Tribunal de Contas aceitou acção popular inédita para julgar governo de Alberto João Jardim

É a primeira vez que o Tribunal de Contas reconhece este direito de acção judicial, neste caso para julgar governantes madeirenses pela ocultação de dívidas da Saúde e do Desporto.

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Alberto João Jardim esteve em Coimbra a falar sobre a Constituição Daniel Rocha

O juiz conselheiro da secção do TdeC na Madeira, João Aveiro Pereira, por despacho de 11 de Abril reconheceu aos deputados do PS, autores do requerimento, “legitimidade para intentarem a presente acção popular”, por concluir que não existe “qualquer motivo para não receber tal acção”.

No requerimento, os deputados socialistas pedem a condenação de todos os membros do executivo madeirense, incluindo secretários e directores regionais, com base em responsabilidade financeira sancionatória, prevista na lei, com a aplicação de uma multa que não deverá ser inferior a 2.162 euros por cada infracção.

São demandados neste processo o presidente do governo regional, Alberto João jardim, o vice-presidente João Cunha e Silva, e dos secretários Ventura Garcês (Finanças), Jardim Ramos (Assunto Sociais), Conceição Estudante (Turismo e Transportes), Manuel António Coreia (Ambiente) e os ex-secretários Francisco Fernandes (Educação), Brazão de Castro (Recursos Humanos) e Santos Costa (Equipamento Social).

Com base no relatório de auditoria do TdeC, os autores pediam também a condenação de oito directores do Orçamento e Contabilidade, dos institutos da Saúde (IASAUDE) e do Desporto da Madeira (IDRAM), mas o juiz indeferiu a acção na parte referente a estes demandados, por terem pago voluntariamente a multa. Por isso, “extinguiu-se quanto a eles o procedimento por responsabilidades financeiras”, frisa o despacho.

Na decisão fundamentada na Constituição da República, João Aveiro Pereira reconhece que “o direito de acção popular é um verdadeiro direito de acção judicial com as inerentes características”. Para o juiz, “recusar a acção popular, com fundamento no facto de ela não estar prevista na Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, seria uma grave afronta directa à Lei Fundamental e uma denegação da justiça”.

Apesar da lei ordinária prever unicamente a acção popular administrativa e a acção popular civil, o juiz do TdeC na Madeira tinha já defendido a viabilidade da acção popular no despacho, publicado no Diário da República em Abril do ano passado, em que se insurgiu contra o magistrado do Ministério Público (MP), Varela Martins, por não ter deduzido acusação e requerido julgamento pelas infracções apontadas no relatório de auditoria aos Institutos regionais da Saúde e do Desporto.

No entender Aveiro Pereia, existiam nos autos “muitos fortes indícios de infracções financeiras sancionatórias graves que justificam amplamente a submissão a julgamento das correspondentes responsabilidades”.

Apesar disso, lamentava o juiz, o MP “coibiu-se de acusar os governantes regionais indiciados pelas infracções financeiras que lhe são imputadas, não porque não haja factos e provas em abundância, que tornam os indícios fortes, indeléveis e não escamoteáveis, mas porque optou por uma linha de raciocínio divergente da realidade plasmada na auditoria, eivado de conjecturas e ficções desarmónicas com o dever de objectividade e de legalidade porque se deve pautar a conduta processual do agente do MP”.

“Mandava o interesse público, constitucional e legalmente tutelado, bem como o bom senso e a objectividade” que o magistrado do MP “não se abstivesse de requerer o julgamento das graves responsabilidades dos membros do governo regional da Madeira neste processo”, sublinhava o juiz no polémico despacho.

A auditoria concluiu que os institutos da Saúde e do Desporto haviam omitido dívidas de, respectivamente, 169,3 milhões de euros e 6,9 milhões em 2010. Esta descoberta levou a que o valor dos encargos não-pagos dos serviços autónomos fosse corrigido em alta para 353,2 milhões, atirando o total global da administração pública para 1.625 milhões, montante idêntico ao de todo o orçamento regional.

As dividas omitidas pelo IASAUDE e do IDRAM não estão incluídas nos 1131 milhões de euros também “escondidos” pelo governo regional, objecto de um inquérito-crime aberto pela Procuradoria Geral da República em Setembro de 2011, mas ainda não concluído.

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