Aumento de vapor de água na atmosfera associado pela primeira vez à actividade humana
O aumento de temperatura na atmosfera, causado pelo aquecimento global, está a ter impacto no vapor de água que existe no ar.
As alterações climáticas estão directamente ligadas aos gases com efeito de estufa. Tudo começa no Sol, cuja energia chega ao nosso planeta sob a forma de luz. Alguma dessa luz é reflectida pela atmosfera e pelas nuvens, mas outra parte atinge a terra e os oceanos, aquecendo-os.
A Terra, por sua vez, irradia parte dessa energia sob a forma de raios infravermelhos. Uma percentagem desse calor escapa-se para o espaço, mas há outra que é retida pelos gases da atmosfera, como o dióxido de carbono, o metano ou o vapor de água. É este calor, retido pelos gases, que torna a temperatura terrestre amena.
Mas com o aumento da concentração dos gases com efeito de estufa, lançados para o ar devido à actividade humana, o calor retido neste processo tem aumentado, tornando a Terra mais quente.
É difícil compreender o papel do vapor de água neste processo. O vapor de água absorve mais infravermelhos do que o dióxido de carbono. Além disso, à superfície da Terra, a sua concentração é de cerca de 1%, enquanto o CO2 é de 0,04%. Por isso, à partida, o vapor de água teria um peso maior no efeito de estufa.
Mas o ciclo de água é muito dinâmico. Mal o vapor de água sobe na atmosfera, a temperatura baixa e estas moléculas condensam, transformam-se em nuvens, chove e a água desaparece da atmosfera. Por isso, a dez quilómetros de altitude, a quantidade de vapor de água já caiu para níveis normalmente ínfimos.
O CO2, ao contrário, é mais estável. Este gás não sofre alterações de estado devido à diminuição de temperatura na atmosfera terrestre. A sua concentração de 0,04% é mais ou menos homogénea a maiores altitudes. Assim, quando se injecta mais gás neste sistema, como se tem feito continuadamente deste a revolução industrial, este gás acumula-se no ar e tem um efeito directo no aquecimento global.
“O vapor de água está limitado pela temperatura e o dióxido de carbono não”, resume ao PÚBLICO Pedro Miranda, meteorologista e professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que não está ligado ao estudo.
Mas, nas últimas décadas, os satélites mediram o aumento de concentração do vapor de água na troposfera superior (dos cinco aos 11 quilómetros de altitude). A atmosfera tem várias centenas de quilómetros e a troposfera é a fatia junto da superfície. “Continua a não ser claro se este aumento de humidade resulta de flutuações naturais do sistema climático, ou se as actividades humanas contribuíram para esta tendência”, lê-se no artigo de Brian Soden, da Universidade de Miami, nos Estados Unidos, e colegas.
Para tentar compreender as causas deste aumento da concentração do vapor de água, a equipa de investigadores correu dois modelos climáticos diferentes entre 1979 e 2005. Um dos modelos tinha em conta o aumento da concentração de gases de efeito de estufa, que, de facto, aconteceu devido à actividade humana. O outro é um modelo teórico onde estes gases não foram libertados e, portanto, todas as variações observadas devem-se à variabilidade natural do clima terrestre.
Os modelos mostraram que o aumento da concentração de vapor de água na troposfera superior não teria acontecido sem o aumento dos gases com efeito de estufa. “O estudo é o primeiro a confirmar que as actividades humanas aumentam o vapor de água na troposfera superior”, defende Brian Soden, num comunicado da Universidade de Miami.
“O vapor de água está a responder ao aquecimento global reforçando o aquecimento”, explica por sua vez Pedro Miranda. Ou seja, o aumento da temperatura atmosférica permite haver uma maior concentração de vapor de água a maiores altitudes que, por sua vez, poderá absorver mais radiação terrestre, reforçando assim o efeito de estufa.