Porquê? Porquê? Porquê Delilah?
A música, celebrizada por Tom Jones, sobre um homem traído que mata a mulher, tornou-se num hino não oficial para os adeptos do Stoke City.
A verdade é que ninguém sabe, com certeza absoluta, por que razão é que Delilah se tornou numa espécie de hino não oficial do Stoke City. A música em si nada tem a ver com futebol e, que se saiba, Tom Jones não é adepto do Stoke City (seria, quando muito, de uma equipa galesa, como o Cardiff ou o Swansea) e nem sequer gosta muito de futebol – o râguebi será a prioridade desportiva deste galês de 73 anos. “Não tem nada a ver com o Tom Jones, é uma coincidência. É só porque ele tem a versão mais conhecida da canção”, diz ao PÚBLICO por email o gestor do site “Football & Music”, que prefere ser identificado por Webbie, e que também colocou a mesma questão.
As teorias partilhadas foram muitas, naquele que foi o post mais comentado da história deste site. Algumas destas teorias incluem “ouvi esta história num pub”, muitas são simplesmente de “ouvi dizer”, nenhuma delas era “estava lá”. Há quem diga que era um adepto Tom Jones que ia para trás da baliza e cantava durante os jogos. Ou que, numa ocasião em que alguns adeptos estavam encurralados pela polícia, começaram com o verso “Why? Why? Why?”. Ou que tudo começou quando a equipa estava nas divisões secundárias e os adeptos descontentes adaptaram um dos versos à situação da equipa “Forgive me Stoke City, I just could’t take anymore" ("Perdoa-me Stoke City, já não aguentava mais").
A versão mais aceite é a seguinte: algures nos anos 1980, um grupo de adeptos alcoolizados estava a perturbar a ordem com canções ordinárias e foram confrontados pela polícia. Os ditos adeptos terão acatado o “pedido” das autoridades e, naquele momento, a jukebox do pub começou a debitar Delilah. Há um adepto que assume a paternidade desta estranha relação entre a música e o Stoke City. Anton Booth garante que foi ele quem escolheu a música no confronto com a polícia.
Verdade ou não, é ele que costuma dar o mote para a claque começar a cantar em coro a história trágica de Delilah (com algumas alterações pontuais na letra, a atirar para o vernáculo). E os adeptos do Stoke, em 2011, quando foram à final da FA Cup, fizeram uma campanha para levar Delilah de volta aos tops britânicos (chegou a n.º 2 em 1968), fazendo um apelo para que a música fosse descarregada no iTunes, pelo menos, 15 mil vezes.
Delilah não é a única música pop/rock a servir de hino a uma equipa de futebol. You’ll Never Walk Alone, do musical Carousel, será a mais conhecida, associada há muito ao Liverpool, mas também há I’m Forever Blowing Bubbles, uma música norte-americana dos anos de 1910 que é a preferida dos adeptos do West Ham United. Blue Moon serve para os azuis do Manchester City, uma música, diz Webbie (adepto do City), mais apropriada aos tempos em que a equipa – hoje uma das mais poderosas da Premier League – andava a amargar nas divisões secundárias, “without a dream in my heart, without a love of my own”: “É a música melancólica perfeita, faz-me lembrar os velhos tempos.”
Entre as grandes bizarrias que surgem na relação entre a música e o futebol (e são muitas), há “música” que mostra que não é fácil encontrar futebolistas que saibam cantar (Júlio Iglésias, antigo guarda-redes do Real Madrid, será a grande excepção). Os culpados são John Barnes, Bruce Grobbelaar, John Aldrige, Steve McMahon, Kenny Dalglish (treinador) e outros que estavam no Liverpool em 1988 e que participaram sem constrangimentos no “Anfield Rap”, música criada para celebrar a participação da equipa na final da Taça em 1988 – perderam com o Wimbledon. “Craptacular” é como Webbie, do “Football & Music” descreve o “Anfield Rap” (que está disponível no Youtube), considerando, ainda assim, que havia algum talento musical naquele Liverpool: “Não há nada de mal com o rap de John Barnes. É, provavelmente, o único jogador inglês que sabe cantar.”
* Planisférico é uma rubrica semanal sobre histórias de futebol e campeonatos periféricos