No PS, como na selecção, por quatro pontos se ganha, ou perde
O assunto é aquele que todos dizem querer evitar: questões estatutárias. No entanto, na reunião da comissão política nacional desta quinta-feira não se falou de outra coisa. Seguro não aceitou nenhuma das principais propostas de Costa.
A reunião aconteceu precisamente para isso: aprovar o regulamento que definirá a forma como se realizarão as primárias de 28 de Setembro próximo, nas quais, previsivelmente, se defrontarão os dois homens que querem liderar o partido. A eleição, como se sabe, não cuidará de escolher um líder, apenas um "candidato a primeiro-ministro". Porém, sabe-se também, se o escolhido for Costa, Seguro demitir-se-á.
Estas são as certezas. A reunião desta quinta-feira tratou das dúvidas. Quem vota, como se vota, até quando se pode declarar a "simpatia" pelo partido, pois, além dos militantes com quotas pagas, os simpatizantes terão igualmente direito a escolher nas primárias.
Na SIC Notícias, Costa foi substituído por José Magalhães, na Quadratura do Círculo. No Rato, o seu ponta-de-lança foi Carlos César. Foi o ex-presidente do Governo Regional dos Açores que, à entrada da sede nacional do PS, explicou como pretendia acabar com esta "fase de grande perturbação da direcção do partido". A solução está num "consenso" quanto às regras das primárias. Para Carlos César, a proposta de Seguro (aquela que tinha sido apresentada na segunda-feira) não oferece "garantias de idoneidade e transparência". Por isso, os apoiantes de Costa apresentaram várias propostas de alteração. "A direcção não deu qualquer resposta", queixou-se César.
Os pontos que Costa considera inaceitáveis são quatro: a data para o fecho dos cadernos eleitorais (uma semana antes da votação); a possibilidade de os eleitores votarem sem qualquer documento de identificação; a inexistência de um órgão fiscalizador autónomo; e a necessidade de escolher a comissão eleitoral por consenso (dois terços dos membros da comissão política).
Para Costa, estes quatro pontos são essencias para garantir a "democraticidade" do processo. Alegam os seus apoiantes que os prazos não são suficientes para atender a eventuais erros de recenseamento e a possibilidade de voto sem identificação abre o caminho à "fraude".
Foi isto, sobretudo, que César começou por defender na reunião.
Do lado de António José Seguro, os apelos ao consenso também se repetiram. O secretário-geral tem uma justificação para todas estas alíneas que Costa critica. No caso dos cadernos eleitorais – que fecham no dia 21, a uma semana da votação – a proposta de Seguro inspirou-se no processo de primárias dos socialistas italianos. E, por isso, não incluiu nenhuma das propostas "centrais" de António Costa na sua proposta revista. Isso já era claro, ainda antes de ter início a reunião da comissão política.
Que efeitos isso terá nos alinhamentos actuais? Para já ainda não é possível antecipar. Mas à entrada para a reunião, Francisco Assis, um dos mais notórios apoiantes de Seguro, dizia ser "absolutamente imprescindível" que ambos os candidatos chegassem a um "consenso sobre as regras das primárias". Esse "entendimento" que Assis defende não parece possível, a esta luz.
Entre os membros da comissão política afectos a Costa, este regulamento, tal como está, não dá garantias. A convicção de vários dirigentes socialistas contactados pelo PÚBLICO era a de que os apoiantes de Costa deveriam votar contra a proposta do secretário-geral, caso esta não atendesse às suas preocupações.
Ambos os lados parecem irredutíveis. E esta reunião, a longo prazo, pode ser uma espécie de Portugal-Gana. Uma vitória que não serve para nada...