Ordem aconselha médicos de família a recusarem fazer consultas de medicina do trabalho
Colégio da Especialidade de Medicina Geral e Familiar diz que Ministério da Saúde fez um diploma assente em “esperteza saloia”.
A portaria, que entra em vigor no final de Junho, prevê a transferência, para os médicos de família, da competência de vigilância da saúde do trabalho no caso dos funcionários de microempresas (com menos de dez empregados) que não exerçam actividade de risco elevado, trabalhadores independentes, de serviços domésticos, trabalhadores agrícolas sazonais, pescadores de embarcações até 15 metros, entre outros.
Discordando “da filosofia” do diploma, o colégio da OM aconselha os médicos de família “a usarem o dever de escusa se, em consciência, acharem não estar aptos e ou em condições para exercer os actos médicos, nos moldes exigidos pela referida portaria”. O Sindicato Independente dos Médicos já tinha avisado que ia recomendar este princípio do dever de escusa, sugerindo que os médicos se recusem a fazer consultas de medicina do trabalho, por não terem a formação necessária.
O colégio da OM critica a actuação do Ministério da Saúde (MS) com grande veemência, por não ter ouvido a Ordem neste processo. Sustenta que o MS fez a portaria assente em “esperteza saloia, tentando atirar areia aos olhos da população, ao defender que os cuidados de saúde primários do trabalho são da competência” desta especialidade e não da medicina do trabalho. Defende ainda que a publicação deste diploma é “mais um ataque profundamente capcioso, destinado a destruir” a especialidade dos médicos de família que estão já “afogados em indicadores de duvidosa utilidade clínica […] com listas de utentes de dimensão desmesurada, impostas à força, com sistemas informáticos lentos, inadequados e disfuncionantes, que, em vez de facilitarem a sua prática clínica e a relação médico-paciente, só servem para as dificultar e levar à exaustão física e psíquica”.
Respondendo à contestação a esta portaria que se tem avolumado nos últimos dias, o Ministério da Saúde garantiu terça-feira que o objectivo foi apenas o de “facilitar os procedimentos dos trabalhadores por conta própria, como as empregadas domésticas, que recorreram sempre ao seu médico de família para serem regularmente observados e as microempresas com meios económicos reduzidos para contratarem um serviço de medicina do trabalho". Assegurou também que não há "usurpações de funções, nem sequer aumento do número de consultas de medicina geral e familiar".
"O que há é a formalização e regularização da situação de todos aqueles que sempre foram apenas ao seu médico de família ou aos centros de saúde para poderem aferir do seu estado de saúde", asseverou o ministério, que lembrou que esta possibilidade está prevista na lei desde 2009.