Alterar as palavras de um livro electrónico para evitar a partilha
Cada ficheiro passa a ser um exemplar único e é possível assim identificar quem o disponibilizou sem autorização.
O objectivo é que, através da análise ao conteúdo de um ficheiro distribuído ilegalmente na Internet, seja possível saber quem o disponibilizou, o que poderá actuar como um dissuasor, já que os mecanismos de protecção que editoras e vendedores incluem nos ficheiros têm estado a ser contornados.
O projecto de investigação (que é financiado pelo Estado e que conta com o apoio da associação que representa editores e livreiros na Alemanha) está a aproximar-se do fim. O resultado, porém, será ainda uma demonstração de conceito e não algo pronto para chegar ao mercado, explica ao PÚBLICO Martin Steinebach, o investigador responsável pelo projecto, que se chama SiDiM, a sigla em alemão de Documentos Seguros através de Marcação Individual.
O método desenvolvido por Martin Steinebach e colegas, que funciona por ora apenas na língua alemã, implica pequenas alterações a palavras e expressões. Uma das “abordagens mais promissoras”, exemplifica o investigador, é trocar de posição dois nomes próprios nas frases em que a ordem não seja relevante. Assim, “Daniel e Pedro vão almoçar” poderia ser alterado para “Pedro e Daniel vão almoçar”. Outra possibilidade seria substituir uma expressão como “não é visível” por “é invisível”. O processo é inteiramente automático.
“Num livro de 100 páginas, estamos confiantes de que conseguimos encontrar dez ou 20 posições onde podem ser feitas mudanças sem causar grandes danos”, afirmou Steinebach, notando que a técnica não poderá ser aplicada em obras de poesia, onde a ordem e extensão das palavras é muito importante.
Marcar individualmente cada ficheiro de um livro electrónico para que os leitores não o partilhem não é uma novidade. A técnica é por vezes chamada DRM social, já que não impede tecnicamente a partilha, mas assenta no receio dos utilizadores de serem descobertos (DRM é a sigla de Digital Rights Management, e designa mecanismos que procuram impossibilitar o uso de ficheiros de formas não previstas pelos detentores dos direitos).
Porém, as técnicas de DRM social normalmente passam por colocar avisos sobre os direitos de autor e uma frase única numa página do livro que não seja a do conteúdo. Por exemplo, “Este livro foi vendido ao utilizador X, a 18 de Junho de 2013”. Para além disso, podem incluir séries de caracteres que não são visíveis para o leitor, mas que permitem identificar cada ficheiro. Do ponto de vista das editoras e vendedores, o problema é que estes caracteres identificadores podem ser retirados por utilizadores com os conhecimentos técnicos necessários.
Já o método desenvolvido por Steinebach torna mais difícil a remoção das alterações usadas como identificador, já que o conteúdo da obra teria de ser comparado com o original (que, em última instância, poderá até nem ser disponibilizado ao público).
No debate que opõe livros electrónicos a livros em papel, as possiblidades de alterar o conteúdo, nomeadamente à distância, através da ligação à Internet do aparelho que o utilizador esteja a usar para ler, tem sido apresentada simultaneamente como uma vantagem e um problema.
Por um lado, permite que livros técnicos, académicos e escolares se mantenham actualizados e facilita a correcção de gralhas e erros. Por outro, abre portas a que seja tecnicamente possível (incluindo por ordem de Governos) fazer todo o tipo de mudanças no conteúdo (embora não relacionado com o conteúdo, ficou conhecido, em 2009, o caso em que a Amazon apagou dos Kindle dos seus clientes dois livros de George Orwell, incluíndo, ironicamente, “1984”; os livros tinham sido postos à venda na Amazon, através de um sistema de auto-publicação, por uma empresa que não tinha os direitos para os comercializar).
Questionado sobre uma possível reacção negativa dos leitores, Steinebach afirmou: “Estou confiante que os leitores não vão notar, e tenho dúvidas que os autores notem”. Admitiu porém, que os autores não têm acolhido bem o conceito e reconheceu que o uso desta técnica “é algo que requer avaliação”.