Rebeldes sírios cercam jihadistas no seu principal bastião
Raqa está nas mãos do Estado Islâmico no Iraque e no Levante desde Março. O grupo é acusado de deter, espancar, torturar e matar muitos civis e activistas.
“Desde a noite passada, os rebeldes cercam o quartel-general do ISIS na cidade de Raqa, principal bastião deste grupo na Síria. Conseguiram libertar 50 prisioneiros sírios detidos pelo ISIS num outro edifício”, diz o Observatório Sírio dos Direitos Humanos, a ONG ligada à oposição que, desde o início da revolta, faz a contabilidade das vítimas graças a uma rede de médicos e de activistas espalhada pelo país.
Entre os detidos – rebeldes e activistas – agora libertados não se encontra nem o padre jesuíta Paolo Dall’Oglio nem nenhum jornalista estrangeiro, precisou o Observatório. O jesuíta desapareceu em Julho: “O padre Paolo Dall’Oglio está vivo e está a ser bem tratado pelos seus raptores, que são membros do grupo extremista ISIS”, soube na altura o activista anti-regime Khalaf Ali Khalaf. Há ainda vários jornalistas estrangeiros e muitos activistas que se sabe terem sido capturados pelos extremistas.
Raqa está nas mãos do ISIS desde Março. Inicialmente, muitos combatentes estrangeiros lutaram contra o regime ao lado dos membros do Exército Livre da Síria, o primeiro grupo armado criado por desertores e civis para defender as populações das forças de Assad. Com o tempo, rebeldes sírios e moderados islamistas (sírios e estrangeiros) foram-se afastando cada vez mais dos grupos mais extremistas, que aterrorizam as populações dos locais que controlam.
O ISIS não parou de crescer na Síria, ao mesmo tempo que se ia fortalecendo no Iraque: no final da semana passada, tomou o controlo da cidade iraquiana de Falluja e de partes da capital da província de Anbar, no Ocidente do país, entre Bagdad e a fronteira síria.
“Às nossas famílias e ao nosso povo de Raqa, por favor perdoem-nos. Só queríamos trazer um pouco de alegria e de esperança às vossas vidas. Desejávamos que a nossa última declaração acontecesse quando o tirano Bashar al-Assad já tivesse caído, mas as circunstâncias são mais fortes do que nós. Pedimos a Deus que melhore tudo.” Foi assim que o Centro de Media da Revolução de Raqa se despediu da cidade, no início de Novembro, quando um dos seus colaboradores foi espancado por membros do ISIS enquanto filmava o mercado principal de Raqa.
Os activistas que relatavam a vida na cidade para vários media revolucionários já estavam habituados a serem espancados e acusados de serem espiões ao serviço de Assad. Mas, nos últimos meses, sucederam-se as detenções de muitos opositores. E, em Outubro, um dos membros do Centro de Media da Revolução da cidade foi assassinado. Muitos activistas fugiram entretanto.
Em Outubro, um grupo de mulheres de Raqa começou a manifestar-se diante do quartel-general do ISIS agora cercado. Levaram cartazes onde pediam de volta irmãos, maridos e filhos feitos desaparecer pelo ISIS. Antes e depois, durante meses, houve uma só mulher a manter vivo o protesto. A professora Suad Nofal, que entretanto se tornou num símbolo para activistas de toda a Síria. “A nossa revolução foi iniciada por pessoas honradas e está a ser roubada por ladrões”, lia-se num dos seus cartazes.
No cerco desta segunda-feira à sede do ISIS, participam combatentes do Exército dos Mujahedin, coligação formada há dias para combater o ISIS, da poderosa Frente Islâmica e da Frente dos Revolucionários da Síria. Também toma parte a Frente al-Nusra, que se diz parte da Al-Qaeda e chegou a dividir o poder em Raqa com o ISIS até entrar em conflito com o grupo. Ao contrário dos outros grupos islamistas, a Nusra é formada por uma maioria de sírios.