Israelitas e palestinianos entram em "fase de teste" com cessar-fogo
Acordo não foi mais longe do que propostas anteriores, mas parou a guerra ao 50.º dia. O próximo mês é crucial para ambos os lados se avaliarem e para se perceber como será usada a reabertura dos postos fronteiriços de Gaza.
“A liderança de ambos os lados vai precisar de um turbo-mega-spin para convencer os seus públicos de que valeu a pena” terem lutado durante 50 dias num conflito que deixou mais de 2100 mortos em Gaza e 68 israelitas mortos, um deles ontem, dizia o jornalista do Ha’aretz, Chemi Shalev.
O que este acordo entre Israel e os palestinianos faz é permitir a entrada imediata de ajuda humanitária e de materiais de construção para a Faixa de Gaza, através da abertura do postos de fronteira de Rafah, que será controlado pela Autoridade Palestiniana (e não pelo Hamas), e aumenta a zona marítima em que os pescadores palestinianos podem pescar, e deixa para discutir daqui a um mês exigências mais complicadas (libertação de prisioneiros, reconstrução de porto e aeroporto).
Os mais cínicos apontam que se trata de um acordo muito semelhante ao que acabou rejeitado pelo Hamas e levou ao reinício do conflito. Os ainda mais cínicos perguntam: nesse caso porque é que parte dos ministros israelitas se opuseram agora a este acordo? Ainda mal fora anunciado, e já se sabia que o ministro da Economia, Naftali Bennet, e o dos Negócios Estrangeiros não tinham concordado, e como outros dois ministros também discordaram, se tivesse sido votado, o acordo teria sido chumbado pelo Executivo de Israel.
Uma fonte israelita disse que “Israel conseguiu o que queria”. Ainda assim a desmilitarização do Hamas ficou também adiada para discussão dentro de um mês.
Tanto a reconstrução de um aeroporto em Gaza como a desmilitarização do Hamas são exigências que poucos acreditarão que possam vir a concretizar-se num futuro próximo.
Nos últimos dias do conflito, o Hamas quis mostrar que não estava derrotado apesar das mortes de três comandantes, tidos como o golpe vitorioso de que Netanyahu precisava. Disparou uma chuva de rockets – no 50º dia foram disparados mais de 200 projécteis, e morreu um civil, o quarto a morrer em território israelita em todos esses dias.
Enquanto isso, Israel bombardou alguns dos mais altos edifícios de Gaza – um edifício de apartamentos e escritórios com 13 andares e um prédio residencial de 16 andares – matando pelo menos quatro pessoas.
Netanyahu poderia estar pressionado a não continuar uma guerra prolongada - ainda que a sua taxa de aprovação estivesse relativamente alta durante a incursão terrestre e até na retirada das tropas, desceu recentemente para 38% (há cinco semanas era de 82%).
Em Gaza, festejou-se o cessar-fogo como se fosse um feriado – carros a buzinar e disparos para o ar (que fizeram, como habitualmente, alguns feridos). Mas a pesada herança da guerra era notada mesmo na dificuldade de escolha de um local para celebrações – não havia literalmente um local em que se pudesse juntar uma pequena multidão que não estivesse cheio de escombros.
Um alto responsável egípcio, envolvido nas conversações indirectas mediadas pelo Cairo, disse ao diário israelita Ha’aretz que o próximo mês será um teste, especialmente aos palestinianos, em relação ao modo como correrá a reabertura dos postos fronteiriços e a reconstrução da Faixa de Gaza. Israel não abdica de um controlo minucioso das entradas, especialmente de materiais de construção (afinal, o Hamas conseguiu nos últimos anos construir túneis para se infiltrar em Israel graças também ao desvio de cimento para construção). Caso a confiança seja restaurada, disse o responsável, será de antecipar a possibilidade de abrir permanentemente o posto de Rafah, desde que controlado pela Autoridade Palestiniana.
A solução de decidir um acordo temporário seguido de conversações num maior intervalo de tempo foi já feita no final da última operação militar israelita, em 2012. Parecendo mudar pouco na raiz do conflito entre Israel e o Hamas, se as negociações subsequentes falharem, a causa ficará de novo exposta e os dois lados poderão ser de novo arrastados para um novo conflito – os dois já tiveram três guerras desde que o Hamas assumiu o poder na Faixa de Gaza em 2007.