Europa vai construir o maior telescópio de sempre no topo de um monte no Chile
Depois do Telescópio Muito Grande, ou Very Large Telescope, o que poderia seguir-se? A resposta é o Telescópio Extremamente Grande, ou Extremely Large Telescope, que o Observatório Europeu do Sul (ESO, a principal organização europeia de astronomia) vai construir, embora o projecto ainda dependa da aprovação de alguns países-membros, como Portugal.
O European Extremely Large Telescope (E-ELT) terá um único espelho principal de 39,3 metros de diâmetro, que observará a luz visível do Universo (aquela que os olhos humanos também vêem), bem como a radiação infravermelha. Mais de 400 anos após Galileu ter apontado uma pequena luneta para o céu pela primeira vez, este será o maior telescópio óptico e infravermelho alguma vez construído. Em terra ou no espaço, não há nenhum que hoje se lhe compare em termos de resolução, frisa o astrofísico João Fernandes, da Universidade de Coimbra.
Para se ter uma ideia da sua dimensão, a actual menina dos olhos da astronomia europeia é o Very Large Telescope (VLT) - também do ESO, organização intergovernamental de 14 países. Com quatro espelhos principais albergados em quatro cúpulas, que podem funcionar em conjunto como um único telescópio de 16 metros de diâmetro, o VLT é por enquanto o maior telescópio óptico e infravermelho existente. Fica no cimo do Monte Paranal, no Chile, e é a 20 quilómetros daí, no Monte Armazones, a mais de três mil metros de altitude no deserto de Atacama, que o ESO (que tem ainda outros telescópios no Chile) planeia construir o poderoso sucessor do VLT.
Na reunião do conselho do ESO, na segunda-feira em Garching, na Alemanha, os representantes dos 14 países aprovaram o projecto, mas há obstáculos pela frente - o principal é o dinheiro - para que a construção possa começar, uma vez que o telescópio custará mais de mil milhões de euros.
Seis países aprovaram a construção do telescópio (Alemanha, Áustria, Holanda, Suécia, Suíça e República Checa); quatro declararam o seu apoio, mas sujeitaram-no a posterior confirmação pelos governos dos seus países antes da próxima reunião do conselho do ESO, a 4 e 5 Dezembro (Bélgica, Finlândia, Itália e Reino Unido); e os restantes quatro (Dinamarca, Espanha, França e Portugal) disseram que estavam a trabalhar para se juntarem ao projecto em breve. "Ainda não estão em condições de se comprometer e precisam de mais tempo, por isso abstiveram-se", diz Lars Lindberg, porta-voz do ESO, citado pela revista Science.
O que disse Portugal"As instruções que a delegação portuguesa tinha é que o país considerava o projecto importante, mas não estava em condições de o aprovar neste momento", diz ao PÚBLICO a astrofísica Teresa Lago, da Universidade do Porto e representante de Portugal no conselho do ESO. "A minha esperança e do ESO é que o aprove, por razões científicas e industriais. Há contratos industriais envolvidos e um país que não participe no projecto não pode participar neles. Alguns países que também estão em crise aprovaram-no, porque acham que é importante para sua indústria e que é importante investir no futuro em tempos de crise. Depende muito do ponto de vista político", acrescenta. "Os membros do ESO querem estar juntos neste desenvolvimento que mantém o ESO à frente de qualquer organização internacional de astronomia. O ESO tem os melhores telescópios do mundo e quer continuar à frente", diz ainda a cientista.
"Na minha opinião, este processo já não volta atrás, até porque o interesse científico é grande", considera João Fernandes, acrescentando que cientistas e empresas portuguesas poderão usufruir de tecnologias de ponta com este projecto.
Para a construção do telescópio arrancar já, teriam de ter votado a favor dois terços dos países-membros (ou seja, pelo menos dez). Por agora, já estão assinados alguns contratos, como a construção da estrada até ao topo do Monte Armazones, prevista para ter início ainda este ano.
No princípio da próxima década, o E-ELT deverá começar as observações - e então tornar-se-á o maior olho do mundo no céu, um único espelho composto por 800 pequenos espelhos. Os planetas noutros sistemas solares estarão entre os seus alvos - "em particular os planetas com condições para albergar vida", diz João Fernandes. A detecção de oxigénio, metano ou água serão indícios de que a vida na Terra pode não ser um evento singular no Universo.