Subconcessão dos Estaleiros não seguiu regras da contratação pública
Presidente do júri que escolheu empresa privada, ouvido esta manhã no Parlamento, confirmou e sustentou opção de não utilizar regras do código da contratação pública.
De um lado o PSD e o CDS – junto com o procurador-geral adjunto do júri – a sustentar que todos os procedimentos legais a ter em conta tinha sido observados. Do outro, o PS, PCP e BE a levantarem dúvidas sobre o facto de não terem sido observadas as regras definidas pelo código de contratação pública. Com a comissão parlamentar de Defesa a encerrar os trabalhos ouvindo a deputada do BE a ameaçar com uma queixa à Procuradoria-Geral da República e a do PCP a sustentar a necessidade de um inquérito parlamentar à decisão de subconcessão.
A questão foi desde logo suscitada pelo PSD, através da deputada Mónica Ferro, que pediu a João Cabral Tavares que se pronunciasse sobre se o processo exigia que se observassem as regras de um concurso público.
O procurador-geral adjunto foi logo mais longe ao reconhecer que para lá das regras do concurso público –imparcialidade, transparência e concorrência - se ponderou a validade de seguir as regras do código de contratação pública. Que, concluiu, não se aplicavam por não se estar “nem de perto, nem de longe, perante serviços que coubesse ao Estado prestar”, lembrando o facto dos Estaleiros terem como missão a construção naval.
Esse argumento foi contestado pela oposição, embora o PS, PCP e BE tenham inicialmente centrado numa outra revelação de Cabral Tavares. A de que existia um parecer que sustentava essa posição da não necessidade de recorrer ao código. “Este parecer quem é que o solicitou”, peguntou o socialista Jorge Fão. “Quando foi solicitado”, acrescentou Carla Cruz do PCP. “Não teve necessidade de pedir outro parecer”, insistiu a bloiquista Mariana Aiveca.
Subjacente às perguntas estavam uma ideia partilhada pela oposição que Fão resumiu na pergunta a Cabral Tavares em que o confrontou com o facto de estar a ser “tutelado” na sua decisão. Suspeitas sustentadas ainda pelo facto do júri ter sido apoiado por uma “assessoria jurídica e uma assessoria financeira” que aparentemente não se sabia por quem tinham sido nomeadas – o escritório BBR e a BESI- e por um membro do gabinete do ministro da Defesa.
As respostas de Cabral Tavares não ajudaram ao esclarecimento
O procurador-geral adjunto, apesar de insistentemente questionado sobre estes temas, teimou em não responder. Sobre o parecer adiantou apenas que já existia – pelo menos a sua síntese – ainda antes do júri ter sido formado. Foi só depois do presidente da comissão parlamentar de Defesa o ter questionado sobre de quem era a autoria que Cabral Tavares acrescentou não se recordar. Também não esclareceu quem e quando havia sido solicitado. Sobre as assessorias deu a entender que poderia ser as equipas que estavam a assessorar o anterior processo de privatização e que estavam ali – incluindo o assessor do ministro – para “recolher [e prestar] toda a informação necessária”.
A audição acabou por transformar-se num pingue-pongue sobre a necessidade ou não de se recorrer ao código de contratação pública. Com Cabral Tavares a insistir que não tinha “dúvidas” de que “não se aplicava”, recorrendo ao argumento que não estavam em causa serviços ou obras públicas que fossem da responsabilidade do Estado. Que o que estava em causa era uma “licença” e não uma “concessão”.
Oposição não ficou convencida
O socialista Marcos Perestrello criticou a aparente “informalidade” que tinham presidido ao processo, reconhecendo não perceber sequer qual fora o “enquadramento jurídico que presidra ao procedimento”. Carla Cruz conclui que se “adensavam as dúvidas” sobre a decisão, o que justificava o inquérito parlamentar – que o PCP propôs. E Mariana Aiveca considerou que “só restava fazer a aferição do Ministério Público”.
Foi então que o presidente da comissão parlamentar, Matos Correia, invocou a sua condição de jurista para fazer uma contestação categórica a estas considerações e até mesmo dar a entender a falta de “seriedade intelectual” por parte da oposição. Dizendo que o recurso ao código “não afectaria em nada o acto e a natureza do concurso”.
O que ficou por responder foi a pergunta deixada no ar por Marcos Perestrelo, momentos antes. “Quer dizer, para comprarem porcas e parafusos os Estaleiros de Viana tinham de seguir o código de contratação pública, mas para ceder a sua actividade e encerrar as portas já não se aplicou…”