Avião de Evo Morales deixou Viena após impasse diplomático
Suspeitas de que Snowden seguia a bordo na origem do conflito diplomático. Bolívia acusou Portugal e outros três países europeus de terem colocado em risco a vida do Presidente.
O avião de Morales, que regressava de uma viagem a Moscovo, tinha aterrado durante a noite em Viena, que, ao contrário dos seus parceiros europeus, não levantou nenhuma suspeita sobre a possibilidade de Edward Snowden, o ex-consultor informático da CIA, estar a bordo do avião.
A Bolívia foi um dos 21 países a que Snowden pediu asilo político, desde que se encontra na zona internacional do aeroporto de Moscovo, o seu último paradeiro conhecido. “A Áustria não fechou o seu espaço aéreo e o avião pôde obviamente aterrar, apesar de outros países recearem que Snowden também estivesse a bordo. A Áustria não fez isso, porque não tem esse receio”, explicou à rádio ORF um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros austríaco.
Depois de Portugal, França e Itália terem recuado, Espanha anunciou ao início da manhã que deu autorização ao avião de Morales para sobrevoar território nacional, estando prevista uma escala técnica em Las Palmas, nas ilhas Canárias.
A informação surgiu pouco depois de, em Viena, Morales ter dito que estava ainda "espera de permissão do Governo espanhol para continuar a nossa viagem", acrescentando que, durante a madrugada, recusou um pedido do embaixador espanhol na capital austríaca para entrar no aparelho. "Pediu-me para tomar um café dentro do avião e para ver o avião. No fundo, para o controlar. Disse-lhe que não podia, de acordo com as normas internacionais. Além do mais, não sou um delinquente, para que me controlem o avião", afirmou o Presidente boliviano.
O Governo austríaco confirmou entretanto que funcionários seus tiveram acesso ao aparelho, não tendo encontrado ninguém que não estivesse listado no manifesto.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal – bem como da França e de Espanha – ainda não se pronunciou sobre a polémica, que o vice-presidente boliviano, Álvaro García Linera, já qualificou como “um sequestro de Evo Morales na Europa” imposto pelos Estados Unidos e aceite de forma submissa por países europeus.
Segundo o mesmo responsável, citado pelo diário espanhol El País, tanto França como Portugal teriam condicionado a passagem do avião presidencial a uma “revista da aeronave”, supostamente para comprovar se Snowden seguiria a bordo. “Evo Morales não é um delinquente e, como o Presidente, tem imunidade internacional e todo o direito a levantar voo sem qualquer restrição”, afirmou García Linera.
Reacções iradas
O caso despertou uma série de duras críticas aos países europeus a partir da América Latina. Em La Paz, o ministro dos Negócios Estrangeiros da Bolívia, David Choquehuanca, exprimiu o seu “descontentamento, porque a vida do Presidente foi colocada em risco”, por causa de “rumores infundados sobre a presença de Snowden no avião”. Choquehuanca disse que “vão ser exigidas explicações a Lisboa e Paris”, porque as “leis do tráfego aéreo foram violadas”.
Reunido de emergência, o Conselho de Ministros da Bolívia repudiou esta demonstração de "prepotência imperial" e pediu aos países latino-americanos para se reunirem de emergência a fim de denunciaram esta situação.
Um pedido que teve já eco: o Equador pediu uma reunião o mais extraordinária da União das Nações Sul Americanas (Unasur) para discutir o incidente. "Trata-se de uma ofensa tremenda e temos que reagir. Há quem esteja paranóico. Certamente têm problemas de consciência. Mas nem nós nem o Presidente Morales temos", disse o chefe da diplomacia equatoriana Ricardo Patiño, citado pelo jornal espanhol El País.
Igualmente irado, o seu homólogo venezuelano considerou a recusa de sobrevoo um atentado contra a vida do Presidente boliviano e afirmou que a pressão exercida por Washington sobre os países aliados para que não permitam a fuga de Snowden "é de cariz fascitóide".
Snowden, antigo funcionário da CIA e trabalhador de uma empresa contratada pela Agência Nacional de Segurança dos EUA, é procurado pelas autoridades norte-americanas por ter passado a vários jornais documentos secretos que revelam uma dimensão até agora desconhecida de vigilância conduzida por aquela agência dentro e fora dos EUA.
Depois de Hong Kong, onde falou a jornais como o Guardian, o norte-americano partiu para Moscovo, estando há mais de uma semana na zona de trânsito internacional depois de os EUA terem cancelado o seu passaporte. Apresentou pedidos de asilo a duas dezenas de países, mas até ao momento sem resposta.