"O poder político pôs-se de joelhos perante a elite angolana"
Têm sido limadas arestas para que o poder angolano não se irrite com as elites portuguesas. A ideia foi defendida pelo jornalista Nicolau Santos na apresentação do livro Os Donos Angolanos de Portugal.
Quando Francisco Louçã, Jorge Costa e João Teixeira Lopes começaram a desenrolar o novelo da burguesia portuguesa para um próximo livro, concluíram que as ligações económicas entre Portugal e Angola justificavam um volume isolado. A investigação, parte de um trabalho mais amplo dos mesmos autores sobre a burguesia portuguesa e que dará origem a outra publicação ainda este ano, permitiu aos três dirigentes do BE concluir que não há praticamente nenhum empresário português "relevante" que não esteja ligado a Angola. E que Portugal tem sido uma espécie de "offshore" ou sector estratégico para os capitais angolanos.
Na apresentação do livro, Nicolau Santos, que nasceu na ex-colónia, tal como João Teixeira Lopes, descreveu um Portugal "permissivo e complacente" com regras de mercado "flexíveis" para os capitais angolanos, sem paralelo com outro investimento estrangeiro realizado no país. "Há uma grande ligação, para não dizer uma grande subserviência da elite portuguesa. O poder político pôs-se de joelhos perante a elite angolana", disse.
A "hipersensibilidade" do poder de Luanda tem sido assim tratada com pinças, até pela comunicação social portuguesa, que "já pensa duas vezes" antes de publicar uma notícia que envolva as altas esferas angolanas. A ideia de que se têm limado arestas para que o poder de Luanda não se irrite com as elites em Portugal foi ilustrada pelo jornalista do Expresso com o recente pedido de desculpas do ministros dos Negócios Estrangeiros, Rui Machete. “Angola tem explorado isto de maneira quase exemplar”, disse. E Portugal tem evitado qualquer incidente diplomático que comprometa o nosso "quarto maior parceiro económico e, no último ano, provavelmente o maior" .
Este não é, no entanto, dizem, um livro sobre Angola. É uma tentativa de explorar o poder angolano em Portugal. Jorge Costa explicou o peso dos interesses angolanos sobre recursos essenciais da economia portuguesa focados na energia, telecomunicações e banca. “Não há outro caso de um país que tenha entregue a sua soberania económica como Portugal fez com Angola”, disse. Mas as ligações têm rostos e, segundo o dirigente do Bloco, se analisados os currículos empresariais de todos os ministros e secretários de Estado desde o 25 de Abril, há 27 ex-governantes, “alguns de altíssimo peso político”, com um protagonismo muito importante. São do PS, do PSD e do CDS. E foram ministros ou secretários de Estado. Estão lá Ângelo Correia, Miguel Relvas, Nogueira Leite, Armando Vara, António Vitorino ou Nuno Thomaz. E o destaque vai para a banca. Trinta e dois membros de governos portugueses estão na CGD ou 18 no BCP. “Essa lista nunca foi elaborada, mas é essencial para compreender a profundidade das relações políticas e empresariais estabelecidas entre os capitais portugueses e angolanos”, defendem os autores.
Francisco Louçã, dos três o mais comedido nas palavras, preferiu sublinhar Os Donos Angolanos de Portugal como o contributo que escolheria dar para o debate democrático do que é hoje Portugal. “Será muito polémico, mas dará muita informação”, disse o economista e ex-líder do Bloco.
No fundo, disse, Teixeira Lopes, resume-se sempre a “saber quem manda”.