Amantes de padres escrevem ao Papa para pedir fim do celibato

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A carta surgiu quando o Papa reafirmou a "natureza sagrada do celibato" Foto: Max Rossi/Reuters

Stefania Salomone, uma funcionária administrativa de Roma com 42 anos, já teve duas relações com padres católicos. Decidiu criar um site para encontrar mulheres com a mesma experiência e hoje está em contacto com cinco dezenas: 40 assinaram uma carta aberta dirigida ao Papa Bento XVI para lhe pedir o fim do celibato obrigatório.

Descrevem-se como "mulheres de todas as partes de Itália que estiveram ou estão numa relação com um padre ou um religioso", habituadas a viver "em segredo" e a experimentar "diariamente as dúvidas, os medos e as inseguranças dos nossos homens". Um padre, escrevem estas italianas, "precisa de viver com os outros seres humanos, experimentar sentimentos, amar e ser amado".

A carta está na Internet desde o fim de Março, altura em que o tema do celibato voltou à agenda do Vaticano a propósito das denúncias de abusos sexuais. A ideia de escrever ao Papa surgiu depois de este ter reafirmado "o valor sagrado do celibato".

A obrigatoriedade do celibato, dizem as 40 mulheres, não é uma lei divina, mesmo que a Igreja a apresente como "vontade de Deus". É antes uma "regra humana", introduzida por "razões de interesse económico e de conveniência", que não se encaixa na vida de muitos padres e faz com que a maioria destas relações acabe "em vergonha". É por saberem isso que elas pedem a Bento XVI para admitir que talvez estes homens só consigam cumprir plenamente os seus deveres de padres quando as suas vidas forem completadas com o casamento

A missiva foi entretanto traduzida e publicada em sites espanhóis e ingleses e noticiada pela agência on-line GlobalPost. Apesar de o texto ser apoiado por 40 mulheres, apenas três signatárias publicaram os seus nomes. Para além de Stefania Salomone, assinam Antonella Carisio, de 41 anos, e Maria Grazia Filippucci. O Vaticano recusa comentar.

As mulheres descrevem experiências diferentes com pontos em comum. Dizem, por exemplo, que "uma das declarações mais recorrentes dos padres às suas "companheiras" se resume em poucas palavras: "Preciso de ti para ser quem sou", isto é, um padre". A maioria "não está disponível para desistir da vida de padre por uma mulher, querem as duas coisas", disse Stefania Salomone à GlobalPost. Quando descobertos, os padres tendem a abandonar as mulheres, sendo-lhes muito difícil deixar a Igreja.

Um anel de noivado

Antonella Carisio conta ter tido um caso com um padre brasileiro que dormia frequentemente em sua casa. Edecir Calegari, que conheceu quando ambos geriam o centro de juventude da sua paróquia, quis até ser apresentado ao filho dela e ao resto da família como seu companheiro. A relação acabou por ser descoberta e denunciada por outro padre e o seu amante foi transferido para Roma: "Quando ele se foi embora até me deu um anel de noivado".

Entretanto, Calegari regressou ao Brasil como missionário, algo que prometera nunca fazer. Carisio "era uma amiga e uma confidente, mas nunca estive apaixonado por ela", diz o padre, questionado pela GlobalPost. Calegari afirma lamentar "profundamente" o que aconteceu e garante que defende o celibato.

Carisio diz que nunca lhe pediu para renunciar à sua vocação: ele entrara no seminário aos 12 anos e não imaginava a possibilidade de ter outra vida, explica. Para além disso, era admirado por todos os amigos e pela família: "Sempre lhe disseram que ele estava a dedicar a vida a algo superior, melhor do que tudo".

Essa crença e a incapacidade de abandonarem a posição que vêem como um privilégio são partilhadas por muitos. B., uma advogada da Toscana de 40 anos, disse à GlobalPost que o padre com que se envolveu "era crítico dos aspectos mais reaccionários da Igreja e do celibato compulsivo", mas isso mudou quando um novo bispo lhe ofereceu novas oportunidades.

Mas também há os que escolhem as mulheres: segundo a revista La Civiltà Cattolica, desde o Concílio Vaticano II (1962-65) perto de 60 mil padres deixaram a Igreja para casar.

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