Portugal está a crescer, mas produtividade voltou a cair

Aumento do emprego não foi acompanhado por crescimento equivalente no Produto. No terceiro trimestre, a procura interna compensou constributo negativo das exportações líquidas.

O Instituto Nacional de Estatística (INE) confirmou esta segunda-feira que a economia portuguesa manteve entre Julho e Setembro deste ano uma variação positiva da taxa de crescimento, prolongando a tendência que tinha iniciado no segundo trimestre do ano, altura em que saiu de uma recessão que durava já há 10 trimestres consecutivos. As taxas de variação do PIB já eram conhecidas desde o mês passado, quando o INE apresentou a sua estimativa rápida. Agora, passaram a ser conhecidos mais pormenores.

Um desses é a evolução da produtividade, medida neste caso como o valor do PIB por pessoa empregada. E este  indicador registou no terceiro trimestre uma queda de 1%, a maior descida desde o primeiro trimestre de 2009, aquele em que toda a economia mundial socumbiu aos efeitos da falência do Lehman Brothers alguns meses antes.

Esta quebra da produtividade acontece porque, durante o terceiro trimestre, o crescimento de 0,2% do PIB ficou longe de acompanhar o aumento de 1,2% que se verificou no número de empregos durante o mesmo período. Isto significa que os empregos criados criaram em média menos riqueza do que aqueles que já existiam. Isto pode acontecer, por exemplo, porque são empregos em sectores relativamente menos produtivos.

O que aconteceu no terceiro trimestre é o inverso daquilo que vinha ocorrendo em trimestres anteriores, quando aos empregos destruídos não correspondia uma queda do Produto tão grande. Nessa altura, as empresas reduziam o emprego conseguindo limitar as perdas em termos de bens e serviços produzidos. Agora, durante o terceiro trimestre, os empregos criados contribuíram relativamente menos para aumentar o Produto.

Este fenómeno, a manter-se, pode indiciar a existência de limitações para a continuação de uma retoma forte no futuro tanto na actividade económica como no mercado de trabalho. A queda da produtividade, sem a correspondente correcção salarial, conduz a uma perda de competitividade. O corte salarial, a manter-se, resulta no constrangimento do procura interna.

No programa da troika, a realização de reformas estruturais é defendida com o objectivo de aumentar a produtividade da economia. Contudo, assim que se chega a uma fase de criação de emprego, esta apresenta uma descida significativa.

Procura interna ajuda
Outro sinal de alerta para a sustentabilidade da retoma surge no contributo que as diversas componentes do PIB estão a dar para o crescimento. Contrariando a ideia de que é pelo comércio internacional que Portugal está a conseguir afastar-se da recessão, os dados do INE mostram que, no terceiro trimestre deste ano, o crescimento de 0,2% foi o resultado de um contributo positivo de 1,3 pontos percentuais da procura interna (consumo mais investimento) que compensou o contributo negativo de 1,1 pontos percentuais da procura externa líquida (exportações menos importações).

Entre Julho e Setembro, o consumo privado cresceu face ao trimestre anterior a uma taxa de 0,8%, o melhor resultado desde o final de 2010. Por sua vez, o investimento cresceu 4,8%, o melhor desde o início de 2012. No total, a procura interna cresceu 1,4%.

Na procura externa líquida as coisas correram pior. Por um lado, as exportações desceram 0,2% face ao trimestre anterior que tinha sido bastante forte. E por outro, as importações aumentaram 2,6%, um resultado que é uma consequência da subida do consumo e do investimento, que é ainda feito com uma elevada percentagem de bens e serviços importados.

Quando se analisa a evolução da economia em termos homólogos, o cenário é outro. A variação negativa do PIB de 1% registada no terceiro trimestre deste ano continua a ser explicada pela queda da procura interna e compensada por um contributo positivo da procura externa líquida. No entanto, a tendência está a ser, já há seis meses, para uma inversão destes efeitos.

Assim, no terceiro trimestre, o contributo positivo da procura externa líquida foi de 0,6 pontos percentuais, quando no segundo trimestre tinha sido de 0,8 pontos e no primeiro de dois pontos. Em contraponto, a procura interna teve um contributo negativo de 1,6 pontos percentuais no terceiro trimestre, o que representa uma melhoria face ao contributo negativo de 2,9 e 6,1 pontos no segundo e primeiro trimestres do ano.

O papel do sector automóvel
Num ano em que se registou uma subida acentuada do IRS, em simultâneo com a devolução dos subsídios de férias e de Natal dos funcionários públicos e pensionistas, o regresso do consumo privado a taxas de variação em cadeia positivas e a taxas de variação homóloga cada vez menos negativas acontece sobretudo por via do aumento do consumo de bens duradouros.

De acordo com o INE, no terceiro trimestre do ano, o consumo de bens duradouros cresceu 4,1% face ao trimestre imediatamente anterior e 4,2% em relação a igual período do ano passado. Uma variação homóloga positiva já não acontecia desde o final de 2010.

Este tipo de consumo inclui bens como os automóveis e os electrodomésticos. E o papel do sector automóvel deverá estar a ser decisivo. Os dados das vendas de veículos que têm vindo a ser divulgados mostram que, depois de quedas muito acentuadas a partir de 2009 (apenas com uma interrupção em 2010), o sector parece ter já atingindo o fundo, começando agora uma recuperação ligeira. Esta retoma, dizem as empresas do sector, deve-se fundamentalmente ao facto de o envelhecimento da frota automóvel estar a atingir níveis insustentáveis.

Mais positiva para o crescimento futuro pode ser a subida do investimento, que se deu sobretudo através da compra de equipamento. O investimento, que registou quebras muito acentuadas durante os últimos anos, é uma componente essencial para aumentar a produtividade na economia.
 

Sugerir correcção
Comentar