Inspecção ao Montepio avalia exposição ao Grupo Espírito Santo

Venda de dívida pública ajudou a suportar lucros semestrais da instituição financeira.

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A exposição do Montepio ao GES, de 150 milhões de euros, foi feita por três tranches, entre Dezembro do ano passado e Junho deste ano.

De acordo com a RTP, a auditoria teve início a 25 de Julho, está a cargo da Deloitte e incide sobre a actividade de 2009, de 2010 e de 2011 do grupo Montepio Geral, o que já foi confirmado pela instituição financeira. Em resposta a questões do PÚBLICO, fonte oficial do Montepio afirmou que é “uma das três entidades auditadas” pelo BdP, além do BES (numa outra escala, como referiu Carlos Costa), o que, defende, “é uma situação normal e desejável do ponto de vista da prevenção” e que “as auditorias forenses são práticas habituais do regulador”. Este argumento não coincide, porém, com declarações de Carlos Costa, quando referiu que as auditorias forenses só ocorrem em casos excepcionais e quando há indícios fortes de ilícitos. Já da parte do regulador não foi possível obter um comentário.

Tal como PÚBLICO revelou na sua edição online de 19 de Julho último, a exposição directa e indirecta do Montepio Geral/Caixa Económica às áreas financeira e não financeira do GES pode ultrapassar os 200 milhões de euros. Isto tendo em conta que existe mais risco nas seguradoras e fundos de investimento do grupo Montepio Geral ao designado “sistema GES/BES/PT/Ongoing”.

Desde 2009 que o BES é considerado o banco de referência do Montepio Geral, havendo grande relação comercial entre os dois grupos financeiros, que se destacaram nos últimos dois anos por se “orgulharem” de não ter pedido o apoio do Estado na sequência da crise de 2008 e das novas exigências regulatórias em termos de capital. Em 2009, o PÚBLICO revelou que, no final de 2008, a associação mutualista aplicara, via banco, mais de 40 milhões de euros em veículos da Ongoing, com sede no Luxemburgo.

A decisão de afectar, em 2008, fundos mutualistas à Ongoing gerou grande controvérsia pública na altura, mas as autoridades de supervisão consideraram o investimento normal, não tendo avançado com averiguações. A exposição do Montepio à Ongoing, entretanto, e segundo apurou agora o PÚBLICO, aumentou para cerca de 60 milhões, dos quais 15 milhões de euros são financiamentos directos à Ongoing SGPS, e perto de 45 milhões de euros à RS Holding, empresa de consultoria da família Rocha dos Santos, que controla a Ongoing.

Recorde-se que os donos da Ongoing, Nuno Vasconcelos e de Rafael Mora, de grande visibilidade mediática, são considerados gestores da órbita do GES

BES (estão no capital da PT, de que também o ex-BES era um dos maiores accionistas, tendo a operadora perdido 897 milhões com a Rioforte).

Os apoios financeiros do Montepio ao sistema GES (como a Rioforte e a Ongoing) possibilitaram que as empresas continuassem a actuar nos mercados sem recorrer a endividamento bancário (que a partir da crise de 2008 passou a ser mais escrutinado).

No primeiro semestre do ano, o Montepio, presidido por Tomás Correia (que foi o braço direito de José Silva Lopes no MG até 2009), apresentou lucros semestrais positivos de 11,9 milhões de euros. No entanto, segundo informações recolhidas pelo PÚBLICO, esse resultado assenta em ganhos obtidos com a venda de obrigações de taxa fixa em dívida pública, nomeadamente, portuguesa. Os proveitos superiores a 275 milhões de euros contabilizados na alienação de divida pública serviram para compensar o aumento de mais de 165,5 milhões de euros nas provisões para crédito em vias de incumprimento devido, em parte, à exposição a empresas do GES (como a Rioforte). Sobre a questão da venda de dívida pública, bem como a exposição à Ongoing, a instituição afirma diz apenas que “toda a informação vem espelhada no relatório e contas, conhecida pelo regulador e pelo mercado”.

Apesar de ter registado em 2013 um prejuízo histórico de 300 milhões de euros (sendo o capital da Caixa Económica de 1500 milhões de euros e o do fundo mutualista de 200 milhões), no primeiro semestre de 2014 as provisões para crédito mal parado voltaram a disparar, o que traduz uma deterioração da actividade do Montepio, que poderá ter mais impactos no curto prazo.

É que, se nos primeiros seis meses os números já reflectem provisões de 165,5 milhões de euros, onde estão contidas perdas com o GES (cumprindo instruções do regulador, que exigiu a contabilização de 50%), mais ainda terá de ser assumido até ao final do ano, pois só em Julho se deu a falência em cascata das holdings (ESI, Rio Forte, ESFG). Ao PÚBLICO, o Montepio garantiu apenas que “as provisões feitas são ainda mais conservadoras que as exigidas pelo regulador”, sem adiantar valores. De acordo com informações recolhidas pelo PÚBLICO, entre Dezembro de 2013 e Junho deste ano, o Montepio terá financiado o GES em três tranches, no valor total de 150 milhões, e numa fase em que as empresas estavam já sem condições de se financiar nos mercados.     

O Montepio Geral justificou a passagem dos prejuízos em 2013 para os 11,9 milhões de euros de lucro no primeiro semestre deste ano (quando tinha ganho 35,5 milhões só no primeiro trimestre) como resultado de uma melhoria da margem financeira e do produto bancário. Olhando ainda os primeiros seis meses deste ano, só o Finibanco Angola deu um resultado positivo de 5,3 milhões, ou seja, 44,4% dos resultados consolidados.

Álvaro Dâmaso, ex-presidente da Bolsa de Valores de Lisboa, e da autoridade de comunicações, entrou em 2009 para a administração do Montepio, mas desde há vários meses que se afastou da gestão corrente, o que tem provocado alguma apreensão dentro do grupo mutualista.

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