lençóis de água”. No eixo Norte-Sul, a PSP reportou haver, também, dificuldades de circulação devido à chuva.
Face a esta situação — muita precipitação condensada em pouco tempo e coincidindo com a subida da maré no Tejo, o que prejudicou a drenagem —, o vereador da Protecção Civil da Câmara de Lisboa acusou o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) de não ter previsto tanta chuva, acrescentando que a cidade teve de se preparar “à última hora”.
“Houve uma grande precipitação. As informações que nós tínhamos do IPMA não iam nesse sentido, portanto a cidade teve de se prevenir à última hora, uma vez que não tinha sido lançado aviso laranja para o distrito de Lisboa”, disse Carlos Castro.
De acordo com o IPMA, o valor de precipitação mais elevado foi registado na estação meteorológica na Gago Coutinho, em Lisboa, com uma precipitação de 18,7 milímetros (correspondente à queda de 18,7 litros por metro quadrado) e caíram 13,2 milímetros nas Amoreiras. Estes valores, de acordo com o IPMA, “enquadram-se no limiar do aviso meteorológico amarelo”.
Por seu lado, o vereador do PSD na Câmara de Lisboa António Prôa anunciou que vai pedir responsabilidades, na reunião do executivo de amanhã, sobre as inundações. Apesar de admitir que “choveu bastante”, o vereador considerou que “não foi uma tromba-d’água à antiga” e estas inundações “só se suscitam porque, à semelhança do que aconteceu com a recolha do lixo, a câmara não calculou bem as consequências da transferência de competências” para as juntas de freguesia na qual perdeu muitos trabalhadores. “A câmara não adequou os seus serviços para fazer face à prevenção desta situação, como a desobstrução de sumidouros”, acrescentou. O vereador lamentou, ainda, que o plano de drenagem do município esteja há sete anos por concretizar.
Lourinhã com seis desalojados
Mas não foi só Lisboa a sofrer as consequências do mau tempo. A Autoridade Nacional de Protecção Civil registou em Portugal continental 221 ocorrências até meio da tarde. Nas Caldas da Rainha, várias habitações ficaram inundadas. A trovoada que se fez sentir desde as 7h30 afectou com “bastante intensidade” o concelho, onde foram registados “vários pedidos de auxílio devido a inundações em habitações e garagens na cidade e em algumas freguesias rurais”, disse à Lusa o comandante dos bombeiros das Caldas da Rainha, Nelson Cruz. Segundo este responsável verificaram-se também inundações nalgumas estradas da cidade.
Na Lourinhã, a chuva forte deixou 400 alunos sem aulas e seis pessoas ficaram desalojadas na sequência das cheias que deixaram isolada a sede do concelho durante boa parte da noite de segunda-feira e madrugada desta terça-feira
O presidente da câmara, João Duarte Carvalho, disse à agência Lusa que a Protecção Civil Municipal realojou temporariamente seis pessoas, de três famílias, cujas habitações no centro da vila inundaram, deixando-as sem condições para aí pernoitarem. A Comissão Municipal da Protecção Civil esteve reunida, mas não foi necessário accionar o Plano Municipal de Emergência.
Segundo o autarca, a forte precipitação ocorrida entre as 19h30 e as 20h20 provocou uma "situação de cheias rápidas" para a qual a Protecção Civil Municipal "não foi alertada pelas autoridades nacionais. O transbordo do Rio Grande e de um seu afluente agravou a situação de cheias.
No concelho, bombeiros e Protecção Civil ocorreram a meia centena de ocorrências relativas a inundações de ruas, garagens, habitações e estabelecimentos comerciais nas freguesias de Lourinhã e Atalaia e Vimeiro, onde se registaram apenas prejuízos materiais. Também um campista teve de ser resgatado do parque de campismo pelos bombeiros, devido à água.
No concelho de Felgueiras, em Lixa, cerca de 10.000 habitantes ficaram sem água devido à ruptura de duas condutas de abastecimento, em Airães, provocada pelo mau tempo de domingo à tarde. Na véspera, tinha sido sobretudo a região do Porto a mais atingida pela forte chuva, que originou inundações, dezenas de pedidos de auxílio e fez adiar o início do jogo entre o FC Porto e o Boavista, no Dragão.
Em declarações à agência Lusa, Joana Sanches, do IPMA, informou que o estado do tempo em Portugal continental vai continuar instável, com chuva e sol, pelo menos até dia 28 (domingo).
Chuva e trovoadas até quarta-feira
O IPMA alertou entretanto que as condições de instabilidade registadas na segunda-feira, com chuva e trovoadas, vão manter-se ao longo do dia de hoje, segundo disse à agência Lusa o meteorologista Ricardo Tavares.
"Para hoje, vão manter-se as condições de instabilidade que ocorreram durante o dia de ontem [segunda-feira]. Estamos a prever para hoje aguaceiros por vezes fortes e acompanhados por trovoadas um pouco por todo o território."
O meteorologista informou ainda que esta situação levou o IPMA a emitir um aviso laranja, o segundo menos grave de uma escala de quatro, para os distritos de Aveiro, Viseu, Guarda, Castelo Branco, Coimbra, Leiria e Santarém devido à previsão de aguaceiros por vezes fortes e acompanhados de trovoada. O aviso laranja para estes sete distritos vai estar em vigor até às 23h59 desta terça-feira.
O IPMA colocou também os distritos de Viana do Castelo, Porto, Braga, Bragança, Vila Real, Lisboa, Portalegre, Évora, Beja, Setúbal e Faro sob aviso amarelo, o terceiro mais grave de uma escala de quatro, também devido à previsão de aguaceiros por vezes fortes e acompanhados de trovoada.
De acordo com o meteorologista Ricardo Tavares, esta é uma situação que vai ser acompanhada e actualizada ao longo dia.
"Esta situação de instabilidade não é anormal para o mês de Setembro, mas a questão é que estamos sob o efeito de uma depressão que está centrada um pouco a oeste do território e agora mais sobre o continente. Há mais de duas semanas que estamos com esta precipitações um pouco fortes por todo o território", explicou.
No que diz respeito ao estado do tempo para quarta-feira, o meteorologista do IPMA adiantou que vai ser um pouco melhor.
"A situação de instabilidade vai diminuir um pouco. Vamos ter aguaceiros, mas não estamos a prever tão intensos e vamos ter ainda trovoadas nas regiões do interior durante a tarde", disse. com Lusa