Johnny Rogan tentou e Morrissey passou a odiá-lo. "Pessoalmente, espero que Johnny Rogan acabe os seus dias muito em breve num acidente em cadeia na M3 [uma auto-estrada inglesa]", disse o vocalista dos Smiths, a propósito da biografia não autorizada publicada em 1993. Outros tentaram e continua a saber-se pouco, muito pouco, sobre este aglutinador de contrários: figura frágil em contramão na pop triunfante dos anos 1980; tímido venerado por milhares; figura nem masculina, nem feminina, nem abertamente gay, autoproclamado "profeta do quarto sexo"; livro em branco para ser preenchido.
O mistério sempre circundou a vida e as múltiplas e contraditórias "personas" de Steven Patrick Morrissey (o vegetariano furioso, o desbocado que às vezes soa como um racista declarado, o rei de todas as ambiguidades). E eis que Morrissey anuncia que está quase a acabar a autobiografia que começou a escrever há três anos - virá daí luz para desfazer a bruma?
À BBC Radio 4, o cantor explicou em que ponto vai: "Atingi o segundo rascunho, estou na fase dos melhoramentos". No próximo ano o livro já poderá estar nas bancas.
À sua maneira, já afirmou que - suprema lata de um gigante - quer que o livro seja lançado na série "Classics" da Penguin (onde está publicada gente como James Joyce, Platão, Mark Twain, Émile Zola, Charles Dickens e muitos outros nomes consensuais). Mas avisa, também, miserabilista, que o texto - que já vai em 660 páginas - pode não ser assim tão brilhante (isto quando há milhares de fãs a contar os dias até porem as mãos no livro). "Eu não sou assim tão interessante, por isso não sei por que é que escrevi tanto", disse à BBC. "Abordei toda a minha vida.
Questiono-me se 660 páginas não serão demasiadas para as pessoas suportarem. E, depois, sento-me e penso se seis páginas não serão já demasiadas. Não sei. Confuso".
Em 2008, também à BBC, quando anunciou que ia pôr as suas memórias em livro, enunciou os seus objectivos. "Há tanta porcaria a ser escrita sobre mim e, às vezes, é difícil viver com isso porque tudo se funde e se transforma no que és, no teu legado", disse, como se não tivesse a mínima responsabilidade pela nuvem de mistério em seu torno.
A batalha pela edição da obra já está em curso há algum tempo. No ano passado, um editor da Faber disse que lançar o livro preencheria o seu "sonho de editor mais persistente". Mas o coração de Morrissey está na Penguin: "Gostaria que fosse lançado pela Penguin, mas só se eles o publicarem como Clássico. (...) Não vejo porque não - um clássico contemporâneo".