Obama promete que não volta a espiar Merkel e Dilma... e pouco mais

Presidente dos EUA anuncia plano de reformas da Agência Nacional de Segurança para tentar reconquistar confiança dos cidadãos. Ainda não se sabe quem ficará com tutela da base de dados das comunicações.

Obama deverá traçar um meio caminho entre as recomendações dos peritos que nomeou e as preocupações das agências de espioangem
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Obama reconhece a necessidade de uma intervenção militar Kevin Lamarque/REUTERS
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“As nossas agências continuarão a obter informações sobre as intenções dos Governos em todo o mundo, tal como o fazem as de todos os outros países. Não pedimos desculpa por sermos mais eficazes. Mas chefes de Estado e de Governo com quem trabalhamos de forma mais chegada, e de cuja cooperação dependemos, devem confiar que os tratamos como verdadeiros parceiros”, assegurou Barack Obama. Foi uma alusão às escutas aos telemóveis da Presidente brasileira Dilma Rousseff e da chanceler alemã Angela Merkel, reveladas pelo analista informático Edward Snowden, que trabalhou para a NSA.

Obama procurou recolocar os Estados Unidos como um parceiro de confiança e, a nível interno, restabelecer a confiança dos cidadãos – uma sondagem Washington Post/ABC de Novembro revelava que cerca de 70% dos americanos considerava que os programas de vigilância da NSA sobre os telefones e o tráfego da Internet eram intrusivos e violavam o direito à privacidade. “As reformas que hoje proponho devem dar ao povo americano maior confiança de que os seus direitos estão a ser protegidos, e ao mesmo tempo permitir às agências de informação manter as ferramentas necessárias para a nossa seguranças”, afirmou Obama.

Uma das reformas será a nomeação de um painel de advogados para defesa das questões de privacidade no tribunal secreto que supervisiona os pedidos de mandados de vigilância de suspeitos de espionagem ou terrorismo em território dos EUA (conhecido pela siga FISA). Este painel terá de ser nomeado pelo Congresso – a quem Obama pediu para colaborar neste processo de revisão das competências da NSA, que diz estar apenas no início.

As propostas de mudança apresentadas por Obama não têm ainda um grande alcance. Não tocam, por exemplo, nos esforços da NSA para contornar a encriptação comercial – um dos pontos destacado pelo painel de peritos nomeado por Barack Obama para o aconselhar como agir em relação à agência.

Quem tutela bases de dados?
Mas Obama prometeu que deixará de existir nos seus moldes actuais outro programa polémico, o da recolha e armazenamento de metadados, que são informações associadas às comunicações. São dados como, por exemplo, a que horas foi feito um telefonema, a partir de onde e para que destinatário, ou quanto tempo durou. Na verdade, os metadados podem fornecer até mais informação sobre um sujeito do que a própria conversa telefónica. Podem-se conhecer os seus hábitos de consumo, por exemplo, ou as pessoas com quem se relaciona.

Estas informações são guardadas em bases de dados, à guarda da NSA, que pode fazer buscas nela quando e como desejar. O grupo de peritos que o aconselhou não detectou abusos intencionais, e o Presidente considerou importante preservar as capacidades deste programa polémico – mas reconheceu que pode ser problemático. “Acredito que os críticos têm razão em sublinhar que sem as salvaguardas adequadas, este programa pode ser usado para obter mais informação acerca das nossas vidas privadas, e abrir a porta a programas mais intrusivos de recolha de informação maciça.” Também nunca foi sujeito a supervisão do tribunal FISA, nem a debate público, frisou Obama.

A recomendação dos peritos era que a base de dados ficasse sob a responsabilidade das empresas de telecomunicações – uma ideia que não agradava a essas empresas, e muito menos à NSA. Obama deixa a questão em aberto, encarregando o Departamento de Justiça e as agências de espionagem de encontrarem uma solução até 28 de Março – a data em que o programa da NSA tem de ser reautorizado pelo tribunal FISA.

Snowden e reacções
Neste discurso, Obama mencionou Edward Snowden, reconhecendo de forma crítica que desencadeou estas reformas: “Não vou debruçar-me sobre as acções ou motivações do senhor Snowden. A defesa do nosso país depende em parte da fidelidade daqueles a quem são confiados os nossos segredos nacionais.” Disparada a crítica contra o ex-analista da NSA, exilado na Rússia, Obama projectou-se no futuro: “Independentemente de como chegámos aqui, a tarefa agora é mais do que reparar os danos às nossas operações ou evitar mais revelações. É preciso tomar decisões importantes sobre como nos vamos proteger e sustentar a nossa liderança no mundo, garantindo ao mesmo tempo as liberdades civis e a protecção da privacidade que os nossos ideais – e a nossa Constituição – exigem.”

Mas as reacções ao discurso não são muito positivas: “Nada do que o Presidente disso indica que a recolha de metadados vá cessar”, disse, em comunicado citado pela AFP, a Associação Nacional de Advogados Penalistas. “O que sobra deste discurso é que a vida privada continua a estar gravemento ameaçada”, disse a Amnistia Internacional. A comissária europeia Viviane Reding, no entanto, considerou o discurso de Obama um passo na direcção certa: “Fico satisfeita por ver que mesmo cidadãos não norte-americanos beneficiam de salvaguardas. Confiamos na protecção de dados.”

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