Número de doentes enviados para operações no privado triplicou desde 2006
No ano passado os doentes esperaram em média três meses para serem operados, um número que mesmo assim tem melhorado nos últimos seis anos. Em 2006 esperava-se quase cinco meses.
Os dados, que fazem parte do Relatório da Actividade Cirúrgica Programada, mostram que ao todo em 2012 houve 534.415 operados, quando em 2006 eram 345.321, o que representa um crescimento de quase 50%. Em 2012, em média, os doentes esperaram três meses para serem operados e 15% foram atendidos fora dos prazos máximos previstos. Isto, apesar de o Serviço Nacional de Saúde estar a enviar cada vez mais doentes para os hospitais convencionados, com protocolo ou em regime de parceria público-privada.
Os dados mostram que tem vindo a baixar o número de pessoas que são operadas em hospitais públicos através de remunerações alternativas, nomeadamente pelo pagamento de incentivos. De momento há ainda 166.798 pessoas inscritas à espera de uma cirurgia, um número que caiu 7,5% face ao ano passado e 24,6% em relação a 2006 – o que tem sido conseguido com a ajuda do Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), criado em 2004.
Numa reacção ao relatório, o secretário de Estado adjunto do ministro da Saúde realçou à Lusa a “diminuição significativa” da percentagem de pessoas que não foram operadas dentro do tempo ideal. Fernando Leal da Costa sustentou que “a mediana do tempo de espera é a mais baixa de sempre desde que é medida em termos de SIGIC [Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia]”, atendendo ao “aumento do número de pessoas inscritas para cirurgia e ao aumento ainda maior do número de cirurgias realizadas”. Leal da Costa atribuiu “parte significativa dos bons resultados” ao maior número de cirurgias em ambulatório.
Oftalmologia é a área com mais doentes
Comparando 2012 com 2011, o número de operações subiu mais de 6% e “a cirurgia de ambulatório representou cerca de 50% do total da actividade cirúrgica, a nível nacional, no ano de 2012, correspondendo a 269.104 episódios operados nos hospitais”. Contudo, em média os utentes tiveram de esperar três meses para serem operados e mais de 15% ainda foram operados fora dos tempos máximos de resposta garantidos e que são calculados de acordo com a doença em causa e o seu nível de evolução. A maioria dos inscritos deu entrada para cirurgias relacionadas com oftalmologia, que representam 122.863 doentes.
O tempo de espera parece estar a estabilizar desde 2010 - nesse ano só 13% dos doentes foram operados fora de prazo, em 2011 o número subiu para 15,8% e em 2012 baixou ligeiramente para 15,1%. Mesmo assim, comparando com 2006 a melhoria é muito significativa: nesse ano 43,5% das pessoas viram a cirurgia ser feita fora de prazo e esperaram em média quase sete meses.
22% de doentes com cancro operados fora de prazo
Olhando especificamente para os casos relacionados com oncologia, em 2012 ainda foram quase 22% os doentes com um cancro que viram a cirurgia acontecer mais tarde mais do que o previsto – entre estes doentes, 15,3% eram considerados prioritários. Apesar da espera, mesmo assim os dados indicam que houve uma melhoria na espera para operações a neoplasias malignas de 8,4% em relação a 2011 e de mais de 60% em relação a 2006, quando mais de metade das cirurgias eram feitas fora dos tempos máximos de resposta garantidos.
Segundo o secretário de Estado, “se bem que exista ainda um conjunto de pessoas que não foram operadas dentro do tempo ideal, esse número está a diminuir de ano para ano”. “Mesmo na oncologia, onde, de 2010 para 2011, tinha existido algum agravamento [nas listas de espera], neste momento [isso] já está a ser corrigido”, salientou.
Para tentar compensar e resolver o problema da espera, a tutela emitiu vales-cirurgia que permitem que o utente opte por ser operado num dos hospitais privados com acordo com o SNS sem ter de pagar mais pela intervenção. Ao todo no ano passado foram dados 84.734 vales-cirurgia, mas quase 42% das pessoas recusaram a transferência, optando por aguardar pela disponibilidade do hospital público. Cerca de 20 mil foram mesmo operadas com estes vales.
Doentes do Algarve são os que mais esperam
Entre as várias regiões do país continuam também a existir assimetrias, com os doentes do Algarve a esperarem em média 4,2 meses, contra o Norte, onde só se espera 2,3 meses. No centro a espera é de 3,6 meses, em Lisboa e Vale do Tejo de 3,4 e no Alentejo de 2,5. Quanto às cirurgias feitas fora do tempo, a situação é mais frequente no centro (23,7%), seguindo-se Lisboa e Vale do Tejo (18,7%), Algarve (19,6%), Norte (6,7%) e Alentejo /6,3%).
“O tempo que os doentes esperaram por uma cirurgia variou significativamente em função do seu distrito de residência. Os utentes que mais tempo esperaram foram os residentes nos distritos de Setúbal e Faro, ambos com medianas acima dos quatro meses. No pólo inverso, Braga, Beja, Porto e Viana do Castelo são os distritos com menores medianas do tempo de espera”, lê-se no relatório.
Sobre as expectativas em relação à capacidade de resposta “verificou-se que a produtividade média é de 83 cirurgias padrão por cirurgião padrão por ano, correspondendo a um valor estimado de 166 participações/ano, em intervenções cirúrgicas (em cada intervenção em média são necessários dois cirurgiões)”, diz o relatório, que sublinha que o valor “fica aquém do desejável, já que a referência se estabelece para valores médios (com necessidade de ajustamentos por especialidade) em 154 cirurgias/ano”. Há também muita variação de hospital para hospital.
O secretário de Estado adjunto do ministro da Saúde disse ainda à Lusa acreditar que as políticas em curso “levarão a uma diminuição ainda maior das pessoas à espera de cirurgia e da mediana do tempo de espera”. E lembrou, a este propósito, a fusão de alguns hospitais, considerando que isso permitirá obter “um melhor aproveitamento dos blocos operatórios e do número de cirurgiões e anestesistas disponíveis”.
O relatório, no seu prefácio, dedica uma grande parte à actual crise para dizer que “em muito pouco tempo a percepção de um forte constrangimento económico e financeiro instalou-se”. “Num contexto de procura e oferta crescente de cuidados de saúde surge uma redução acentuada dos gastos públicos em saúde. É pois legítimo, mesmo prudente, antever a possibilidade de dificuldades acrescidas ao acesso a cuidados de saúde.”
Ainda assim, reforça que o SNS é um importante elemento de “coesão” para a sociedade e que “existe a forte convicção de que um SNS forte, coeso e de qualidade é um contributo determinante neste acesso”. Mas garante que ainda existe uma margem de manobra para conter a despesa, mantendo ou melhorando o acesso, reestruturando o sistema no sentido da eficiência e centrando os serviços no acesso e em ganhos em saúde”.