Portugal é o país da União Europeia onde a natalidade caiu mais na última década
Já não é novidade que cada vez nascem menos crianças em Portugal. Mas não deixa de ser surpreendente, mesmo para os especialistas em demografia, constatar que Portugal foi o país da União Europeia (UE) onde a taxa bruta de natalidade mais diminuiu desde 1999.
É neste sentido que apontam os últimos dados do Eurostat, o gabinete de estatísticas europeu, que incluem os 27 países da UE e ainda a Islândia, a Suíça e a Noruega. Entre 1999 e 2009, a taxa bruta de natalidade (número de nados-vivos por mil habitantes) decresceu substancialmente em Portugal (19,7 por cento). No ano passado (dados provisórios), passámos para apenas 9,16 nascimentos por milhar de habitantes.
Os números do Eurostat indicam ainda que em 2009 Portugal era já o segundo país da UE com a menor taxa bruta de natalidade, a seguir à Alemanha, que lidera a tabela. Pelo contrário, Espanha registou um acentuado crescimento da taxa bruta de natalidade, entre 1999 e 2009.
Para os demógrafos, apesar de a taxa bruta de nascimentos não ser o indicador mais adequado para medir a queda da natalidade - o mais rigoroso é o índice sintético de fecundidade, o número de crianças que cada mulher em idade fértil tem -, ele permite, mesmo assim, perceber que este fenómeno está a ser muito rápido em Portugal. E isso é que pode justificar alguma preocupação.
Ao contrário de Espanha"O que é mais preocupante é que já não vamos a tempo de suprir a falta de gente no meio da pirâmide [etária]", defende Ana Fernandes, demógrafa e docente na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa. "É a população activa que paga impostos e a base da pirâmide já encolheu tanto que vai haver falhas, a não ser que cheguem imigrantes", sublinha.
Em Espanha aconteceu o contrário, justamente porque a população aumentou bastante graças à entrada de imigrantes nos últimos anos - cerca de cinco milhões, lembra Jorge Malheiros, do Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa. Os imigrantes compensam a quebra da natalidade, porque são jovens, estão em idade fértil e têm mais filhos. Já em Portugal, o pico da imigração verificou-se entre 2000 e 2002 e, a partir daí, tem diminuído.
Mas a quebra da natalidade portuguesa fica a dever-se a uma multiplicidade de factores: a mudança de mentalidades e comportamentos ocorrida na última década - para "uma sociedade um bocado individualista que privilegia o bem-estar e a carreira profissional" -, associada a uma situação de contracção económica nos últimos anos, a quebra da imigração e o aumento da emigração.
Os imigrantes ajudavam a população "a envelhecer mais devagar", mas Portugal deixou de ser um país atractivo, nota. A agravar, "os dados mostram que o volume dos portugueses que ficam no estrangeiro tende a aumentar". Se é verdade que isto não seria por si só preocupante, até porque as sociedades se ajustam naturalmente a estas alterações, a adaptação à nova realidade torna-se mais complicada se o envelhecimento crescer rapidamente, como está a acontecer em Portugal, acentua.
E o problema é que tudo indica que em 2009 se verificou, pela segunda vez na história portuguesa (a primeira vez foi em 2007), um crescimento natural negativo. Entre Janeiro e Setembro de 2009, o número de óbitos suplantou em 3638 o de nascimentos, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística. A carga sobre os activos vai obrigar a um aumento da produtividade e a novos adiamentos da idade de reforma, prevê Jorge Malheiros.
Cheque-bebé só lá para o final do anoNo âmbito do pacote de medidas de austeridade, os espanhóis decidiram acabar com o cheque-bebé (2500 euros oferecidos à nascença de uma criança). Em Portugal, depois de o Governo ter prometido, no ano passado, que ia criar uma Conta Poupança-Futuro (com 200 euros, a levantar apenas após os 18 anos) e ter aprovado a medida em Fevereiro em Conselho de Ministros, ainda não se sabe ao certo se e quando esta vai entrar em vigor.
O PÚBLICO pediu informações ao Ministério do Trabalho que, ao final da tarde, nos remeteu para o Ministério das Finanças, mas àquela hora já não foi possível estabelecer o contacto. Quando a medida foi aprovada, o secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Tiago Silveira, admitiu que apenas iria avançar nos últimos meses do ano.