Arcebispos da Irlanda esconderam durante décadas abusos sexuais
A não comunicação de crimes à polícia, de modo a proteger o bom nome da Igreja, é uma das faltas apontadas neste trabalho aos quatro arcebispos, segundo conta hoje o jornal britânico "The Daily Telegraph".
Trata-se do segundo relatório que nestes últimos seis meses vem falar de abusos de crianças em instituições católicas da República da Irlanda, depois daquele que em Maio falou de décadas de flagelações, de trabalho escravo e de violações colectivas em grande parte do antigo sistema de escolas e reformatórios.
"Vai ser uma leitura de horrores. Não só as vítimas ficarão chocadas, como os paroquianos irão ficar chocados e questionarão a sua fé", comentou a associação The Irish Survivors of Child Abuse, a propósito deste relatório a divulgar oficialmente hoje pelo Ministério irlandês da Justiça.
Foi a terceira investigação oficial que se fez nos últimos quatro anos aos abusos verificados no seio da Igreja Católica na Irlanda, depois de investigações independentes a sacerdotes que se comportaram de forma indigna.
Neste trabalho destaca-se a normalidade de a hierarquia transferir os abusadores de uma paróquia para outra, em vez de enfrentar frontalmente o problema.
"Vamos ler os sórdidos acontecimentos que se verificaram na arquidiocese de Dublin", disse o arcebispo Diarmuid Martin, a propósito das histórias de uma amostragem de 45 sacerdotes que cometeram abusos entre 1975 e 2004.
Explica o "Daily Telegraph" que na verdade apenas se revelam os nomes verdadeiros de 10 padres, por já estarem mortos ou na cadeia, enquanto os restantes são referidos com nomes falsos, de modo a evitar-lhes incovenientes de maior.
Estas 700 páginas pormenorizam relatos feitos pelas vítimas, a resposta do episcopado e a forma como a polícia e as autoridades de saúde reagiram ao saber dos desmandos.
Em especial, destaca-se o comportamento negativo do cardeal Connell e dos arcebispos John Charles McQuaid, que morreu em 1973, Dermot Ryan, que morreu em 1984, e Kevin McNamara, falecido em 1987, todos eles encobridores dos delitos cometidos por sacerdotes da arquidiocese de Dublin.
O arcebispo Martin, que sucedeu ao cardeal Connell, hoje com 83 anos, chegou à conclusão de que, desde 1940, mais de 400 crianças contaram ter sido abusadas por pelo menos 152 sacerdotes, só na área da capital irlandesa.
São ao todo cinco volumes de horrores, que levaram nove anos a compilar, para se mostrar como muitos orfanatos e escolas industriais da católica Irlanda do século XX eram lugares de medo, de negligência e de abuso sexual sistemático.
O relatório que o ministro da Justiça, Dermot Ahern, hoje apresenta ao princípio da tarde critica tanto as autoridades religiosas por terem escondido estas práticas criminosas como o Ministério da Educação, por ter sido conivente com o silêncio da arquidiocese.
Este trabalho foi coordenado por uma juíza do Supremo Tribunal da Irlanda, Yvonne Murphy, que entretanto também está a investigar alegações de factos equiparáveis ocorridos na diocese rural de Cloyne, no condado de Cork, no Sul do país.