BES recebe injecção de 4900 milhões de euros e passa a chamar-se Novo Banco
Abertura dos balcões do Novo Banco está a decorrer com normalidade, mas PSP admite estar "atenta" a possíveis perturbações.
O Novo Banco passa a ser propriedade do Fundo de Resolução bancária, gerido pelo Banco de Portugal, mas fundeado nos restantes bancos do sector, chamados de forma indirecta e directa a recapitalizar a parte boa do antigo BES. O valor global da injecção será de 4,9 mil milhões, sendo que o Estado emprestará ao sector financeiro cerca de 4,4 mil milhões da linha estatal negociada com a troika. Os restantes 500 milhões serão injectados pelo sistema, nomeadamente pela CGD, BCP, BPI, Santander, Montepio Geral, Banif, CCAM, através do Fundo de Resolução.
A Polícia de Segurança Pública admitiu já nesta segunda-feira que vai estar "atenta" à abertura do Novo Banco, apesar de referir não haver indícios de que possa haver perturbações envolvendo clientes da instituição. A agência Lusa acompanhou esta manhã a abertura de agências na Avenida da Liberdade, em Lisboa, e no Estoril e S. João, na linha de Cascais, onde não se verificava qualquer anomalia. No Porto, o PÚBLICO verificou que, a poucos minutos da abertura da agência de Cedofeita, havia apenas um cliente à espera.
O desfecho para a crise do BES não foi o desejado pelas autoridades. Banco de Portugal, Gestão liderada por Vítor Bento e Governo que esta quarta-feira ainda apostavam numa solução privada opara o BES. Ao não injectar verbas directamente no BES, mas por via do fundo de resolução (por empréstimos públicos ao sector financeiro), o Estado evita os impactos na dívida e no défice, pelo que, em princípio, os contribuintes não serão chamados a pagar pelos erros de gestão da equipa liderada por Ricardo Salgado, bem como pelos ilícitos que lhe são atribuídos.
A solução foi anunciada ontem ao final da noite pelo governador do BdP, Carlos Costa, e passa pela divisão do segundo maior banco (que a partir de amanhã deixa de estar cotado na bolsa) em dois: um banco-bom para onde serão transferidos os depósitos, os créditos sem risco e os activos rentáveis que se chamará Novo Banco; e um banco-mau, que preserva a marca BES, que receberá os créditos associados ao GES e às empresas satélites (como o BESA) ou sem condições de os pagar. No banco-mau ficarão os actuais accionistas (GES, Credit Agrícole, PT, Bradesco) e os detentores de obrigações que responderão pelas perdas. O BES passará a ser gerido no quadro do BdP, tendo sido indicado como presidente Luís Máximo dos Santos, que geriu a falência do BPP. Ao seu lado, anunciou este segunda-feira o regulador, terá César Brito (ligado ao Banco de Portugal e actualmente a atrabalhar no gabinete do mediador do crédito) e Miguel Morais Alçada (que foi responsável pela direcção de recuperação de créditos do Banif), como vogais do conselho de administração
Já o Novo Banco manterá como CEO Vítor Bento, agora com a chancela das autoridades e não dos privados, e ainda José Honório e Moreira Rato (CFO). O accionista será o Fundo de Resolução bancária, que é gerido também pelo BdP, e fundeado nos bancos com actividade em Portugal. Os trabalhadores e as agências do BES passam para a esfera do Novo Banco, assim como os depositantes e os credores sem dívida subordinada do BES. Para estes nada mudará, portanto. A não ser que agora vão estar associados a um banco dotado do capital necessário (4,9 mil milhões) para se manter a funcionar dentro das regras exigidas e limpo dos activos tóxicos (4,6 mil milhões de euros) que o arrastaram para a actual situação. O Novo Banco terá um rácio de capital de 8,5%, acima dos 7% exigidos pelas regras europeias (e dos 5% com que se apresentava ontem).
A CGD, o BCP, o BPI, o Santander, o Montepio Geral, o Banif ou o CCAM, nomeadamente, ficam responsáveis pelos 4,9 mil milhões de euros a injectar no Novo Banco na proporção da sua contribuição para o fundo de resolução. Dado que o Estado adiantará cerca de 4,4 mil milhões de euros, o sector terá de avançar com 500 milhões de euros (incluindo os 182 milhões de euros que já estão no fundo). Como colateral o sector receberá o Novo Banco e o produto da sua venda destina-se a reembolsar o fundo de resolução. A participação do sector financeiro no resgate do BES será faseada (não terá reflexos imediatos nas contas) o que terá custos minorados para as instituições, não pondo em causa a sua sustentabilidade.
O cenário de divisão do BES em dois bancos e de injecção de fundos por via da linha de recapitalização negociada com a troika não estava até quinta-feira em cima da mesa. Mas o galopar dos acontecimentos das últimas três semanas acabou por forçar uma intervenção mais dura, para travar a onda de dúvidas à volta da solvabilidade daquele que era então o segundo maior banco português com grande penetração na economia real e no financiamento à economia.
Depois do BdP e do Governo terem garantido que o BES estava protegido do GES, constatou-se que todos os problemas do GES estavam a desaguar no BES. O que se agravou nas últimas semanas quando o supervisor detectou novo buraco de 1,5 mil milhões nas contas, pois a anterior gestão desrespeitara (já depois de Salgado ter deixado o banco) as orientações do BdP e aumentado a exposição às holdings do grupo (Rioforte e ESFG), agora sob protecção de credores. Acresce que foram ainda apuradas várias ilicitudes que levaram o BdP a solicitar uma auditoria forense.
Na sequência das múltiplas correcções ao balanço foi apurado um prejuízo de 3,6 mil milhões e imparidades de 4,6 mil milhões. O que acentuou o sentimento de incerteza dos clientes e dos investidores que assistiram nos últimos dias à queda livre das cotações do banco (no aumento de capital de Maio foram subscritas a 0,65 cêntimos) que esta sexta-feira se negociaram a 10 cêntimos.
É possível que o BdP tenha pensado e feito tudo bem no dossier BES. Mas o resultado não saiu como Carlos Costa desejava. Talvez por ter demorado tempo de mais a agir: não há experiência de uma intervenção num banco desta dimensão no contexto da nova União Bancária europeia, mas também porque as autoridades nunca equacionaram que o pior cenário (um buraco de mais de 4 mil milhões de euros) pudesse acontecer. E o pior cenário aconteceu.